14.4.10

José Arthur Giannotti: "Os novos bolchevistas"




O seguinte -- importante -- artigo de José Arthur Giannotti foi publicado no caderno "Mais!", da Folha de São Paulo, no domingo, 11 de abril:


Os novos bolchevistas


Para os mais jovens, vale lembrar que os bolchevistas -palavra que vem do russo significando maioria- representavam a facção majoritária que, no congresso do Partido Comunista de 1903, seguiu Lênin, contra os menchevistas, os minoritários, sociais-democratas mais moderados do que o grande líder revolucionário.

Mas interessa, neste momento, lembrar que o bolchevismo representou uma forma de prática política em que o militante adere ao partido de corpo e alma, como se aderisse a uma igreja, a uma instituição prenhe de verdade. Os velhos comunistas pediam a autorização do partido para se casarem.

E, durante os processos de Moscou, quando Stálin liquidou seus adversários, estes terminaram confessando crimes que não tinham cometido, pois pensavam o partido como a morada da verdade.

Se o comunismo desapareceu do horizonte político de hoje, se a democracia se impôs, vamos dizer assim, como valor universal, não é por isso que essa adesão emocional, e às vezes mística, a uma organização política tenha se extinguido.

É muito comum em pequenos partidos de esquerda (ou de direita), assim como em certas correntes da esquerda infiltradas nos grandes partidos. A maior surpresa, todavia, é constatar que medra no pensamento de muitos intelectuais.

Compreende-se que um militante endosse uma decisão partidária, mesmo contra sua vontade. Participou das discussões internas do partido e, tendo perdido a disputa, só lhe cabe acatar a decisão da maioria. Há um compromisso com a instituição em que milita. Se ela viola seus princípios, resta-lhe apenas retirar-se.

Nas situações-limite, porém, essa regra se torna relativa. Ao intelectual, em particular, orgânico ou não, cabe estar sempre atento às questões de princípio. Se um partido nega um de seus esteios fundadores, não precisa abandoná-lo, desde que faça ouvir bem alto sua voz discordante.

Não há como transigir quando se trata de uma questão que diz respeito ao funcionamento da própria democracia, do direito de as minorias se manifestarem e lutarem por seus ideais.

Sabemos que não é o que está acontecendo em Cuba, na China e em outros lugares. Minha geração foi tomada de entusiasmo pela Revolução Cubana. Era um raio de sol na América Latina, quando predominavam as contrarrevoluções autoritárias. Entendemos a necessidade de Fidel se aproximar da União Soviética, diante da pressão americana, principalmente depois do embargo decretado.

Aceitamos, embora com relutância, o "paredón", o fuzilamento dos inimigos do regime. Há momentos em que a violência política se torna inevitável. Mas aos poucos fomos percebendo que a Revolução Cubana estava se degenerando.


Caricatura

Jean-Paul Sartre [1905-80] foi o primeiro intelectual conhecido a romper com Fidel. Depois se avolumaram as evidências de que o regime se tornava cada vez mais autoritário, reprimindo sem piedade qualquer manifestação oposicionista. Hoje a República cubana é uma caricatura do socialismo.

E o embargo americano que impede Cuba de se desenvolver? E as conquistas sociais, principalmente no campo da saúde, da educação e do esporte, que colocaram Cuba na modernidade?

Tudo isso continua sendo muito pertinente, mas não retira dos cubanos o direito de divergirem das políticas oficiais. Mais ainda, não abole a distinção entre o preso político, aquele que sofre punição por sua militância política, e o preso comum, que simplesmente transgride em prol de si mesmo ou de sua gangue.

As manifestações contra o regime cubano crescem dia a dia. Tudo indica que a repressão aumentará. Não podemos aceitar que os manifestantes sejam tratados como presos comuns. Mas, como sempre, o governo Lula dá uma no prego e outra na ferradura.

Desta vez, porém, a pancada na ferradura foi muito maior, porque ferrou qualquer adversário, negando seu estatuto de político, mesmo quando faz greve de fome para ser reconhecido como tal. Cabe então a nós, intelectuais brasileiros, denunciar essa violência, defender o direito e o espaço das oposições.

