O seguinte artigo de Cacá Diegues foi publicado no jornal O Globo em 24 de março:
A cultura é a alma de um povo
Vira e mexe, a ministra Ana de Hollanda é atacada pelos jornais, através de artigos e manifestos, como uma Geni da cultura. Esta semana, texto subscrito por professores universitários, no jornal "O Estado de S. Paulo", e entrevista do ex-ministro Juca Ferreira, na "Folha de S.Paulo", pareciam petardos sincronizados, como numa campanha bélica bem tramada.
Não sou especialista em administração pública. Mas conhecendo a ministra e acompanhando de longe sua ação à frente do ministério, me estarreço com a violência praticada contra ela. Chego a pensar que não estamos acostumados à política exercida com discrição e serenidade, gostamos da tradição dos berros e dos murros na mesa, confundimos delicadeza com fragilidade.
São tão tortuosos e pouco sólidos os rumos desses desaforos, tão clara sua voracidade política, que seria mais simples se os agressores declarassem logo: "É que não vamos com a cara dela."
Juca Ferreira, o ministro do projeto autoritário da Ancinav, não esconde contra o que se bate: "Num estado com pouco controle social como o Brasil, você diz e faz o que quiser", declara em tom de lamentação, sobre algo que devia nos orgulhar. Antes dele, os professores liderados por Marilena Chauí listam várias expressões acadêmicas que gostariam de ouvir vindas do MinC e exigem dele uma participação criativa que não lhe cabe ousar ter. O velho e místico sebastianismo brasileiro ainda pensa que é o estado que produz e deve produzir cultura.
Ora, para os que já se esqueceram dele, lembro trechinho do belo discurso de posse da presidente Dilma Rousseff: "A cultura é a alma de um povo, essência de sua identidade. Vamos investir em cultura, ampliando a produção e o consumo em todas as regiões de nossos bens culturais." E então fui me informar do que anda fazendo o MinC de Ana de Hollanda para atender a esse programa anunciado pela presidente. Aqui transmito algumas respostas ouvidas por mim.
Em 2011, o MinC não só conseguiu dar conta de um enorme passivo de compromissos que ficaram a descoberto em 2010, como alcançou uma execução recorde de 98,98% dos limites autorizados para empenho. Isso significou R$1,069 bilhão em investimentos diretos, o maior número já alcançado pelo Ministério no que se refere ao efetivamente investido.
Ao contrário do que se tem dito, o orçamento do MinC, na gestão da presidente Dilma, é maior e mais realista do que o de gestões anteriores. O total de investimentos é de R$1,24 bilhão. Somando-se a isso os R$400 milhões a serem incorporados através do Fundo Setorial do Audiovisual, chega-se a R$1,64 bilhão, um recorde sem precedentes na pasta. E não se computa aqui o investimento indireto através das leis de incentivo, como a Rouanet.
E para onde têm ido esses recursos?
Os Pontos de Cultura encontravam-se sem pagamento desde o mês de março de 2010. Na atual gestão, o MinC já pagou cerca de R$100 milhões. O crescimento do orçamento do Programa Cultura Viva tem permitido a criação de novos Pontos de Cultura, o revolucionário projeto inaugurado por Gilberto Gil. Em 2010 o investimento nos Pontos de Cultura era de R$50 milhões. Em 2011, o primeiro ano da gestão atual, foram empenhados R$62 milhões e em 2012 esse valor saltou para R$114 milhões.
Em fevereiro deste ano, a ministra aprovou, junto à presidência, uma lista de programas prioritários que já estão em execução: o Brasil Criativo, que visa a ampliar as possibilidades de emprego e renda, a partir do potencial criativo; o Mais Cultura & Mais Educação, em parceria com o Ministério da Educação, para investir em cultura nas escolas; o PAC das Cidades Históricas, atuando em 125 cidades que possuem sítios históricos ou bens tombados; o de Praças dos Esportes e da Cultura, na periferia de 345 cidades, para construção de parques esportivos, bibliotecas, salas de espetáculo, cineclubes.
O ministério está investindo no processo de implantação do Sistema Nacional de Cultura, que pulou de 337 municípios e um estado integrados até 2010, para 782 municípios e 17 estados hoje. Na área do audiovisual, a aprovação recente da lei 12.485 vai permitir a presença do produto nacional independente nas televisões por assinatura e o crescimento dos recursos do Fundo Setorial. Um instrumento de remissão do cinema brasileiro.
