17.2.08

Aldous Huxley: sobre o Fr. 168b, de Safo

Nem mesmo o melhor dos chineses poderia ter dito mais em compasso tão estreito. A noite, o desejo, a angústia de esperar e, com ela, a dor mais persistente, mais profunda, mais desesperançosamente incurável de saber que toda luz há que se pôr, que a vida e o amor declinam, declinam inexoravelmente rumo ao ocaso e à escuridão: todas essas coisas são implicadas – quão completamente! – nas linhas de Safo. As palavras continuam como que a ecoar e re-ecoar ao longo de corredores cada vez mais remotos da memória, com um som que jamais pode completamente morrer (tal é o estranho poder da voz do poeta) até a morte da própria memória.


De: HUXLEY, Aldous. Texts and pretexts: an anthology with commentaries. London: Flamingo, 1994.

6 comentários:

João Renato disse...

Olá, Antônio Cícero.
O comentário do Aldous Huxley é muito bonito. E é daqueles textos que acabam dizendo do intérprete tanto quanto do poema.
João Renato.

Arthur Nogueira disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Antonio Cicero disse...

Obrigado, Arthur. Um grande beijo para você também.

ACicero

léo disse...

A estrada deixa tudo para trás.

O que sentimos e pensamos,
nossas lembranças,
tudo vira pó.

Vivo meu dia

com a força da carne
e o fulgor da imaginação.

A estrada de quem ama,
longa, diferente,
particular e, para cada um,
repleta de curvas, pedras,
perfumes e paixões,

revela aquilo que devemos ver.



As dores ficam esquecidas.

As ofensas caem na lixeira.



Sobramos nós, apenas.

Sobreviventes.

V. disse...

Há também, no poema, a angústia de se saber só... e finita, como a noite.

Danclads disse...

A memória é, talvez, o último baluarte da história, atestando fatos e presenças. Com sua morte, tudo ingressa no esquecimento.

Belo texto de Huxley.