No entanto, muitos de nós simplesmente estão se furtando a tomar firme posição contra esse escândalo. Estão casados com os grupos de esquerda em que militam e comprometidos com a política do atual governo, mesmo quando ela nega princípios gerais que comandam os ideais democráticos.


Até o Cebrap

O maior argumento é que agora qualquer manifestação teria efeitos eleitorais. Mas o silêncio não tem o mesmo efeito? Interessante é que até mesmo o Cebrap, uma instituição que, durante a ditadura, não deixou de denunciar as violações dos direitos democráticos, hoje simplesmente está calado.

E, naqueles tempos, o efeito não era eleitoral, mas a porrada dos gendarmes do governo. Cabe refletir sobre o que está atualmente acontecendo no Brasil. Em particular a vida pública está perdendo qualquer dimensão normativa. Vale o pragmatismo mais estreito.

Importa ganhar as eleições, fazer um governo popular, não perturbar a onda de felicidade que nos cobre mansamente. Ainda que sejam adiadas decisões importantes que não caiam no gosto do público, que as próximas gerações paguem o preço de nossas conveniências.

Resulta daí que cada vez mais tendemos a nos tornar uma sociedade média, média, micha.



JOSÉ ARTHUR GIANNOTTI é professor emérito da USP e pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. Escreve na seção "Autores", do Mais! .

28 comentários:

Zatonio Lahud disse...

Sem comentários! O homem disse tudo.

Anônimo disse...

Grande crónica!

Abraço,
F.

Nobile José disse...

nessa o lula errou feio.
se teve a ousadia de dizer, em solo judeu, da importância da criação de um estado pelestino, porque não enquadrou raul castro em sua visita recente a cuba?
contraditório...

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,

Que texto brilhante! Valeu!


Aproveito ...Sei que não devia aqui, mas peço sua permissão: um poema novo que fiz para você!

"Pela fresta da fechadura" - Para Antonio Cicero.


Deus existe e nos mata
De medo.
Eu sou livre e mais nada
Desejo.

Na praia,
Outros deuses estão
Na graça
Dos olhos e das mãos,

Vendendo qualquer tara...
Eu vejo-os!
Afrodites, Apolos...
Na areia, Eros, Iaras...

Tudo se faz num dia
Sem pressa.
Que onda doida agora essa?
Seria

Tolice crer na vida
Além
Dessa nossa, meu bem.
Duvida

De quê? Deus há e não há
Como ir
Em frente... Tomo um rumo,
Sozinho, diferente.

O mundo
É tudo
Que não penso... Mas amo-o
Assim:

Sentindo-o no poema,
Cercando-o no poema,
Vivendo-o
Sem fim.


Grande abraço,
Adriano Nunes.

WILSON LUQUES COSTA disse...

DNA

No Brasil temos:muitos pensadores políticos, mas poucos políticos pensadores.

Anônimo disse...

É curioso como o artigo do Gianotti opõe comunismo e democracia. A rigor, teria que opor comunismo ao capitalismo e democracia à ditadura. Mas, as "confusões" não param por aí. O governo de Cuba nunca foi bolchevista, ao contrário, aliou-se ao Stalinismo, uma espécie de degeneração das idéias dos bolchevistas.
Penso que é necessário criticar a burocracia dirigente de Cuba, porém, é preciso tomar cuidado para, ao fazê-lo, não cairmos num desvio reacionário.

Antonio Cicero disse...

Maria Rodrigues,

Os equívocos são seus. Chega a ser cômico você achar que logo o Giannotti não conheça uma distinção que se encontra em qualquer cartilha primária de marxismo-leninismo.

Em lugar nenhum ele diz que o comunismo é o oposto da democracia. Ele está chamando atenção para o fato de que hoje, enquanto hoje já praticamente não se fala de comunismo, a democracia passou a ser uma exigência de praticamente todos.

E a democracia que todos exigem – agora sou eu que o digo – não é a democracia plebiscitária, mas a democracia LIBERAL (atenção: “liberal” não quer dizer “neoliberal”), isto é, a democracia que garanta o império da lei e os direitos humanos.

