Hoje: gaiola sem paisagem
Nada quis ser, senão menino. Por dentro e por fora, menino.
Por isso, venho de minha vida adulta como quem esfregasse na pureza e na graça o pano sujo dos atos nem sequer vazios, apenas mesquinhos e com frutos sem rumo.
Como se escovar os dentes fosse montar num cavalo e levá-lo a beber água ao riacho! Como se importasse à causa humana ler os jornais do dia!
Era melhor, talvez, ficar olhando, completo, perfeito, os calangos a tomar sol no muro, sem trair o silêncio, sentindo o dia, para conhecer o mundo, para saber que estou vivo.
Se não se têm esses olhos de infantil verdade, todas as cousas nos
enganam, tornam-se as palavras sem carne com que construímos a árida abstração que é o curral dos adultos.
Depois dos quinze anos, quase nada aprendemos: a dar laço em gravatas, por exemplo.
COSTA E SILVA, Alberto da. Poemas reunidos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012.
Um comentário:
Em 1994 fiz uma exposição de fotos na PUC-Rio cujo nome foi exatamente "Por dentro e por fora, menino".
Nome tomado emprestado, claro, a esse belo poema do Alberto.
A exposição consistia em fotos de crianças e trechos de poemas.
Procurei fugir dos poetas mais conhecidos, daí o Alberto, o Sérgio Campos, o Waldemar Lopes...
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