Mostrando postagens com marcador Espanto. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Espanto. Mostrar todas as postagens

14.10.08

Wisława Szymborska: Trecho de "O poeta e o mundo"





O mundo – o que quer que pensemos quando aterrorizados pela sua vastidão e pela nossa própria impotência, ou amargurados pela sua indiferença e pelo sofrimento individual de pessoas, animais e talvez até de plantas, pois o que garante que as plantas não sintam dor; o que quer que pensemos das extensões penetradas pelos raios de estrelas cercadas de planetas que tenhamos acabado de descobrir: de planetas já mortos? Ainda mortos? Simplesmente não sabemos; o que quer que pensemos desse teatro incomensurável para o qual temos bilhetes reservados, mas bilhetes cuja duração é ridiculamente curta, sendo cercada por duas datas arbitrárias; o que quer que pensemos deste mundo – ele é espantoso.

Mas “espantoso” é um epíteto que oculta uma armadilha lógica. Afinal, ficamos espantados por coisas que desviam de alguma norma bem conhecida e universalmente aceita, de uma obviedade à qual nos acostumamos. Ora, o problema é que não há esse mundo óbvio. Nosso espanto existe por si e não se baseia na comparação com coisa nenhuma.

É verdade que, na fala cotidiana, em que não paramos para pesar cada palavra, usamos frases como “o mundo cotidiano”, “a vida corriqueira”, “o curso normal das coisas”... Mas na língua da poesia, em que cada palavra é sopesada, nada é comum ou normal. Nem sequer uma pedra e nem sequer uma nuvem por cima. Nem sequer um dia e nem sequer uma noite depois. E sobretudo, nem sequer uma existência, seja de quem for, neste mundo.




De: SZYMBORSKA, Wisława. "The poet and the world". Nobel lecture.