No corrente mês, tive a honra de escrever o editorial da Revista UBC, que é a revista publicada pela União Brasileira de Compositores, da qual me orgulho de ser membro há muitos anos e um dos diretores, há um ano e alguns meses. Eis o texto que produzi:
Mesmo após a concessão do Prêmio
Nobel de Literatura a Bob Dylan, ainda há quem considere que as letras de
música são algo relativamente vulgar e inferior à poesia.
Um argumento frequentemente
empregado para tentar provar essa tese é que, às vezes, uma letra emociona
quando cantada e, quando lida no papel, sem acompanhamento musical, torna-se
insípida. É verdade, mas vejamos por que razão isso se dá. Ao contrário de um
poema – que tem seu fim em si próprio – uma letra de canção não tem, enquanto
tal, seu fim em si própria, mas na obra de arte, isto é, na canção, de que faz
parte. Por isso, para que julguemos boa uma letra de canção, é necessário e
suficiente que ela contribua para que a obra lítero-musical de que faz parte
seja boa. E, embora seja verdade que uma canção não seja um poema, há canções
que são obras de arte tão boas quanto bons poemas. Pense-se, entre inúmeras
outras, em “Construção”, de Chico Buarque, em “Terra”, de Caetano Veloso, em
“Cais”, de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos ou em “Blowin’ in the Wind”, de
Bob Dylan.
De todo modo, há muitas letras de
canções que, quando lidas, revelam-se também como grandes poemas. É o caso, na
verdade, das quatro letras de canções que acabamos de citar. Ademais, não nos
esqueçamos de que os poemas líricos da Grécia antiga, por exemplo, eram letras
de canções. Perderam-se as músicas que os acompanhavam, de modo que não os
conhecemos senão na forma escrita. Ora, muitos deles são contados entre os
maiores poemas que se conhecem.
Vê-se assim como são inteiramente
ridículos os preconceitos que pretendem desvalorizar as letras de música.
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