28.4.19

Antonio Cicero: "3h47"




3h47

Bem que Horacio dizia
preferir dormir bem
a escrever poesia.





CICERO, Antonio. "3h47". In:_____. Porventura. Rio de Janeiro: Record, 2012. 

26.4.19

Christovam de Chevalier: "Tua boca"




Tua boca

                  a Gustavo Carvalho Miranda

Uma flor carnívora é a tua boca.
Sinfonia de Mahler. Ópio fascinante.
Mais que afago, que ela seja a toca
refúgio e degredo deste poeta delirante.

Poeta que, febril, clama por teus lábios
numa prece silenciosa e eloqüente.
Invoco deuses, Bilac, anjos e sábios...
No céu da tua boca ouço estrelas cadentes.





CHEVALIER, Christovam de. "Tua boca". In:_____. No escuro da noite em claro. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2016.

24.4.19

Johann Wolfgang von Goethe: "Wandrers Nachtlied" / "Canção noturna do andarilho: trad. por Nelson Ascher




Canção noturna do andarilho

No alto das colinas
há paz;
não se ouve, ali nas
frondes, mais
que um sopro manso.
Nem há no bosque um trino. Aguarda:
tampouco tarda
o teu descanso.






Wandrers Nachtlied

Über allen Gipfeln
Ist Ruh,
In allen Wipfeln
Spürest Du
Kaum einen Hauch;
Die Vögelein schweigen im Walde.
Warte nur, balde
Ruhest du auch.







GOETHE, Johann Wolfgang von. "Wandrers Nachtlied" / "Canção noturna do andarilho". In: ASCHER, Nelson (tradução e organização). Poesia alheia. Rio de Janeiro: Imago, 1998.

22.4.19

Luiz Otávio Oliani: "Receituário"




Receituário

não manche o poema
com palavras vazias
velhas metáforas
adjetivos em vão

não faça versos
sobre o passado-clichê

não sufoque
o eu lírico
dê-lhe sobrevida
para respirar

deixe o lirismo
bater à porta:
permita que entre




OLIANI, Luiz Otávio. "Receituário". In:_____. Palimpsestos, outras vozes e águas. Guaratinguetá: Penaluz, 2018.

20.4.19

Heinrich Heine: "Es kommt der Tod" / "Chegou a morte": trad, por André Vallias



Chegou a morte

Chegou a morte – agora vou
Dizer o que o orgulho não
Me permitiu: meu coração
Tão só por ti pulsou, pulsou.

Já estou fechado no ataúde,
Descem-me à cova. A calmaria
Me abraça enfim, mas tu, Maria,
Por mim irás, muito amiúde,

Chorar, e pra quê, afinal?
Consola-te, este é o destino
Humano: o que há de bom e fino
E grande sempre acaba mal.




Es kommt der Tod

Es kommt der Tod -- jetzt will ich sagen,
Was zu verschweigen ewiglich
Mein Stolz gebot: für dich, für dich,
Es hat mein Herz für dich geschlagen!

Der Sarg ist fertig, sie versenken
Mich in die Gruft. Da hab ich Ruh.
Doch du, doch du, Maria, du
Wirst weinen oft und mein gedenken.

Du ringst sogar die schönen Hände --
O tröste dich -- Das ist das Loos,
Das Menschenloos: -- was gut und groß
Und schön, das nimmt ein schlechtes Ende.






HEINE, Heinrich. "Es kommt der Tod" / "Chegou a morte". In:_____. Heine, heim? Poeta dos contrários. Org. e trad. por André Vallias. São Paulo: Perspectiva: Goethe Institut, 2011.

18.4.19

Claudia Roquette-Pinto: "Fait-accompli"




Fait-accompli

antes que houvesse ou vice-
versa, os céus de nice
antes que florença me invadisse
a bici-
cleta abrisse o zíper
da tardinha (venice beach) an-
tes que a mão cúmplice no rinque
em viena descobrisse
a nova língua, perna-a-perna
antes vence, antes
cacos de matisse al
guém ergueu um verso liso sem
indício de andaime — e nem
por isso tinha pisado um hall de hotel





ROQUETTE-PINTO, Claudia. "Fait-accompli". In:_____. Saxífraga. Rio de Janeiro: Salamandra, 1993.

16.4.19

Mauro Santa Cecília: "Hades"




Hades

28 dias de uma
Vida desfeita
Certeza insólita
Somos todos água
Para os chineses
ancestrais
O intestino representa
a alma disse o doutor
Fiquei doente da alma
Minha alma ficou
doente de mim
Dos meus medos
Do meu rancor
Da minha mágoa.
Ainda bem que
me resta o amor
vestido de ilusão
E o esquecimento
de todas as regras.





SANTA CECÍLIA, Mauro. "Hades". In:_____. Decolagem. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2019.

