O cacto
Aquele cacto lembrava os gestos desesperados da estatuária:
Laocoonte constrangido pelas serpentes,
Ugolino e os filhos esfaimados.
Evocava também o seco nordeste, carnaubais, caatingas...
Era enorme, mesmo para esta terra de feracidades excepcionais.
Um dia um tufão furibundo abateu-o pela raiz.
O cacto tombou atravessado na rua,
Quebrou os beirais do casario fronteiro,
Impediu o trânsito de bonde, automóveis, carroças,
Arrebentou os cabos elétricos e durante vinte e quatro horas privou a
[cidade de iluminação e energia:
– Era belo, áspero, intratável.
BANDEIRA, Manuel. "O cacto". In:______. 50 poemas escolhidos pelo autor. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
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