Na ocasião em que recebi o Prêmio ABL de Poesia, dei a Nahima Maciel a seguinte entrevista, publicada no dia 21 de julho, no Correio Brasiliense:
- Pode falar um pouco
sobre o Porventura? Como nasceu o livro? Que temas te inquietavam na hora
em que escreveu os versos? Foram escritos de uma vez ou são poemas de vários
períodos diferentes?
São poemas escritos
ao longo de mais ou menos uma década. Ao final de 2011 – precisamente ao
terminar de escrever um poema chamado “Nihil”, achei que, excluindo vários
poemas, escrevendo alguns outros, modificando terceiros e organizando-os numa
certa sequência, eu teria um livro de poesia pronto. E comecei a trabalhar nesse
sentido. Os temas são variados, mas talvez o tempo, a efemeridade da vida e a
própria poesia sejam os mais frequentes.
- O que o prêmio
significa para você? E a ABL?
A ABL é composta por
um grupo de notáveis que inclui vários poetas, escritores, críticos, pensadores,
artistas que admiro muito. Que tal grupo me tenha conferido esse prêmio
representa um reconhecimento do valor da minha poesia que me deixa muito feliz.
- Houve uma época em
que a filosofia se antepôs à poesia na tua vida. E hoje, qual o espaço da
filosofia?
Na verdade, acho que
a filosofia nunca propriamente se antepôs à poesia, na minha vida. O que
acontece é que, quando decido escrever um texto filosófico, faço-o para
intervir, isto é, para tomar posição, para tomar partido, em discussões sobre
questões fundamentais que dizem respeito ao sentido do conhecimento, do ser, da
vida, dos valores éticos e estéticos etc. Em última análise, quando escrevo um
texto filosófico, faço-o porque suponho ter algo a dizer que possa fazer alguma
diferença: algo que possa mudar para melhor o modo de as pessoas pensarem ou
agirem em relação a alguma coisa. E tenho a pretensão de que tal mudança possa
ser, de algum modo, importante: de que, ainda que numa escala ínfima, ela possa
tornar o mundo melhor. Logo, sinto certa urgência, e mesmo certa obrigação ética
de escrevê-lo.
Já a maravilha da
poesia consiste justamente em nos dar acesso a outra temporalidade, que nada tem
a ver com essa temporalidade prática, política, utilitária, instrumental a que,
em última análise, a filosofia está ligada. Por isso, não sinto a mesma urgência
em escrever poemas. Quem começa a fazer um poema tem que se deixar levar pelo
tempo que ele exija. Ele pode ficar pronto em pouco tempo, mas pode demorar
dias, semanas, meses, anos. E pode jamais ficar pronto ou ficar bom. E o poema é
bom quando vale por si. Ora, nada me dá tanta satisfação quanto fazer algo que
penso valer por si.
- Li em uma entrevista
que é difícil para você escrever poesia. Por que?
Não é tanto que seja
difícil: é que não basta que eu queira escrever um poema, para que o faça. É
preciso que ele aconteça em mim, ou através de mim, por razões que não dependem
exclusivamente da minha vontade, e cuja natureza precisa ignoro.
- O que acha dessa
jovem poesia que tem despontado principalmente no Rio de Janeiro?
Gosto de vários
jovens poetas. É sempre chato citar nomes, porque a gente acaba esquecendo, às
vezes, do(s) mais importante(s). Mas gosto, por exemplo, de Omar Salomão, de
Fabrício Corsaletti, de Bruna Beber...
- A variedade formal
nos poemas é algo que te move? Como ela acontece? Você acha que
Porventura tem mais dessa variedade do que A cidade e os livros?
Que diferenças você vê em relação aos teus últimos dois livros?
Ela simplesmente
acontece. Às vezes, um primeiro verso me sugere uma métrica. Às vezes, a forma
vai se impondo, não sei dizer por que. Acho que, de fato, A cidade e os
livros é dotado de maior unidade formal do que os demais. Mas não sei
explicar a razão disso.
- Qual o espaço da
ideia e qual o espaço do cotidiano no teu processo poético?
Isso muda de poema
para poema. Tudo o que a gente sabe, toda nossa experiência, toda nossa
filosofia, toda nossa fantasia, toda nossa cultura, tudo é capaz de entrar num
poema. O poema é feito com todas as nossas faculdades: intelecto, intuição,
razão, sensibilidade, sensualidade, humor, memória etc. E a importância de cada
um desses fatores varia de poema para poema. Não há fórmula
pronta.
- A poesia e a música
acontecem de forma diferente na tua cabeça? Como?
Sim. É que não sou
músico. Não toco nenhum instrumento, nem sei cantar. Só faço a letra. E faço a
letra depois de ouvir a música com a qual ela vai se casar. Por isso, para mim,
a diferença entre a letra e o poema é que o fim deste está em si próprio,
enquanto que o fim da letra é a canção que vai resultar do casamento dela com a
música.
- E a poesia no Brasil,
você acha que ela está em alta? Que as editoras estão publicando mais? Ou
não?
Tomara que sim. O
sucesso do esplêndido livro “Toda poesia”, de Leminski, faz pensar que sim. Mas
uma vez ouvi o próprio Leminski dizer, numa palestra, que o fato de que livro de
poesia não venda é uma coisa boa, e não ruim. Por que? Porque – dizia ele – isso
significa que não se faz poesia por dinheiro, mas somente por amor. Concordo com
isso.
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