29.6.14

Ruy Castro: "Não ia ter Copa"

O seguinte -- excelente -- artigo de Ruy Castro foi publicado no jornal Folha de São Paulo, em 28 de junho do corrente:



Não ia ter Copa


Não ia ter Copa, lembra-se? Cinquenta desajustados mentais em cada cidade exibiam cartazes com esses dizeres e, misturando-se a manifestantes com reivindicações legítimas e específicas, atreviam-se a falar pelos milhões de brasileiros que gostam de futebol. E, por quase um ano, valendo-se da nossa incapacidade para cumprir prazos, respeitar orçamentos e prover segurança, fizeram parecer que seu mote ganharia quorum para se tornar realidade.

Nós, da mídia, fomos essenciais para esse pessimismo, denunciando a Fifa como Estado invasor, o fracasso na preparação da infraestrutura exigida para receber os visitantes e a diferença entre o custo estimado dos estádios e o custo real --embora não me lembre de nenhuma reportagem dizendo para onde foi o dinheiro. O "Imagina na Copa!", que começou como uma brincadeira, tornou-se a sentença para a nossa inabalável vocação para o subdesenvolvimento.

A revolta ficou ainda maior ao se constatar que, pela configuração dos estádios, o preço dos ingressos e a escolha de certas cidades-sede, esta seria uma Copa de e para as "elites" --triste ironia sabendo-se que fazia parte do plano de um governo "popular" para eternizar-se no poder. Como se fosse pouco, veio o desgaste do dito governo, provocado pela economia pífia, a corrupção comprovada e o cansaço do discurso oficial. A Copa, em certo momento, parecia simbolizar toda uma farsa. Era inevitável que entrasse na agenda dos protestos que começaram em junho de 2013.

Um comentário:

Anônimo disse...


Uma porrada bem dada. Há, decerto, argumentos irrefutáveis no artigo do Ruy Castro. Como exemplo, transcrevo estes:

"Nós, da mídia, fomos essenciais para esse pessimismo, denunciando a Fifa como Estado invasor, o fracasso na preparação da infraestrutura exigida para receber os visitantes e a diferença entre o custo estimado dos estádios e o custo real --embora não me lembre de nenhuma reportagem dizendo para onde foi o dinheiro. O "Imagina na Copa!", que começou como uma brincadeira, tornou-se a sentença para a nossa inabalável vocação para o subdesenvolvimento.

A revolta ficou ainda maior ao se constatar que, pela configuração dos estádios, o preço dos ingressos e a escolha de certas cidades-sede, esta seria uma Copa de e para as "elites" --triste ironia sabendo-se que fazia parte do plano de um governo "popular" [...]".

Não penso que o PT queira perpetuar-se no poder, nem pense nisso como algo legítimo, ou crível. Apenas faço esta breve ressalva.

No mais, como escrevi, o Ruy Castro é o antídoto para a leviandade. Gosto dele imensamente, como jornalista, escritor e formador de opinião. Escreve fácil, como quem bate um papo, e pode até parecer ser fácil escrever assim, mas não é. É preciso ter uma habilidade de craque, muita luta, bastante bagagem, é preciso ter pelejado "como um remador de Ben-Hur", para usar uma expressão fincada por Nelson Rodrigues, expressão e autor tão caros ao Ruy, cuja palavra merece ser lida com bastante atenção.
Abraços
Arsenio Meira Filho