Além disso, o MinC, com o apoio da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Cultura, se empenha na aprovação, pelo Congresso, de leis como as do Vale Cultura, do Procultura e sobretudo da revisão dos Direitos Autorais. Sou internauta e sei que não é mais possível nem desejável recolher esses direitos como se fazia no passado. Mas também não estou disposto a entregar o que sai de minha cabeça ao Creative Commons, um projeto de marketing de empresa esperta.
Foi isso o que me contaram e eu ouvi do MinC. Se alguém não concorda, que apure e se manifeste. Não precisa trucidar quem está do outro lado.
*************
Chico Anysio foi e será sempre o Rei da Comédia, como Pelé é do futebol e Roberto Carlos da canção popular. Aqui, o clichê é exato e irresistível: o mundo vai ficar mais triste sem ele.
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26.3.12
28.5.11
Entrevista a Helena Aragão para o número de junho da Revista da União Brasileira de Compositores (UBC)
A seguinte entrevista foi dada a Helena Aragão, para o número de junho da Revista da União Brasileira de Compositores (UBC). Essa revista se encontra, em formato digital, no seguinte endereço:
http://www.ubc.org.br/arquivos/download/revistas/ubc-09.pdf. O Múltiplo Antonio Cicero
Definir o trabalho de Antonio Cicero em uma palavra é difícil. Ele não é só um poeta, assim como não é apenas um letrista ou um filósofo. A soma desses lados resulta em um artista singular, admirado por criar versos que vão além da mera expressão da sua subjetividade. Letrista renomado, assinando parcerias com João Bosco, Adriana Calcanhotto e sua irmã Marina Lima, professor de filosofia, titular do blog Acontecimentos, onde reproduz poemas e textos seus e de gente que admira, ele está ocupando o Oi Futuro de Ipanema, no Rio de Janeiro, com seu projeto Poesia Visual, até este mês. Nesta entrevista, Antonio Cicero fala da importância da poesia nos dias de hoje, e reflete sobre suas ligações com filosofia e música, além de fazer uma defesa veemente do Ecad e do direito autoral.
Helena Aragão
O que faz um poema ser bom?
ANTONIO CICERO: Para mim um poema é bom se me faz pensar não apenas com o intelecto, mas com faculdades como a imaginação, a emoção, a sensibilidade, a sensualidade, a intuição, a memória etc. que brincam e se confundem umas com as outras.
Qual a razão para o desnível entre o número de poetas qurendo ser lidos e o de leitores de poesia?
A.C.: Não se lê um poema como se lê um artigo de jornal ou um e-mail, por exemplo. Para ler e fruir poesia é necessário dedicar tempo, concentração, atenção, cuidado a um texto que não tem nenhuma utilidade. A maior parte das pessoas não tem paciência para isso. Numa época em que todos se queixam de falta de tempo, é evidente que sobram argumentos para aqueles que pretendem não haver mais, hoje em dia, lugar para a poesia: para aqueles que afirmam que a poesia ficou para trás; que foi superada pelos joguinhos eletrônicos, por exemplo.
Acontece que quem não lê poesia – quem não lê boa poesia – não sabe sequer o que a poesia realmente é. O que se supõe vulgarmente é que a poesia seja um veículo para a expressão da subjetividade. Assim, muita gente, querendo se exprimir e pretendendo aparecer como poeta, simplesmente escreve sobre seus sentimentos, pensando que está fazendo poesia.
Um outro fator contribui para essa situação. É que, desde o momento em que as vanguardas mostraram que é possível escrever poemas sem o uso das formas fixas tradicionais, isto é, sem, por exemplo, o emprego de determinado esquema métrico ou de rimas, generalizou-se a ideia equivocada de que vale tudo em poesia. Ora, para quem pensa que vale tudo em poesia, é mais fácil escrever poesia do que escrever em prosa, pois, para escrever em prosa correta, é necessário ao menos seguir determinadas regras de gramática.
Em uma entrevista, você falou: "O filósofo pensa sobre o mundo. O poeta pensa o mundo". Como vê a conexão entre essas duas áreas?
A.C.: “Pensar sobre o mundo” é uma construção mais comum do que “pensar o mundo”. Acontece que a preposição “sobre” parece estabelecer uma distância entre o pensar e o mundo. O pensamento está de um lado, o mundo do outro, e a preposição no meio. Ou, em outras palavras, o sujeito está de um lado e o objeto do outro, separados pela preposição. É assim que o pensamento metafísico se retrata. Além disso, a preposição “sobre” também sugere uma certa elevação do pensamento sobre o mundo.
Quando, portanto, a preposição “sobre” é suprimida, na construção “pensar o mundo”, essa supressão sugere a supressão da separação, da mediação, entre o pensamento e o mundo, o sujeito e o objeto. O pensamento poético – e, de maneira geral, artístico – não se representa como fora do mundo, para pensar sobre ele, mas antes mergulha no mundo e se confunde com ele.
