8.9.15

Manuel Bandeira: "Momento num café"




Momento num café

Quando o enterro passou
Os homens que se achavam no café
Tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida.

Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado
Olhando o esquife longamente
Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é traição
E saudava a matéria que passava
Liberta para sempre da alma extinta.




BANDEIRA, Manuel. "Momento num cafe". In:_____. 50 poemas escolhidos pelo autor. São Paulo: Cosacnaify, 2006.

6 comentários:

léo disse...

Quanto a mim, eternamente apaixonado por Bandeira, que tive minha primeira experiência forte, com a poesia batendo à toda força quando vi, num livro de colégio, uma foto da baía de Guanabara com aquele poema que diz: "Que importa a paisagem, a glória, a baía, a linha do horizonte: o que eu vejo é o beco", só posso agradecer e admirar meu velho e querido poeta. Força e beleza, Cícero!

Siegfried Fuchs disse...

Mas a alma está no corpo e morre. A "vida", o mundo, é onde está o sentido que nós buscamos conhecer. Ele não está num além da vida, metafísico e nem religioso.
Acho bom demais o poema pois mostra essa compreensão equivocada da questão e ao mesmo tempo porque não se compreende o sentido da cultura, na sociedade e na pessoalidade individual de cada um.

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,


Bandeira, gigante Bandeira! Grato,Cicero, por postar belíssimo poema de um mestre da poesia!


Abraço forte,
Adriano Nunes

Unknown disse...

Vivem os homens, majoritariamente, de modo maquinal, irrefletidamente, pois aceitaram talvez a "coisa oferta", a máquina do mundo de que nos fala outro grande poeta, o Carlos Drummond de Andrade. Somente uma minoria alcançou certa maioridade kantiana, por isso com o poeta de Itabira recusou a oferta da máquina do mundo, preferindo o livre pensar, a libertação, daí seu representante em meio à multidão ser o único a pensar na vida como agitação feroz e sem finalidade. Sair do módulo automático implica pensar por si mesmo, refletir a própria existência, examinar a vida como diria Sócrates. Esse poema de Bandeira traz um bela reflexão existencial, um convite à verdadeira libertação, pois a prisão mental é a pior prisão, incomparavelmente pior que a de metal.

Unknown disse...

Antonio Cícero, não há como mensurar sua grandeza de poeta e pensador. Sou leitor de sua vasta obra e apreciador de seu pensar lúcido e profundo.

Antonio Cicero disse...

Caro Unknown, muito obrigado pelo seu comentário generoso!