Voltando ao Giannotti: ele não diz que o governo de Cuba é bolchevista. O que diz é que “o bolchevismo representou uma forma de prática política em que o militante adere ao partido de corpo e alma, como se aderisse a uma igreja, a uma instituição prenhe de verdade”. E diz que esse tipo de adesão bolchevista – NEORELIGIOSA – a determinadas organizações políticas continua a existir. E que continua a existir não só em Cuba, mas aqui mesmo, no Brasil. E que o pior é que ela ainda “medra no pensamento de muitos intelectuais”, que, por isso, estão se furtando a tomar firme posição contra o escândalo do “desrespeito ao funcionamento da democracia, do direito de as minorias se manifestarem e lutarem por seus ideais” que se dá em Cuba.

E por que se furtam a tomar posição? Porque, como ele diz, a eles “Importa ganhar as eleições, fazer um governo popular, não perturbar a onda de felicidade que nos cobre mansamente”. E, com isso, tendemos a nos tornar uma sociedade média e micha.

Lamentavelmente, é isso mesmo. E não é nenhum pedantismo de pacotilha que vai mudar esse fato.

wilson luques costa disse...

Prezado Antonio Cicero,
Eu concordo com o cerne de seu argumento, todavia vemos em esferas menores a adesão a um corpus político, poético, científico, etc -- e o escopo é a manutenção de um certo poder, que não difere muito do que ocorre em Estados mais bem constituídos. Por isso que devemos dar o exemplo, porque, do contrário, a crítica pode tornar-se inócua.
grato

Anônimo disse...

"Logo o Gianotti"?
Porque não o Gianotti, se até Nitzche, Marx, etc, cometeram equívocos?
O que quer dizer isto no artigo:
"Se o comunismo desapareceu do horizonte político de hoje, se a democracia se impôs, vamos dizer assim, como valor universal..."; afinal, opõe ou não a existência do comunismo a existência da democracia?
Lamentavelmente, é isso mesmo.
- O que fazer?
De fato, Gianotti tem total razão quando assinala o alinhamento das "cabeças pensantes" com um projeto de governo que se institui pela via eleitoral.
Bem como, ao enfatizar que "isto tende a nos tornar uma sociedade média e micha".
Aliás, acho que já nos transformamos em tal sociedade "média e micha".

Anônimo disse...

ufa!!! até que enfim alguma voz a respeito disso.chego a ficar assustado com tamanho silêncio diante desses fatos.o silêncio chega a quebrar o ar.é sufocante . parabéns ao Gianotti pelo texto e thanks ao A. Cicero pelo post. abraço. Vinicius.

João Renato disse...

Caro Cícero,
O artigo do Giannotti é muito bom e oportuno, e basicamente eu concordo com ele: acho que a sociedade brasileira, as ONG's, as entidades civis e todos devem denunciar os absurdos desnecessários que ocorrem em Cuba.
É claro que preso político não é a mesma coisa que preso comum, e até o Lula sabe disso. Mas acho que na política - e sobretudo no jogo da política mundial - os interesses dos países acabam se sobrepondo à questão fundamental da democracia.
Assim, grandes aliados dos EUA, sobretudo no mundo árabe, não são países democráticos, e lá, tanto a situação de uma eventual oposição quanto das mulheres ou das minorias é pior do que em Cuba, e o governo norte-americano não levanta bandeiras contra isso, ou, quando o faz, são protestos protocolares.
Por que ? Porque Estados escolhem se martelam o prego ou a ferradura.
Estados agem de forma amoral, vendo apenas o que entendem ser o seu interesse.
Em nome disso, Hitler e Stalin fizeram um pacto para dividir a Polônia; Israel manteve relações diplomáticas com a África do Sul do apartheid quando todos rompiam; a China apoiou o governo Pinochet; Getulio jogou com Hitler e Roosevelt, e a Argentina negociou com a Alemanha nazista enquanto pode. E os EUA ? Esse, então, nem precisa falar do que já fez e faz em nome dos seus interesses.
Lula está conduzindo a política externa do Brasil com o mesmo estilo da sua caminhada ao poder: dizendo NÃO. No caso, isso significa se opor sempre ao pensamento dominante das potências mundiais, independente do que for. “Se hay hegemonía, yo soy contra” (e poucos estão notando).
Isto é um jogo. Ele é contra a extradição do Battisti, mantém boas relações com Cuba, convida o presidente do Irã a vir ao Brasil, está sempre com o Chaves, visita a Líbia, não vai ao túmulo do Theodor Herzl em Israel, e qualquer pária da política mundial logo é adotado como amigo.
Mas tudo isso é apenas uma grande escada para o que, na sua opinião, é o melhor para o país (ou para ele, né ?) se tornar importante. Sua lógica não é moral; é pragmática.
Vai dar certo ? Na minha opinião, ninguém sabe. Tudo é palpite, futurologia furada ou certezas politicamente pré-estabelecidas.
Abraço,
JR.

