5.6.09

Cecília Meireles: "Desejo de regresso"

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Desejo de regresso

Deixai-me nascer de novo,
nunca mais em terra estranha,
mas no meio do meu povo,
com meu céu, minha montanha,
meu mar e minha família.

E que na minha memória
fique esta vida bem viva,
para contar minha história
de mendiga e de cativa
e meus suspiros de exílio.

Porque há doçura e beleza
na amargura atravessada,
e eu quero memória acesa
depois da angústia apagada.
Com que afeição me remiro!

Marinheiro de regresso
com seu barco posto a fundo,
ás vezes quase me esqueço
que foi verdade este mundo.
(Ou talvez fosse mentira...)



MEIRELES, Cecília. "Mar absoluto". In: Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1967.

8 comentários:

Anônimo disse...

Antonio,

Que excelente escolha! Você como sempre nos cativando com essas preciosidades! Parabéns!

Aproveito e exponho aqui meu novo poema:

***BAGAGEM***


Ainda estou cansada
Da viagem, despida
De vertigens, vestida
De vontades, mas nada


Na memória. Saudade
De que vida me toma?
Dentro de que redoma
Prende-me à veleidade?


Toda minha bagagem
Larguei por aí. Rumos?
Não quero só que os achem


Em meus sonhos. Resumo:
Entre mira e miragem
De linguagem, eu sumo.


Beijos,
Cecile.

Arthur Nogueira disse...

Cicero,

que coisa linda, límpida, azul - como você e Cecília.

Beijo grande,

A.

paulinho disse...

LINNNNNNNDÍSSIMO poema!

que pérola da cecília!

uma maravilha isto aqui: "eu quero memória acesa/ depois da angústia apagada." eu também (rs)!

beijo, meu poeta porreta!

Anônimo disse...

que poema lindo!
é o 'eterno retorno' que nos alimenta. eu fiz esta viagem de verdade. é glorioso!
uma admiradora

Victor Colonna disse...

Lindo poema, Antônio! segue aí um meu:

SOPA DE LETRINHAS


As palavras estão
Arrumadas
Nas prateleiras:
Ovos
Farinha
Fermento
Receita.

As palavras estão
Enlatadas
Nas prateleiras:
Óleo
Azeite
Desejo
Manteiga.

As palavras estão
Entaladas
Nas prateleiras:
Engolidas aos pedaços
Vomitam-se inteiras.

As palavras estão
Enlutadas
Nas prateleiras
Nas gôndolas sem Veneza
No saldo de balanço
No balanço da pobreza.

As palavras ganharam
Prazo de validade:
PROMOÇÃO DE AMOR ATÉ SEXTA
No fim-de-semana: saudade.

As palavras perderam
Solidez
Liquidez

Apagaram-se na assepsia dos plásticos
Sufocaram nas embalagens a vácuo
Suicidaram-se na boca do caixa.

Anita disse...

Muuuuito lindo!!!!
Reforço o destaque do Paulinho...

"eu quero memória acesa/ depois da angústia apagada."

Demais!

bjs

Janaina Amado disse...

Que bonita essa forma da gande Cecília falar de um tema que é comum em poesia - daí o perigo de soar banal -, mas que ela conhecia bem: ser estrangeiro, exílio, volta à casa. Lindo!

Pedrita disse...

maravilhoso! eu li no mês passado o belíssimo romanceiro da inconfidência dela que a folha lançou naquela coleção de banca. cecília meireles é sempre maravilhosa. beijos, pedrita