14.4.19

Mauro Santa Cecília lança o livro de poemas "Decolagem"


Imperdível! O poeta, letrista e compositor Mauro Santa Cecília lança seu novo livro de poemas -- Decolagem -- no Rio de Janeiro, pela editora 7 Letras, na Galeria Vitrine de Ipanema, na Av. Visconde de Pirajá, 580! O prefácio do livro é do poeta Adriano Nunes.




13.4.19

Antonio Cicero: "Prólogo"





Prólogo

Por onde começar? Pelo começo
absoluto, pelo rio Oceano,
já que ele é, segundo o poeta cego
em cujo canto a terra e o céu escampo
e o que é e será e não é mais
e longe e perto se abrem para mim,
pai das coisas divinas e mortais,
seu líquido princípio, fluxo e fim:
pois ele corre em torno deste mundo
e de todas as coisas que emergiram
das águas em que, após breves percursos,
mergulharão de novo um belo dia;
e flui nos próprios núcleos e nos lados
ocultos dessas coisas, nos quais faz
redemunhos por cujos centros cavos
tudo o que existe escoa sem cessar
de volta àquelas águas de onde surge:
não me refiro à água elementar
que delas mana e nelas se confunde
com os elementos terra, fogo e ar
mas a águas que nunca são as mesmas:
outras e outras, sem identidade
além do fluxo, nelas só lampeja
a própria mutação, sem mais mutante:
um nada de onde tudo vem a ser,
escuridão de onde provém a luz,
tal Oceano é a mudança pura.
Mas eis que a poesia nos conduz,
feito um repuxo e a seu bel-prazer,
de volta do princípio às criaturas.






CICERO, Antonio. "Prólogo". In:_____. A cidade e os livros. Rio de Janeiro: Record, 2002.

10.4.19

Frank Sinatra e Liza Minelli cantam "New York, New York"


Maravilhoso encontro de Frank Sinatra e Liza Minelli:



9.4.19

Nelson Ascher: "Elegiazinha"




Elegiazinha

[i. m. nikita (gata da Inês)]


Gatos não morrem de verdade:
eles apenas se reintegram
no ronronar da eternidade.

Gatos jamais morrem de fato:
suas almas saem de fininho
atrás de alguma alma de rato.

Gatos não morrem: sua fictícia
morte não passa de uma forma
mais refinada de preguiça.

Gatos não morrem: rumo a um nível
mais alto é que eles, galho a galho,
sobem numa árvore invisível.

Gatos não morrem: mais preciso
- se somem - é dizer que foram
rasgar sofás no paraíso

e dormirão lá, depois do ônus
de sete bem vividas vidas,
seus sete merecidos sonos.





ASCHER, Nelson. "Elegiazinha". In:_____. Parte alguma. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

6.4.19

Mauro Santa Cecília lança o livro de poemas "Decolagem"


ATENÇÃO: DEVIDO ÀS CHUVAS TORRENCIAIS, O LANÇAMENTO DO LIVRO DE MAURO SANTA CECÍLIA FOI ADIADO PARA AS 18H DA TERÇA-FEIRA DA PRÓXIMA SEMANA, DIA 16 DE ABRIL!


Imperdível! O poeta, letrista e compositor Mauro Santa Cecília lança seu novo livro de poemas -- Decolagem -- no Rio de Janeiro, pela editora 7 Letras, na Galeria Vitrine de Ipanema, na Av. Visconde de Pirajá, 580! O prefácio do livro é do poeta Adriano Nunes.




5.4.19

Michel Deguy: "Bord" / "Borda": trad. por Paula Glenadel e Marcos Siscar




Borda

Por que está de volta esta fórmula amada
“Às bordas do mundo ainda uma vez”
O que é esta borda, a “borda”, o ser-à-borda
A bordadura em Baudelaire e
O terraço dos príncipes de Rimbaud
Com vista para o mundo e o todo como
Tendo passado por aqui quem repassará por lá





Bord

Pourquoi revient cette formule aimée
“Au bord du mode encore une fois”
Qu’est ce bord, qu’est-ce “bord”, être-au-bord
La bordure chez Baudelaire et
La terrasse des princes de Rimbaud
Avec vue sur le monde et le tout comme
Ayant passé par ici qui repassera par là





DEGUY, Michel. "Bord" / "Borda". In:_____. A rosa das línguas. Trad. por Paula Glenadel e Marcos Siscar. São Paulo: Cosac & Naify; Rio de Janeiro: 7 Letras, 2004.

2.4.19

Antonio Cicero: "Valeu"




Valeu

Vida, valeu.
Não te repetirei jamais.






CICERO, Antonio. "Valeu". In:_____. Porventura. Rio de Janeiro: Record, 2012.