Flavio Barbeitas disse...

Cícero,

discordo ligeiramente de você quando diz que Giannotti não opôs comunismo e democracia. Na minha opinião, embora ele não o tenha dito com todas as letras, essa leitura é bastante condizente com o sentido geral do texto. Mas o mais importante é justamente que essa oposição é absolutamente verdadeira se estivermos com os olhos na história. Onde, afinal, houve coexistência de comunismo (ou socialismo de orientação marxista-leninista) e democracia? Em lugar nenhum, em tempo algum. Comunismo se opõe tanto ao capitalismo quanto à democracia, sim. Se não estou enganado, há um texto seu - que julguei brilhante - justamente sobre a incompatibilidade entre democracia e ideologia comunista. Não quero ser ligeiro, vou verificar, mas tenho uma forte lembrança disso.
Um abraço e obrigado pelo post.
Flavio.

Antonio Cicero disse...

Maria Rodrigues,

O problema não é cometer ou não cometer equívocos. O que é bobagem é pensar que quem escreveu “Origens da dialética do trabalho”, ainda em 1966, faça, como você pensa, uma confusão elementar entre um modo de produção e uma forma de organização política do Estado.

O que ocorre é que o próprio conceito de modo de produção entrou em crise. Não se sabe mais sequer o que é o socialismo, quanto mais o comunismo.
Por outro lado, independentemente disso, a democracia formal se tornou uma exigência absoluta, exatamente porque sabemos que ninguém mais pode supor-se dono da verdade.

Ou seja, Giannotti não pensa que o comunismo seja uma organização política do Estado, nem que a democracia seja um modo de produção. Quando diz que o comunismo desapareceu e a democracia se impôs, está descrevendo a situação real. Não tem mais sentido lutar pelo comunismo. Tem todo sentido lutar pela democracia. É o que ocorre hoje.

Antonio Cicero disse...

FTB,

É claro que o comunismo se tem mostrado incompatível com a democracia. O que estou dizendo é que ao contrário do que a Maria Rodrigues pensa, Giannotti não supõe que comunismo e democracia sejam diferentes espécies do mesmo gênero. Comunismo, sendo um modo de produção, se opõe a capitalismo, feudalismo, escravismo etc.; democracia não é um modo de produção, mas uma forma de organização política do Estado, de modo que se opõe a ditadura, anarquia, monarquia etc.

Abraço

Anônimo disse...

Cícero,


Um artigo límpido e sincero. Lembrou-me os dizeres de Caetano sobre o Lula. Falar a verdade por que sempre incomoda? Ou por que tentam distorcê-la? Parabéns ao autor e ao dono do blog. Gostei muito! Abriu-me novos horizontes!


Um poema que estava guardado, mas que precisei postá-lo:

"Bruma"

Uma a uma
Bruma bruma
Suma suma

Do poema,

Deixe o verso
Vir à tona,
Virar tinta,

Feixe, sangue.


Abraço,
Mateus.

Adenildo Lima disse...

Olá, poeta, tive conhecimento de sua pessoa, através do documentário "Palavra encantada". Vou ler com mais atenção e, em breve, compro um livro seu.

abs,

WILSON LUQUES COSTA disse...

PREZADO ANTONIO CICERO,
PERMITA-ME:



Da natureza é: a preguiça na rua o minguar da lua a beleza tua
Dos homens
é de sua natureza:
essas exegeses
metafísicas essas vontades de posteridade de eternizarem-se de dizerem não ao volátil
ao que se esvai...
É de sua natureza...

Anônimo disse...

Antonio Cícero,

Parabéns por ser um liberal coerente no sentido filosófico do termo. Algo bem raro nos dias em que vivemos.
Não sou um polemista, mas penso que, se os regimes ditos "socialistas" resultaram em ditaduras sanguinárias; os capitalistas também nada devem neste quesito.
Ditaduras as temos de direita, esquerda,etc.
Talvez a discussão não seja esta.
De qualquer maneira, obrigado pela honestidade ao conduzir as questões e, novamente parabéns, agora pelo poeta.

