A uma ausência
Sinto-me sem sentir todo abrasado
No rigoroso fogo que me alenta;
O mal, que me consome, me sustenta;
O bem que me entretém me dá cuidado.
Ando sem me mover, falo calado,
O que mais perto vejo, se me ausenta,
E o que estou sem ver, mais me atormenta,
Alegro-me de ver-me atormentado.
Choro no mesmo ponto em que me rio,
No mor risco me anima á confiança,
Do que menos se espera estou mais certo;
Mas se de confiado desconfio,
É porque entre os receios da mudança
Ando perdido em mim como em deserto.
BACELAR, António Barbosa. "A uma ausência". In: SYLVA, Mathias Pereyra (org.). A Fénis renascida ou obras poéticas dos melhores engenhos portugueses. Ericeira: Officina de António Pedroszo Galrão, 1728.
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