Minha Boêmia
(fantasia)
Lá ia eu, de mãos nos bolsos descosidos;
Meu paletó também tornava-se ideal;
Sob o céu, Musa! Eu fui teu súdito leal.
Puxa vida! A sonhar amores destemidos!
O meu único par de calças tinha furos.
– Pequeno Polegar do sonho ao meu redor
Rimas espalho. Albergo-me à Ursa Maior.
– Os meus astros no céu rangem frêmitos puros.
Sentado, eu os ouvia, à beira do caminho,
Nas noites de setembro, onde senti tal vinho
O orvalho a rorejar-me as fronte em comoção;
Onde, rimando em meio à imensidões fantásticas,
Eu tomava, qual lira, as botinas elásticas
E tangia um dos pés junto ao meu coração!
Ma Bohème
(fantaisie)
Je m’en allais, les poings dans mes poches crevées ;
Mon paletot aussi devenait idéal ;
J’allais sous le ciel, Muse! et j’étais ton féal ;
Oh! là! là! que d’amours splendides j’ai rêvées !
Mon unique culotte avait un large trou.
– Petit-Poucet rêveur, j’égrenais dans ma course
Des rimes. Mon auberge était à la Grande-Ourse.
– Mes étoiles au ciel avaient un doux frou-frou
Et je les écoutais, assis au bord des routes,
Ces bons soirs de septembre où je sentais des gouttes
De rosée à mon front, comme un vin de vigueur ;
Où, rimant au milieu des ombres fantastiques,
Comme des lyres, je tirais les élastiques
De mes souliers blessés, un pied près de mon coeur !
RIMBAUD, Arthur. "Ma Bohème" / "Minha Boêmia". In: BARROSO, Ivo (org. e trad.). Arthur Rimbaud. Poesia completa. Edição bilingue. Rio de Janeiro: Topbooks, 1995.