Climacus disse...

Estive com uma pessoa que tem um irmão num presídio de São Paulo, ela me explicou que o sistema continua controlado pelo PCC. Quem vive ou morre, quem dorme ou não, quem tem defesa de um bom advogado ou não, etc., tudo é controlado por eles, dentro e fora dos presídios, talvez, esse tema também pudesse ser debatido no CEBRAP, se já não o é.

Abraço.

Alcione disse...

O mar

Não mover-se
Não temer
Ser
Não temer
Viver
Sem algum poder
Além do que eu possa
Entender
Sair, rir
(do vazio)
Amar, amar, amar
Para além do rio
Num rodopio
O mar.

João disse...

Está tudo tão confuso nessa discussão.
Primeiramente o conceito de modo de produção, meu caro Antônio, prende-se a uma forma histórica de propriedade privada e, sua particularidade distintiva são as relações sociais e o trabalho. Relações sociais e trabalho, enquanto venda da força de trabalho, não é este o mundo em que vivemos ainda? Esqueça o ultrapassado conceito, este sim, de classe operária encarniçada, mas veja se ainda o conhecimento não tem dono...
Quando você fala que o socialismo tornou-se um conceito confuso e a democracia se impôs, você nada mais diz noutras palavras, repare bem, que o que se impõem ainda é um dado modo de produção, ou seja, o capitalismo. Sua defesa da democracia é uma defesa do capitalismo que corresponde a uma defesa de um modo de produção, segundo a definição do conceito por Marx. Este último nunca contrapôs comunismo e capitalismo, o que dirá comunismo e democracia, dado que o conceito de democracia varia históricamente. É impossível a coexistência de capitalismo e comunismo no tempo e no espaço, e quanto a democracia, Marx entenderia, como eu posso entender, como os gregos a entendiam, de modo totalmente diferente que o conceito liberal...

Com toda honestidade, não quero aqui ensinar ninguém, nem reproduzir cartilhas, pois sou jovem e muito tenho a aprender, é que sou estudante e vi Marx o ano passado. Apenas tento expor a forma como entendo seu pensamento.

Muito obrigado.
João.

Antonio Cicero disse...

João,

Suponho que você queira dizer que o modo de produção capitalista está ligado à propriedade privada. Se for isso, nesse ponto você está certo.

Já sobre o conhecimento ter dono, não sei o que você quer dizer. Você é o dono do conhecimento que supõe ter sobre Marx? É isso?

Quanto ao conceito de socialismo: ultimamente ele se tornou ainda mais confuso do que já era, desde o início. Não se sabe o que seria o socialismo. Veja bem: nunca se soube exatamente. Para Marx, não havia “modo de produção socialista”. O socialismo era apenas uma etapa passageira, de transição, do capitalismo para o comunismo. E a noção de comunismo mesma sempre foi muito vaga.

As coisas pioraram com o “socialismo real”. É que os Partidos Comunistas dos países “socialistas” resolveram considerar o socialismo como um modo de produção autônomo: representado, é claro, por eles.

Mas não gosto de me repetir, de modo que lhe recomendo ler o que digo noutra postagem, em que também explico por que a democracia liberal é absolutamente fundamental. Leia, se quiser, aqui: http://antoniocicero.blogspot.com/2009/10/ressurreicao-do-apostolo-paulo.html.

Abraço

Aetano disse...

"Se o comunismo desapareceu do horizonte político de hoje, se a democracia se impôs, vamos dizer assim, como valor universal, não é por isso que essa adesão emocional, e às vezes mística, a uma organização política tenha se extinguido."


Cicero,

Excelente artigo! É preciso estar atento e denunciar os comportamentos - inclusive de (pretensos) intelectuais - que nada mais são que mera obediência cega a um PARTIDO ou a uma INSTITUIÇÃO. Como bem observa Giannotti, no trecho que transcrevi, o espírito bolchevista não está morto. E isso é assustador!

Grato,

Aetano

Marco Túlio disse...

