27.11.11

Paulo Henriques Britto: "Ontologia sumaríssima"




Ontologia sumaríssima

Umas quatro ou cinco coisas,
no máximo, são reais.

A primeira é só um gás
que provoca a sensação
de que existe no mundo
uma profusão de coisas.

A segunda é comprida,
aguda, dura e sem cor.
Sua única serventia
é instaurar a dor.

A terceira é redondinha,
macia, lisa, translúcida,
e mais frágil do que espuma.
Não serve para coisa alguma.

A quarta é escura e viscosa,
como uma tinta. Ela ocupa
todo e qualquer espaço
onde não se encontre a quinta
(se é que existe mesmo a quinta),

a qual é uma vaga suspeita
de que as quatro acima arroladas
sejam tudo o que resta
de alguma coisa malfeita
torta e mal-ajambrada
que há muito já apodreceu.

Fora essas quatro ou cinco
não há nada,
nem tu, leitor,
nem eu.




BRITTO, Paulo Henriques. Mínima lírica. São Paulo: Duas Cidades, 1989.

2 comentários:

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,


um poema meu:


‎"sorteio" - Para o meu amigo e poeta Sebage Jorge Barboza

o amor,
o inaudito ou
isso que se condessou
em leis e livros, ou
esse meio propício,
irresistível,
de desafiar o in-
finito,
de concebê-lo,
acertando o

recheio do ser
alheio,
seja lá o que for,
contrato, conflito,
receio, recreio,
cálculo exato ou
sorteio,
entre tragédia, tédio,
insônia, intriga e
medo,

entre vexame, verdade e
devaneio,
astúcia, artimanha, misto
de desculpa, descuido, destino,
promessa promíscua
de futuro garantido,
sonho, sangue, sentido e
o íntimo,
confesso:
provei-o!


Abraço forte,
Adriano Nunes

Necopinus disse...

Paulo Henrique é um príncipe da Arcádia. Superbacana!