1.2.20

Cesare Pavese: "La notte" / "A noite": trad. de Carlos Leite




A noite


Mas a noite ventosa, a noite límpida
que a lembrança somente aflorava, está longe,
é uma lembrança. Perdura uma calma de espanto,
feita também ela de folhas e de nada. Desse tempo
mais distante que as recordações apenas resta
um vago recordar.

As vezes volta à luz do dia,
na imóvel luz dos dias de Verão,
aquele espanto remoto.

Pela janela vazia
o menino olhava a noite nas colinas
frescas e negras, e espantava-se de as ver assim tão juntas:
vaga e límpida imobilidade. Entre a folhagem
que sussurrava na escuridão, apareciam as colinas
onde todas as coisas do dia, as ladeiras
e as árvores e os vinhedos, eram nítidas e mortas
e a vida era outra, de vento, de céu,
e de folhas e de coisa nenhuma.

Às vezes regressa
na imóvel calma do dia a recordação
daquele viver absorto, na luz assombrada.






La notte


Ma la notte ventosa, la limpida notte
che il ricordo sfiorava soltanto, è remota,
è un ricordo. Perdura una calma stupita
fatta anch'essa di foglie e di nulla. Non resta,
di quel tempo di là dai ricordi, che un vago
ricordare.

Talvolta ritorna nel giorno
nell'immobile luce del giorno d'estate,
quel remoto stupore.

Per la vuota finestra
il bambino guardava la notte sui colli
freschi e neri, e stupiva di trovarli ammassati:
vaga e limpida immobilità. Fra le foglie
che stormivano al buio, apparivano i colli
dove tutte le cose del giorno, le coste
e le piante e le vigne, eran nitide e morte
e la vita era un'altra, di vento, di cielo,
e di foglie e di nulla.

Talvolta ritorna
nell'immobile calma del giorno il ricordo
di quel vivere assorto, nella luce stupita.






PAVESE, Cesare. "La notte" / "A noite". In: Trabalhar cansa. Trad. de Carlos Leite. Lisboa: Cotovia, 1997.

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