A criação de versos para poemas e para músicas tem processos diferentes?
A.C.: Sim, os processos são diferentes, exatamente porque, quando faço um poema para ser lido, penso apenas nele; já quando faço uma letra, faço-a tendo no ouvido e no pensamento a música que algum parceiro me enviou, isto é, faço-a para que essa música, quando casada com a letra que eu compuser, torne-se uma canção. Na verdade, quando faço uma letra, penso na música, no compositor e mesmo – se for para algum cantor ou cantora – penso nesse cantor ou cantora. Já musicaram vários poemas meus, sim. E gostei muito de quase todos os resultados. Por exemplo, Marina fez, do poema “Alma caiada”, uma canção que foi gravada pela Zizi Possi. Paulo Machado fez de “Maresia” uma canção que foi gravada pela Marina e pela Adriana Calcanhotto. Caetano Veloso de “Quase” uma canção que foi gravada pela Daúde. Orlando Moraes fez de “Dita” e “Logrador” canções que foram gravadas pela Maria Bethania, e de “Noite” outra, que foi gravada pela Adriana Calcanhotto. E, recentemente, José Miguel Wisnik musicou o poema “Os ilhéus”.
Diferentes parceiros musicais causam diferentes estímulos para os seus versos? A música de João Bosco, cujo violão chama atenção pela criatividade rítmica, exige mais do letrista que uma música de um compositor mais focado na melodia? Ou vice-versa?
A.C.: Os compositores e as músicas causam diferentes estímulos sim. Eu não faria a mesma letra para a Adriana que faria para o João Bosco, por exemplo. Mas como as músicas que ambos fazem são lindas, a facilidade ou dificuldade de compor para cada um deles é praticamente a mesma.
Como está vendo as discussões sobre as mudanças na lei de direito autoral? Como é essa questão para os letristas?
A.C.: Para mim, é claríssimo que, se alguém está ganhando dinheiro com o que um compositor fez, ele tem que ganhar uma parte desse dinheiro. Os sites que oferecem downloads de música e cobram por esse serviço ou são patrocinados têm que ser obrigados a pagar. As companhias telefônicas idem.
O Ecad é absolutamente necessário, pois o compositor não pode correr o Brasil e o mundo para cobrar pelos seus direitos. A campanha contra o Ecad é, por isso, absolutamente sórdida. Não tenho dúvida de que ela seja promovida e financiada por aqueles que querem roubar os compositores. Essa gente não tem escrúpulo nenhum. Basta ver que fazem de tudo para derrubar a Ministra da Cultura, Ana de Hollanda, desde que ela – agindo de modo absolutamente correto – tirou do site do Ministério a logomarca do Creative Commons.
Como você acha que as novas mídias afetaram os ganhos dos artistas, especialmente no que diz respeito ao direito autoral?
A.C.: No momento, afetam muito negativamente, em primeiro lugar, os direitos dos compositores. Mas penso que a própria tecnologia é capaz de fornecer os meios para que se possa controlar a circulação e distribuição das canções. Acredito que dentro de pouco tempo será possível que as canções se tornem disponíveis ao público por um preço muito mais baixo do que na época do disco, ao mesmo tempo em que os compositores sejam muito mais bem remunerados do que eram.
http://www.ubc.org.br/arquivos/download/revistas/ubc-09.pdf. O Múltiplo Antonio Cicero
Definir o trabalho de Antonio Cicero em uma palavra é difícil. Ele não é só um poeta, assim como não é apenas um letrista ou um filósofo. A soma desses lados resulta em um artista singular, admirado por criar versos que vão além da mera expressão da sua subjetividade. Letrista renomado, assinando parcerias com João Bosco, Adriana Calcanhotto e sua irmã Marina Lima, professor de filosofia, titular do blog Acontecimentos, onde reproduz poemas e textos seus e de gente que admira, ele está ocupando o Oi Futuro de Ipanema, no Rio de Janeiro, com seu projeto Poesia Visual, até este mês. Nesta entrevista, Antonio Cicero fala da importância da poesia nos dias de hoje, e reflete sobre suas ligações com filosofia e música, além de fazer uma defesa veemente do Ecad e do direito autoral.
Helena Aragão
O que faz um poema ser bom?
ANTONIO CICERO: Para mim um poema é bom se me faz pensar não apenas com o intelecto, mas com faculdades como a imaginação, a emoção, a sensibilidade, a sensualidade, a intuição, a memória etc. que brincam e se confundem umas com as outras.
