18.4.13

W.H. Auden: "Lay your sleeping head, my love" / "Repousa, meu amor, a tua cabeça adormecida": trad. Margarida Vale de Gato







Lay your sleeping head, my love

Lay your sleeping head, my love,
Human on my faithless arm;
Time and fevers burn away
Individual beauty from
Thoughtful children, and the grave
Proves the child ephermeral:
But in my arms till break of day
Let the living creature lie,
Mortal, guilty, but to me
The entirely beautiful.

Soul and body have no bounds:
To lovers as they lie upon
Her tolerant enchanted slope
In their ordinary swoon,
Grave the vision Venus sends
Of supernatural sympathy,
Universal love and hope;
While an abstract insight wakes
Among the glaciers and the rocks
The hermit’s sensual ecstasy.

Certainty, fidelity
On the stroke of midnight pass
Like vibrations of a bell,
And fashionable madmen raise
Their pedantic boring cry:
Every farthing of the cost,
All the dreadful cards foretell,
Shall be paid, but from this night
Not a whisper, not a thought,
Not a kiss nor look be lost.

Beauty, midnight, vision dies:
Let the winds of dawn that blow
Softly round your dreaming head
Such a day of sweetness show
Eye and knocking heart may bless.
Find the mortal world enough;
Noons of dryness see you fed
By the involuntary powers,
Nights of insult let you pass
Watched by every human love.




Repousa, meu amor, a tua cabeça adormecida

Repousa, meu amor, a tua cabeça adormecida,
Humana, sobre o meu braço descrente;
O tempo e as febres consomem
A singular beleza das
Crianças pensativas, e a campa
Prova que é frágil a criança;
Mas nos meus braços, até amanhecer
Deixa jazer a criatura viva,
Mortal, pecadora, mas para mim,
De uma beleza sem fim.

Não têm limites a alma e o corpo:
Aos amantes que se deitam
Sobre a sua vertente encantada
Num habitual delíquio,
Oferece Vénus uma grande visão
De compaixão sobrenatural,
De esperança e de amor universal;
Enquanto uma abstracta percepção
Desperta, entre rochas e glaciares,
O êxtase sensual do ermitão.

A certeza, a fidelidade,
Ao toque da meia-noite se vão
Como vibrações de um sino,
E os loucos em voga erguem
O seu grito maçador e pedante;
E tudo até ao último tostão,
Predizem-no as cartas temidas,
Será pago, mas desta noite,
Não se perca um só instante,
Um único beijo, um pensar,
Um suspiro anelante.

A beleza, a meia-noite, a visão fenece.
Que sopre suave o vento errante
Da aurora sobre a tua cabeça adormecida,
Desvelando um dia de tanta doçura
Que agracie o olhar e o coração pulsante,
Bastando-lhes o mundo mortal;
E que te saciem, na árida secura,
Os poderes involuntários,
E possas passar, nas noites de injúria,
À guarda de todo o humano amor.




AUDEN, W.H. Outro tempo. Trad. Margarida Vale de Gato. Lisboa: Relógio d'Água, 2003.

5 comentários:

Thais Santos disse...

Belíssimo poema. Interessante é observar a percepção da tradutora ao fazer escolhas que permitam manter o mesmo sentido do texto original com alguns jogos na sonoridade. Quem traduz também cria.

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,

gosto muito desse poema! Bela tradução! Grato por compartilhar! Deixo aqui a minha tradução para um poema de John Keats:


"Hino a Apolo" (Tradução de Adriano Nunes)

Deus do dourado arco,
E da dourada lira,
E do dourado pelo,
E do dourado fogo,
Cocheiro
Do paciente ano,
Onde - onde dormira tua ira,
Quando feito pálido tolo eu pus tua sorte,
Teu louro, tua glória,
A luz da tua história,
Ou fui um verme - rastejando para a morte?
Ó Délfico Apolo!

O Trovejador capturara e capturara,
O Trovejador enrugara-se e enrugara-se;
A delicada plumagem da águia
Pela ira tornou-se rígida - o som
Do produtivo trovão
Fora torporoso então,
Desestruturando-se em murmurante tom.
Ó por que tiveste pena, e por um verme
Por que tocaste teu suave alaúde
Até o trovão ficar mudo?
Por que não me esmagaste - qual ínfimo germe?
Ó Délfico Apolo!

As Plêiades ascenderam,
Observando o ar silente;
Na Terra as raízes e as sementes
Pelo passar do verão túrgidas ficaram;
O Oceano, seu vizinho,
No velho labor, sozinho,
Quando, quem - quem ousara
Atar, tal louco, em sua fronte a flora,
E rir e ver orgulhosamente,
E blasfemar altissimamente,
E viver pra tal honra, pra a ti inclinar-se agora?
Ó Délfico Apolo!

John Keats: "Hymn To Apollo"

GOD of the golden bow,
And of the golden lyre,
And of the golden hair,
And of the golden fire,
Charioteer
Of the patient year,
Where---where slept thine ire,
When like a blank idiot I put on thy wreath,
Thy laurel, thy glory,
The light of thy story,
Or was I a worm---too low crawling for death?
O Delphic Apollo!

The Thunderer grasp'd and grasp'd,
The Thunderer frown'd and frown'd;
The eagle's feathery mane
For wrath became stiffen'd---the sound
Of breeding thunder
Went drowsily under,
Muttering to be unbound.
O why didst thou pity, and beg for a worm?
Why touch thy soft lute
Till the thunder was mute,
Why was I not crush'd---such a pitiful germ?
O Delphic Apollo!

The Pleiades were up,
Watching the silent air;
The seeds and roots in Earth
Were swelling for summer fare;
The Ocean, its neighbour,
Was at his old labour,
When, who---who did dare
To tie for a moment, thy plant round his brow,
And grin and look proudly,
And blaspheme so loudly,
And live for that honour, to stoop to thee now?
O Delphic Apollo!

In: KEATS, John. "Complete poems and selected letters of John Keats". New York: The Modern Library, 2001, pages 290 e 291. Introduction by Edward Hirsch.


Abraço forte,
Adriano Nunes

Gustavo disse...

Excelente postagem! Gostei demais!

André Pio disse...

Prezado Cícero, poste também a belíssima tradução do Paulo Mendes Campos deste mesmo poema.

Antonio Cicero disse...

Caro André Pio,

obrigado pela sugestão. Gosto muito do Paulo Mendes Campos, mas não tenho o livro em que esse poema se encontra. Você o tem?