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9.6.19

Fernando Pessoa / Ricardo Reis: "Sim, sei bem"




Sim, sei bem



Sim, sei bem

Que nunca serei alguém.

    Sei de sobra

Que nunca terei uma obra.

    Sei, enfim,

Que nunca saberei de mim.

    Sim, mas agora,

Enquanto dura esta hora,

    Este luar, estes ramos,

Esta paz em que estamos,

    Deixem-me me crer

O que nunca poderei ser.





PESSOA, Fernando. "Sim, sei bem". In:_____. "Odes de Ricardo Reis". In:_____. "Ficções do interlúdio". In:_____. Obra poética. Org. por Maria Aliete Galhoz. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1986.

8.11.17

Fernando Pessoa / Ricardo Reis: "Vivem em nós inúmeros"



Vivem em nós inúmeros

Vivem em nós inúmeros;
Se penso ou sinto, ignoro
Quem é que pensa ou sente.
Sou somente o lugar
Onde se sente ou pensa.

Tenho mais almas que uma.
Há mais eus do que eu mesmo.
Existo todavia
Indiferente a todos.
Faço-os calar: eu falo.

Os impulsos cruzados
Do que sinto ou não sinto
Disputam em quem sou.
Ignoro-os. Nada ditam
A quem me sei: eu escrevo.



PESSOA, Fernando. "Vivem em nós inúmeros". In:_____. "Ficções do interlúdio / Odes de Ricardo Reis". In:_____. Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986.

21.4.17

Fernando Pessoa / Ricardo Reis: "Não torna ao ramo a folha que o deixou"



Não torna ao ramo a folha que o deixou, (28-9-1926)

Não torna ao ramo a folha que o deixou,
Nem com seu mesmo pó se uma outra forma.
O momento, que acaba ao começar
        Este, morreu p'ra sempre.
Não me promete o incerto e vão futuro
Mais do que esta iterada experiência
Da mutada sorte e a condição deserta
        Das cousas e de mim.
Por isso, neste rio universal
De que sou, não uma onda, senão ondas,
Decorro inerte, sem pedido, nem
        Deuses em quem o empregue.



PESSOA, Fernando. "Não torna ao ramo a filha que o deixou". In:_____. Poemas de Ricardo Reis. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1994.

17.4.11

Fernando Pessoa / Ricardo Reis: "Tão cedo passa tudo quanto passa"




Tão cedo passa tudo quanto passa!
Morre tão jovem ante os deuses quanto
Morre! Tudo é tão pouco!
Nada se sabe, tudo se imagina.
Circunda-te de rosas, ama, bebe
E cala. O mais é nada.




PESSOA, Fernando. "Odes de Ricardo Reis". Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1986.

15.1.10

Fernando Pessoa/Ricardo Reis: "Já sobre a fronte vã"




Já sobre a fronte vã se me acinzenta
O cabelo do jovem que perdi.
Meus olhos brilham menos,
Já não tem jus a beijos minha boca.
Se me ainda amas, por amor não ames:
Traíras-me comigo.



PESSOA, Fernando. "Ficções do interlúdio / Odes de Ricardo Reis". Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986.

23.10.09

Fernando Pessoa / Ricardo Reis: "Não consentem os deuses mais que a vida"




Não consentem os deuses mais que a vida

Não consentem os deuses mais que a vida.
Tudo pois refusemos, que nos alce
          A irrespiráveis píncaros,
          Perenes sem ter flores.
Só de aceitar tenhamos a ciência,
E, enquanto bate o sangue em nossas fontes,
          Nem se engelha connosco
          O mesmo amor, duremos,
Como vidros, às luzes transparentes
E deixando escorrer a chuva triste,
          Só mornos ao sol quente,
          E reflectindo um pouco.



PESSOA, Fernando. "Odes de Ricardo Reis". Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1986.