Qual a razão para o desnível entre o número de poetas qurendo ser lidos e o de leitores de poesia?
A.C.: Não se lê um poema como se lê um artigo de jornal ou um e-mail, por exemplo. Para ler e fruir poesia é necessário dedicar tempo, concentração, atenção, cuidado a um texto que não tem nenhuma utilidade. A maior parte das pessoas não tem paciência para isso. Numa época em que todos se queixam de falta de tempo, é evidente que sobram argumentos para aqueles que pretendem não haver mais, hoje em dia, lugar para a poesia: para aqueles que afirmam que a poesia ficou para trás; que foi superada pelos joguinhos eletrônicos, por exemplo.
Acontece que quem não lê poesia – quem não lê boa poesia – não sabe sequer o que a poesia realmente é. O que se supõe vulgarmente é que a poesia seja um veículo para a expressão da subjetividade. Assim, muita gente, querendo se exprimir e pretendendo aparecer como poeta, simplesmente escreve sobre seus sentimentos, pensando que está fazendo poesia.
Um outro fator contribui para essa situação. É que, desde o momento em que as vanguardas mostraram que é possível escrever poemas sem o uso das formas fixas tradicionais, isto é, sem, por exemplo, o emprego de determinado esquema métrico ou de rimas, generalizou-se a ideia equivocada de que vale tudo em poesia. Ora, para quem pensa que vale tudo em poesia, é mais fácil escrever poesia do que escrever em prosa, pois, para escrever em prosa correta, é necessário ao menos seguir determinadas regras de gramática.
Em uma entrevista, você falou: "O filósofo pensa sobre o mundo. O poeta pensa o mundo". Como vê a conexão entre essas duas áreas?
A.C.: “Pensar sobre o mundo” é uma construção mais comum do que “pensar o mundo”. Acontece que a preposição “sobre” parece estabelecer uma distância entre o pensar e o mundo. O pensamento está de um lado, o mundo do outro, e a preposição no meio. Ou, em outras palavras, o sujeito está de um lado e o objeto do outro, separados pela preposição. É assim que o pensamento metafísico se retrata. Além disso, a preposição “sobre” também sugere uma certa elevação do pensamento sobre o mundo.
Quando, portanto, a preposição “sobre” é suprimida, na construção “pensar o mundo”, essa supressão sugere a supressão da separação, da mediação, entre o pensamento e o mundo, o sujeito e o objeto. O pensamento poético – e, de maneira geral, artístico – não se representa como fora do mundo, para pensar sobre ele, mas antes mergulha no mundo e se confunde com ele.
A criação de versos para poemas e para músicas tem processos diferentes?
A.C.: Sim, os processos são diferentes, exatamente porque, quando faço um poema para ser lido, penso apenas nele; já quando faço uma letra, faço-a tendo no ouvido e no pensamento a música que algum parceiro me enviou, isto é, faço-a para que essa música, quando casada com a letra que eu compuser, torne-se uma canção. Na verdade, quando faço uma letra, penso na música, no compositor e mesmo – se for para algum cantor ou cantora – penso nesse cantor ou cantora. Já musicaram vários poemas meus, sim. E gostei muito de quase todos os resultados. Por exemplo, Marina fez, do poema “Alma caiada”, uma canção que foi gravada pela Zizi Possi. Paulo Machado fez de “Maresia” uma canção que foi gravada pela Marina e pela Adriana Calcanhotto. Caetano Veloso de “Quase” uma canção que foi gravada pela Daúde. Orlando Moraes fez de “Dita” e “Logrador” canções que foram gravadas pela Maria Bethania, e de “Noite” outra, que foi gravada pela Adriana Calcanhotto. E, recentemente, José Miguel Wisnik musicou o poema “Os ilhéus”.
Diferentes parceiros musicais causam diferentes estímulos para os seus versos? A música de João Bosco, cujo violão chama atenção pela criatividade rítmica, exige mais do letrista que uma música de um compositor mais focado na melodia? Ou vice-versa?
A.C.: Os compositores e as músicas causam diferentes estímulos sim. Eu não faria a mesma letra para a Adriana que faria para o João Bosco, por exemplo. Mas como as músicas que ambos fazem são lindas, a facilidade ou dificuldade de compor para cada um deles é praticamente a mesma.
Como está vendo as discussões sobre as mudanças na lei de direito autoral? Como é essa questão para os letristas?
A.C.: Para mim, é claríssimo que, se alguém está ganhando dinheiro com o que um compositor fez, ele tem que ganhar uma parte desse dinheiro. Os sites que oferecem downloads de música e cobram por esse serviço ou são patrocinados têm que ser obrigados a pagar. As companhias telefônicas idem.
