2.11.14

Vinícius de Moraes: "O poeta Hart Crane suicida-se no mar"




O poeta Hart Crane suicida-se no mar

Quando mergulhaste na água
Não sentiste como é fria
Como é fria assim na noite
Como é fria, como é fria?
E ao teu medo que por certo
Te acordou da nostalgia
(Essa incrível nostalgia
Dos que vivem no deserto...)
Que te disse a Poesia?

Que te disse a Poesia
Quando Vênus que luzia
No céu tão perto (tão longe
Da tua melancolia...)
Brilhou na tua agonia
De moribundo desperto?

Que te disse a Poesia
Sobre o líquido deserto
Ante o mar boquiaberto
Incerto se te engolia
Ou ao navio a rumo certo
Que na noite se escondia?

Temeste a morte, poeta?
Temeste a escarpa sombria
Que sob a tua agonia
Descia sem rumo certo?
Como sentiste o deserto
O deserto absoluto
O oceano absoluto
Imenso, sozinho, aberto?

Que te falou o Universo
O infinito a descoberto?
Que te disse o amor incerto
Das ondas na ventania?
Que frouxos de zombaria
Não ouviste, ainda desperto
Às estrelas que por certo
Cochichavam luz macia?

Sentiste angústia, poeta
Ou um espasmo de alegria
Ao sentires que bulia
Um peixe nadando perto?
A tua carne não fremia
À ideia da dança inerte
Que teu corpo dançaria
No pélago submerso?

Dançaste muito, poeta
Entre os véus da água sombria
Coberto pela redoma
Da grande noite vazia?
Que coisas viste, poeta?

De que segredos soubeste
Suspenso na crista agreste
Do imenso abismo sem meta?
Dançaste muito, poeta?
Que te disse a Poesia?


MORAES, Vinícius. Nova antologia poética. Seleção e org. Antonio Cicero e Eucanaã Ferraz. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

2 comentários:

Anônimo disse...

Cicero

Sobre o poema do Vinicius, "ah Vinicius, se todos fossem iguais... que maravilha viver". Não me alongo mais, pois preciso evitar temporariamente a alegria de uma emoção. É triste isso. Mas vamos em frente.
Passei por uma cirurgia delicada, e me ausentei. Não pude assinar o manifesto em favor da união civil gay, em prol da normatização (urgente) dos crimes catalogados como homofobia, que precisam ser tipificados pelo Código Penal Brasileiro e simultaneamente, pelo Código de Processo Penal, com ajuste de procedimentos. Ou então que se crie uma legislação de repressão a tais crimes, como se deu com a Lei Especifica Maria da Penha, cuja finalidade todos conhecem. A homofobia, agora, é perpetrada em praça pública, com direito a audiência de milhões, em horário nobre; como se deu em um dos debates veiculados pela Rede Globo, com o o "candidato" Fidélis, cujos atos causam-me asco invencível.

Abraços do
Arsenio Meira Júnior

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,


belo poema! Grato por compartilhá-lo!


Abraço forte,
Adriano Nunes