20.1.11

Geir Campos: "A árvore"




Por sugestão do Jefferson Bessa, publico o soneto "A árvore", de Geir Campos:


A árvore

Ó árvore, quantos séculos levaste
a aprender a lição que hoje me dizes:
o equilíbrio, das flores às raízes,
sugerindo harmonia onde há contraste?

Como consegues evitar que uma haste
e outra se batam, pondo cicatrizes
inúteis sobre os membros infelizes?
Quando as folhas e os frutos comungaste?

Quantos séculos, árvore, de estudos
e experiências – que o vigor consomem
entre vigílias e cismares mudos –

demoraste aprendendo o teu exemplo,
no sossego da selva armada em templo,
E dize-me: há esperança para o Homem?



CAMPOS, Geir. "A árvore". In: CAMPOS, Paulo Mendes (org.) Forma e expressão do soneto. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde, 1952.

Esse soneto foi publicado originalmente em:

CAMPOS, Geir. Rosa dos rumos. Rio de Janeiro: Revista Literária, 1950.

9 comentários:

Roberto Bozzetti disse...

Meu caro Cícero,

não deixa de ser curioso encontrar aqui um soneto de Geir Campos aqui e vou tentar explicar por que, sem me estender muito:
é que Geir é um dos nomes automaticamente associados à Geração de 45 (como Domingos Carvalho da Silva, Péricles Eugênio, Ledo Ivo etc)e durante muito tempo isso foi - e é - anátema: impensável nos anos 70, 80 que esses poetas fossem considerados sem desagrado ou simplesmente descartados de saída por setores vastos da nossa "inteligência" e não apenas acadêmica: dos concretistas a Merquior, passando por Affonso Romano, Costa Lima e outros (para não dizer: todos); o próprio João Cabral tem a ver com isso, uma vez que,pertencente cronologicamente a essa geração sempre procurou desidentificar-se a ela (por exemplo, no seu poema “A cana dos outros” ele avisa de saída que o lavrador de que fala não tem nada a ver com “o Semeador que se sonetizou”, possível referência a um poema de Péricles Eugênio; além da “Anti-ode”, claro, e outros exemplos); e tem a ver com isso, também, a prática do soneto, que passou a ser automaticamente associada a parnasianismo academicista; mas uma compreensão mais ampla e mais isenta de preconceitos contra esses poetas a meu ver ainda está por ser feita;
quanto a Geir, nesse soneto acho mesmo que ele não escapa a certo neoparnasianismo, pela linguagem um tanto “alambicada” e o convencionalismo imagético, a que não falta o “verso de ouro” filosofante. Mas quero crer que nem todo o Geir é isso, embora transite quase sempre nessa fronteira difícil de avaliação. Pelo fato de ser um virtuose – nesse sentido, um pouco como na geração modernista, Guilherme de Almeida – e um estudioso aplicado de seu ofício, penso que Geir possui poemas de valor, como a série “amoral” de suas Cantigas de amigo – ao outro homem da mulher amada. Mas ainda assim, não só nesses: há em seu percurso momentos que aprecio, inclusive os seus dois poemas “participantes” Canto de Peixe I e II;
mas já em protocolo de saída,que acho que me estendi demais, e você, Cícero, não tem nada a ver com isso: mas ando transitando por essas discussões, envolvido com a tentativa de um trabalho de maior fôlego que começo a elaborar; eu queria sobretudo era registrar essa surpresa de “um poeta contemporâneo” (desculpe o mau jeito...) estar postando Geir Campos. Agradável surpresa, pelo que atesta de ausência de preconceitos.
O abraço

Ana Cristina Penov disse...

Muito lindo. Obrigada. Abraço

Antonio Cicero disse...

Caro Roberto,

Para falar a verdade, não acho ruim, mas tampouco morro de amores por esse poema do Geir Campos. Ocorre que quando você demonstrou curiosidade sobre a antologia de Paulo Mendes Campos onde eu havia colhido o poema do Cassiano Ricardo, mencionei que ela abrangia desde “Buscando o Cristo crucificado”, de Gregório de Matos, até “A árvore”, de Geir Campos. Isso excitou a curiosidade de Jefferson Bessa, que sugeriu que eu aqui publicasse “A árvore”. Foi o que fiz.
Mas devo dizer que não tenho, de fato, preconceito contra nenhum tipo de poema ou poeta. Oponho-me, por vezes, às ideologias deles; e a da Geração de 45, em particular, me parece intragável. Mas isso não quer dizer que eu não possa publicar poemas ou poetas que foram ligados a essa geração, desde que não os ache ruins. Só tenho preconceito contra poemas ruins.
Assim, você encontrará aqui críticas à ideologia poética de Domingos Carvalho da Silva (veja meu artigo “Vanguarda e fetiche”, em http://antoniocicero.blogspot.com/2009/03/vanguarda-e-fetiche.html e as palavras do Donizete Galvão, em http://antoniocicero.blogspot.com/2009/03/donizete-galvao-sobre-domingos-carvalho.html; mas encontrará também um belo poema de Domingos Carvalho da Silva, em http://antoniocicero.blogspot.com/2009/08/domingos-carvalho-e-silva-poema.html; e encontrará dois belíssimos poemas do Ledo Ivo, em http://antoniocicero.blogspot.com/2009/07/ledo-ivo-soneto-da-porta.html e em http://antoniocicero.blogspot.com/2008/12/ledo-ivo-valsa-fnebre-de-hermengarda.html; Ledo Ivo, de quem, aliás, João Cabral foi um grande amigo até o fim.

Abraço

Roberto Bozzetti disse...

Perfeito, Cícero

é justamente essa falta de preconceito que em certo sentido é um dado novo - não em você, claro.
Estou totalmente de acordo quanto a tudo o mais.

Um abraço

Jefferson Bessa disse...

Cícero, agradeço muito a possibilidade de ler o poema de Geir Campos. O que se revela sempre para mim é que o melhor mesmo é ler um poema. Bem melhor é ler um bom poema e “ser” com todos eles. Ao ler o poema, a leitura se fez bem ampla. Gostei muito.
Tomei nota do livro no qual originalmente o poema se insere. Obrigado, Cícero!
Abraço.

ipaco disse...

Concordo com Cícero quanto ao critério da qualidade do poema (por mais subjetivo que seja esse juízo). É uma forma mais generosa de ler os autores, qualquer que seja a sua corrente ou linhagem. Mas também me parece que há pouco material disponível sobre a geração de 45, como movimento estético (em comparação, por exemplo, aos concretos ou aos marginais). Sempre resumem eesse grupo ideologicamente como um retorno ao soneto, o que me parece uma simplificação. É como se o movimento literário realmente válido fosse exclusivamente aquele que vem do modernismo e salta direto para as vanguardas dos anos 50. Abs.

Eduardo disse...

Parabéns pelo conteúdo e organização do Blog...

Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade.
Carlos Drummond de Andrade

Anônimo disse...

Não conhecia e gostei ...


Abraço e uma Noite de Paz.

Nayara Brito disse...

Genial.