29.4.20

Link para o ensaio "A casa e o voo do pássaro", de Pedro Duarte




Gostei muito do ensaio “A casa e o voo do pássaro”, do Pedro Duarte, que se encontra no blog “Pensar o tempo”, da Editora Bazar do Tempo. É verdade que o ensaio termina com um trecho do meu poema “Guardar”, o que me deixou muito contente. Mas estejam certos de que não é por causa desse final que o recomendo aqui, mas porque se trata de um texto muito interessante e muito oportuno. Seu endereço, no blog da Bazar do Tempo é: https://bazardotempo.com.br/1562-2/.  Deem uma olhada!

Antonio Cicero


28.4.20

Murilo Mendes: "As ruínas de Selinunte"





As ruínas de Selinunte


Correspondendo a fragmentos de astros,
A corpos transviados de gigantes,
A formas elaboradas no futuro,
Severas tombando
Sobre o mar em linha azul, as ruínas
Severas tombando
Compõem, dóricas, o céu largo.
Severas se erguendo,
Procuram-se, organizam-se,
Em forma teatral suscitam o deus
Verticalmente, horizontalmente.

Nossa medida de humanos
– Medida desmesurada –
Em Selinunte se exprime:
Para a catástrofe, em busca
Da sobrevivência, nascemos.




MENDES, Murilo. "As ruínas de Selinunte". In:_____. "Siciliana". In:_____. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.

26.4.20

Giuseppe Ungaretti: "Rosso e azzurro" / "Vermelho e azul": trad. por Geraldo Holanda Cavalcanti




Vermelho e azul


Esperei que vos alçastes,
Cores do amor,
E eis que desvelais uma infância de céu.

Entrega a mais bela rosa sonhada.




Rosso e azzurro


Ho atteso che vi alzaste,
Colori dell’amore,
E ora svelate un’infanzia di cielo.

Porge la rosa più bella sognata.




UNGARETTI,  Giuseppe. "Rosso e azzurro" / "Vermelho e azul". In:_____. Poemas. Org. e trad. por Geraldo Holanda Cavalcanti. São Paulo: USP, 2017.

24.4.20

William Shakespeare: Sonnet 57 / Soneto 57: trad. de Adriano Nunes




Soneto 57


Servo de ti, farei o que senão
Zelar por se cumprir tua vontade?
Não tenho excelso tempo a ser em vão,
Nem ofício a fazer que não te agrade.
Sequer censuro a hora que é infinda
Ao cuidar,  meu senhor, do tempo teu,
Nem penso co' amargor a ausência advinda
Quando ao servo teu deste outro adeus.
Nem ouso sob ciúmes perguntar
Onde estarás ou quais os teus negócios,
E espero, triste servo, co' o pensar
Que feliz é quem frui contigo os ócios.
  Como tolo o amor é, que em teu querer,
  No que possas fazer, mal algum vê.




Sonnet 57


Being your slave what should I do but tend,
Upon the hours, and times of your desire?
I have no precious time at all to spend,
Nor services to do, till you require.
Nor dare I chide the world-without-end hour,
Whilst I, my sovereign, watch the clock for you,
Nor think the bitterness of absence sour
When you have bid your servant once adieu;
Nor dare I question with my jealous thought
Where you may be, or your affairs suppose,
But, like a sad slave, stay and think of nought
Save, where you are, how happy you make those.
  So true a fool is love, that in your will,
  Though you do anything, he thinks no ill.






SHAKESPEARE, William. Sonnet 57 / Soneto 57. In:_____. The Sonnets and a Lover's complaint. Org. por John Kerrigan. London: Penguin, 2009.

21.4.20

Manuel Bandeira: "Cantiga"




Cantiga


Nas ondas da praia
Nas ondas do mar
Quero ser feliz
Quero me afogar.

Nas ondas da praia
Quem vem me beijar?
Quero a estrela-d'alva
Rainha do mar.