O Ecad é absolutamente necessário, pois o compositor não pode correr o Brasil e o mundo para cobrar pelos seus direitos. A campanha contra o Ecad é, por isso, absolutamente sórdida. Não tenho dúvida de que ela seja promovida e financiada por aqueles que querem roubar os compositores. Essa gente não tem escrúpulo nenhum. Basta ver que fazem de tudo para derrubar a Ministra da Cultura, Ana de Hollanda, desde que ela – agindo de modo absolutamente correto – tirou do site do Ministério a logomarca do Creative Commons.
Como você acha que as novas mídias afetaram os ganhos dos artistas, especialmente no que diz respeito ao direito autoral?
A.C.: No momento, afetam muito negativamente, em primeiro lugar, os direitos dos compositores. Mas penso que a própria tecnologia é capaz de fornecer os meios para que se possa controlar a circulação e distribuição das canções. Acredito que dentro de pouco tempo será possível que as canções se tornem disponíveis ao público por um preço muito mais baixo do que na época do disco, ao mesmo tempo em que os compositores sejam muito mais bem remunerados do que eram.
14.5.11
Mauro Dias: "Breve história de um golpe"
O seguinte -- excelente -- artigo de Mauro Dias sobre a infame campanha para derrubar a ministra Ana de Hollanda foi publicado pelo jornal O Globo no sábado, 13 de maio. Aliás, no seu blog (http://mauromaurodias.blogspot.com/), Mauro postou um artigo mais longo sobre o mesmo tema.
Breve história de um golpe
O movimento para expulsar Ana de Hollanda do comando do Ministério da Cultura tem caráter golpista. É coisa de quem se achava sucessor natural de Gilberto Gil e Juca Ferreira e se viu preterido. É coisa de partido que julgava ser chegada sua hora e caiu em frustração. Para ser preterido por quem? Não por uma acadêmica notável, ou figura notória, mas por uma cantora independente, pouco conhecida e que, além do mais, se julga dona do próprio nariz. E comete o desplante de querer dar nova ordem à casa.
Para começo de conversa, Ana de Hollanda mandou tirar da página do ministério o link para um mecanismo privado chamado Creative Commons (CC), alegando tratar-se de peça publicitária. O Creative Commons ajuda um criador (autor, intérprete, o que seja) a abrir mão, parcial ou totalmente, de seus direitos autorais. A questão, alegou a ministra, muito acertadamente, é que a legislação ordinária brasileira já trata do assunto. Portanto, não é necessário usar uma ferramenta privada para alcançar o mesmo fim. Além disso, o fato de o link figurar com destaque na página do ministério lhe parecia induzir o criador a abrir mão de seus direitos. E ela acha que os autores devem receber pelo que criam.
Daí sua defesa do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (de direitos autorais) - Ecad. Até os pombos da Praça Mahatma Gandhi sabem que o Ecad funciona mal, tem sérios problemas de gestão e precisa ser consertado - jamais implodido, como quer a mesma turma que defende o link do CC na página do Ministério da Cultura. Pois o Ecad tem compromisso com a propriedade intelectual. Os defensores do CC dizem que a propriedade intelectual dificulta o livre trânsito de informação. Só que esse "livre trânsito" traz muito dinheiro para quem faz a informação circular. Por que o criador, e só ele, deve abrir mão de sua parte?
Esses dois tópicos - CC e Ecad - são a parte mais visível da orquestração para expulsar Ana de Hollanda do Ministério da Cultura, do golpe em andamento. Mas é possível imaginar que, se a ministra deixasse tudo como estava, ainda assim sofreria campanha difamatória por parte dos preteridos. O que está em pauta não é cultura ou política cultural, é poder. (E é importante dizer que o Creative Commons não foi proibido, nem mesmo condenado. Só saiu da página do MinC. Quem quiser usar, use. Está na internet.)
A campanha em curso, além de desleal, é maligna, perniciosa, nociva, pois ter um artista independente no Ministério da Cultura é coisa ótima para a cultura. Independente é quem não orienta a obra pela grande indústria do entretenimento, não se deixa dobrar por injunções de caráter comercial. É quem tem como guia criativo o primado estético, a convicção do sotaque, a compreensão da diversidade. Quem, portanto, pode olhar de forma mais generosa para a grandiosa, plural e pouco conhecida produção da cultura nacional e, a partir do olhar generoso, criar e incentivar políticas públicas que nos defendam da mesmice, do marasmo, da redundância. Coisa que é, por sinal, papel do Ministério da Cultura.
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