Eis uma tradução minha (e, em baixo, o original) de um trecho absolutamente delicioso do livro de Michel Tournier, Vendredi ou les limbes du Pacifique. Robinson, o personagem principal, anota em seu Log-book o seguinte:
Avalio hoje a loucura e a maldade dos que caluniam essa instituição divina: o dinheiro! O dinheiro espiritualiza tudo o que toca, trazendo-lhe uma dimensão ao mesmo tempo racional – mensurável – e universal – pois um bem monetizado torna-se virtualmente acessível a todos os homens. A venalidade é uma virtude cardeal. O homem venal sabe calar seus instintos assassinos a associais – sentimento de honra, amor-próprio, patriotismo, ambição política, fanatismo religioso, racismo – para só deixar falar sua propensão à cooperação, seu gosto pelas trocas frutuosas, seu sentido da solidariedade humana. É preciso tomar literalmente a expressão idade do ouro, e vejo claramente que a humanidade chegaria lá mais rapidamente se só fosse conduzida por homens venais. Infelizmente são quase sempre homens desinteressados que fazem a história, e então o fogo destrói tudo, o sangue corre em torrentes. Os gordos mercadores de Veneza nos dão o exemplo da felicidade faustuosa que conhece um estado dirigido somente pela lei do lucro, enquanto que os lobos esgalgados da Inquisição espanhola nos mostram as infâmias de que são capazes os homens que perderam o gosto pelos bens materiais. Os hunos teriam rapidamente interrompido seu ímpeto se tivessem sabido aproveitar das riquezas que haviam conquistado. Com o peso de suas aquisições, ter-se-iam estabelecido para melhor gozar delas, e as coisas teriam retomado seu curso natural. Mas eram brutos desinteressados. Desprezavam o ouro. E arremessavam-se à frente, queimando tudo em sua passagem.
Je mesure aujourd'hui la folie et la méchanceté de ceux qui calomnient cette institution divine : l'argent! L'argent spiritualise tout ce qu'il touche en lui apportant une dimension à la fois rationnelle — mesurable — et universelle — puisqu'un bien monnayé devient virtuellement accessible à tous les hommes. La vénalité est une vertu cardinale. L'homme vénal sait faire taire ses instincts meurtriers et asociaux — sentiment de l'honneur, amour-propre, patriotisme, ambition politique, fanatisme religieux, racisme — pour ne laisser parler que sa propension à la coopération, son goût des échanges fructueux, son sens de la solidarité humaine. Il faut prendre à la lettre l'expression l'âge d'or, et je vois bien que l'humanité y parviendrait vite si elle n'était menée que par des hommes vénaux. Malheureusement ce sont presque toujours des hommes désintéressés qui font l'histoire, et alors le feu détruit tout, le sang coule à flots. Les gras marchands de Venise nous donnent l'exemple du bonheur fastueux que connaît un État mené par la seule loi du lucre, tandis que les loups efflanqués de l'Inquisition espagnole nous montrent de quelles infamies sont capables des hommes qui ont perdu le goût des biens matériels. Les Huns se seraient vite arrêtés dans leur déferlement s'ils avaient su profiter des richesses qu'ils avaient conquises. Alourdis par leurs acquisitions, ils se seraient établis pour mieux en jouir, et les choses auraient repris leur cours naturel. Mais c'étaient des brutes désintéressées. Ils méprisaient l'or. Et ils se ruaient en avant, brûlant tout sur leur passage.
De : TOURNIER, Michel. Les limbes du Pacifique. Paris : Gallimard, 1969, p.61-62.
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