Quero ser feliz
Na ondas do mar
Quero esquecer tudo
Quero descansar.





BANDEIRA, Manuel. "Cantiga". In:_____. "Estrela da manhã". In: Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1967.

17.4.20

Michelangelo Buonarroti: "Tu sa' ch'i' so, signor mie, che tu sai" / "Tu sabes que sei, senhor meu, que tu sabes"







 Tu sabes que sei, senhor meu, que tu sabes
que venho para fruir-te mais de perto
e sabes que sei que tu bem sabes quem sou:
por que tanto retardas nosso abraço?
 Se verdadeira é a esperança que me dás
se verdadeiro é o desejo que me entregas
que se rompa o muro entre nós levantado
pois dupla força tem o grito sufocado.
 Se amo mais em ti, senhor meu caro,
o que tudo mais amas, não te zangues
pois o espírito do outro se enamora.
 O que no teu belo rosto desejo e aprendo
mal foi entendido por outros homens
quem quiser saber convém antes morrer.



Tu sa' ch'i' so, signor mie, che tu sai


  Tu sa’ ch’i’ so, signor mie, che tu sai
ch’i vengo per goderti più da presso,
e sai ch’i’ so che tu sa’ ch’i’ son desso:
a che più indugio a salutarci omai?
  Se vera è la speranza che mi dai,
se vero è ’l gran desio che m’è concesso,
rompasi il mur fra l’uno e l’altra messo,
ché doppia forza hann’i celati guai.
  S’i’ amo sol di te, signor mie caro,
quel che di te più ami, non ti sdegni,
ché l’un dell’altro spirto s’innamora.
  Quel che nel tuo bel volto bramo e ’mparo,
e mal compres’ è dagli umani ingegni,
chi ’l vuol saper convien che prima mora.





BUONARROTI, Michelangelo. "Tu sa' ch'i' so, signor mie, che tu sai" / "Tu sabes que sei, senhor meu, que tu sabes". In:_____. Poemas. Org. por Andrea Lombardi; traduzido por Nilson Moulin. Rio de Janeiro: Imago, 1994.

15.4.20

Antonio Cicero: "Segundo a tradição"




Segundo a tradição


O grande bem não nos é nunca dado
e foste já furtado do segundo:
o resto é afogar-te com o amado
na líquida volúpia de um segundo.





CICERO, Antonio. "Segundo a tradição". In:_____. Guardar. Rio de Janeiro: Record, 1996.

10.4.20

Luís Miguel Nava: "Basalto"




Basalto


Agora que se o mar ainda
rebenta é por acção da memória, arrancam-me
basalto ao coração ondas fortíssimas.

Ainda o vejo às vezes por aí, olhamo-nos
então como se à boca
nos viesse o sabor do nosso próprio coração,
mas pouco há a dizer acerca disso.





NAVA,  Luís Miguel. "Basalto". In:_____. "Como alguém disse". In:_____. Poesia completa: 1979-1994. Lisboa: Dom Quixote, 2002.

7.4.20

6.4.20

Ferreira Gullar: "Barulho"




BARULHO



Todo poema é feito de ar
apenas:
a mão do poeta
não rasga a madeira
não fere
o metal
a pedra
não tinge de azul
os dedos
quando escreve manhã
ou brisa
ou blusa
de mulher.
O poema
é sem matéria palpável
tudo
o que há nele
é barulho
quando rumoreja
ao sopro da leitura.






GULLAR, Ferreira. "Barulho". In:_____. "Barulhos". In:_____. Toda poesia. Rio de Janeiro: José Olympio, 2015.

2.4.20

Antonio Cicero: "Muro"




Muro

E se um poema opaco feito muro
te fizer sonhar noites em claro?
E se justo o poema mais obscuro
te resplandecer mais que o mais claro?





CICERO, Antonio. "Muro". In:_____. Porventura. Rio de Janeiro: Record, 2012.