22.11.10

Nelson Ascher: "Adivinhação"




Adivinhação

          p/ d.p. aos 70

O que é o que é
que, quando se entrecruzam
à beira do silêncio
sintagma e paradigma,

obriga a língua a dar
com a linguagem nos dentes,
deixa as palavras todas
com a língua de fora?

O que é o que é
que, onde "o amor e, em sua
ausência, o amor" ou "manchas
solares confabulam",

deixa a linguagem boqui-
aberta, sem palavras,
e obriga os linguarudos
a engolirem a língua?

O que é, o que é
que edípico e antropófago
bolina e morde, morde e
bolina a própria língua

materna até que doa
com gosto? — É a poesia
que o dolce software nuovo
contém. Pois é: poesia.



ASCHER, Nelson. Parte alguma. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

3 comentários:

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,


gosto muito desse poema. Salve Nelson Ascher! Amo-o! ..."pois é: poesia"


Abraço fraterno,
Adriano Nunes.

Roberto Bozzetti disse...

Suma. Da poesia, em especial de sua visão do século 20 pra cá. Extraordinário.

Dalva M. Ferreira disse...

Uia! Eu não o conhecia...