Depois de libertados os presos políticos; depois de garantida a liberdade de expressão; depois de assegurado o direito de ir e vir pode até ser que alguém ainda se interessasse em continuar a discutir os rótulos.
Que Obama termine logo o embargo comercial para que se cumpra a profecia recente do Nelson Motta!

rmadbarbosa@hotmail.com disse...

também quero enfiar minha cunha:

à parte questões teóricas, como essa que envolve a distinção entre modo de produção e regime político, acredito que o socialismo real é uma experiência totalmente fracassada. em todo lugar onde se quis implantá-lo, acabou em tirania.
alguém já ouviu falar de um sul coreano que tenha arriscado sua vida para viver na Coréia do Norte, de um alemão ocidental fuzilado ao tentar pular o muro de Berlim ou de um cubano residente em Miami tentando vencer 150 km numa balsa improvisada para chegar ao paraíso cubano?

o "centralismo democrático" (de que os próprios comunistas dissidentes ou independentes são vítimas - vide a história que envolveu o carlos drummond quando ele era colaborador da "tribuna popular", nos anos 40)é uma baita falácia.

embora tenha tido lá sua importância na primeira metade do séc. XX, ao forçar o capitalismo industrial a "revolucionar-se por dentro", ampliando liberdades e direitos trabalhistas, o problema do socialismo está em sua medula. ele sempre acaba degenerando na liderança personalista de um "sociopata que ama a humanidade" e em uma nova clivagem de classes (agora, por força da repressão, sem luta): no topo, a burocracia estatal, uma espécie de nobreza ideológica; ao rés-do-chão ou embaixo da terra, o restante do povo, depauperado e oprimido.

não é possível planificar a economia (isto é, garrotear a livre iniciativa) sem cair na necessidade autoritária de administrar os pensamentos, as vontades, o espírito das pessoas.
onde quer que se tente reproduzir a experiência socialista, haverá a necessidade de se criar gulags, centros de reeducação sexual, social e ideológica (como aquele, da UMAP, onde o poeta cubano reinaldo arena foi preso e torturado), paredons e outras medidas arbitrárias contra os que cometem "crimes de consciência".

socialismo e democracia, a meu ver, são inconciliáveis.

o que vc acha, cicero?

abraço,
rodrigo madeira.

Antonio Cicero disse...

Rodrigo,

acho que de fato é assim o socialismo revolucionário, que confia numa ditadura de um partido(a "ditadura do proletariado") para rapidamente transformar a sociedade.

Mas não é assim a social-democracia, que às vezes também é chamada de "socialismo".

Abraço

rmadbarbosa@hotmail.com disse...

de fato, tem toda razão. há a social-democracia, filha histórica do marxismo, mas também da melhor tradição liberal: bacon, montesquieu e, por que não?, adam smith...

agora, creio que a social-democracia digna de nome, a única capaz de vencer o contrassenso semântico, é aquela que higienizou-se dos "marxismos" e migrou para uma visão de mundo no máximo keynesiana (keynes, afinal, julgava-se um liberal)...

o pt, por exemplo, com sua ala mais fanática - que, não fosse a malemolência macunaímica de lula, um "homem sem nenhum caráter" ideológico, teria instaurado a ruína econômica e a conflagração social no país -, o pt com sua desconfiança "atávica" diante da "democracia burguesa" e uma política externa mau caráter, cujo único norte parece realmente ser o antiamericanismo, é um caso de indeterminação ou esquizofrenia ideológica ainda a ser estudada.

talvez eu caia em simplismo, mas tendo a deduzir que o pt das relações internacionais é o pt que SONHA SER - "democraticamente" autoritário, socialmente planificador e estatista; e o pt das políticas internas, aquele que PODE SER (clientelismo e corrupção incluídos).
Dada a relativa maturidade de nossas instituições democráticas e a repulsa popular a qualquer autoritarismo de esquerda, o pt mais tradicional não pode senão admirar a distância "padrini" como chavez ou fidel...

abraço,
r.m.

Anônimo disse...

Caramba!, a política partidária vai invadir o seu blog? Não pode! Não vai faltar espaço na Internet para discussão política, esse espaço poético-filosófico bem podia passar ao largo da pororoca ideológico-messiânica. "Vote em quem promete menos, a decepção será menor".
Abraço,
Cláudio.
Ps: quando o voto vai deixar de ser obrigatório?