28.12.13

T.S. Eliot: "Marina" : trad. de Ivan Junqueira





Marina

Quis hic locus, quae regio, quae mundi plaga?

Que mares que praias que rochas grises que ilhas
Que águas a lamber a proa
Que aroma de pinho e gorjeio de tordo na neblina
Que imagens retornam
Ó minha filha.

Aqueles que os dentes do cão afiam, significando
Morte
Aqueles que na glória do colibri cintilam, significando
Morte
Aqueles que na pocilga da satisfação se assentam, significando
Morte
Aqueles que do êxtase dos animais partilham, significando
Morte

Tornam-se incorpóreos, reduzidos a nada por um golpe de vento
Uma exalação de pinho, e a neblina da canção silvestre
Por esta graça no espaço se dissolve.

Que há neste rosto, menos claro e mais claro
O pulso no braço, menos forte e mais forte
— Dado ou emprestado? Mais distante que as estrelas e mais próximo que os olhos
Sussurros e risinhos entre folhas e pés precipites
Submersos no sono, onde todas as águas se entrelaçam.

O gurupés no gelo se espedaça, a pintura ao calor estala.
Eu o fiz, e esqueci
E recordo.
A cordoalha frouxa e o velame em farrapos
Entre certo junho e outro setembro.
E o fiz desconhecido, semiconsciente, ignoto, meu.
O verdugo da carcaça faz água, as fendas reclamam o calafate.
Esta forma, este rosto, esta vida
Vivendo por viver numa esfera de tempo que me excede. Que eu possa
Renunciar à minha vida por esta vida, à minha fala pelo inexpresso,
O desperto, lábios abertos, a esperança, os novos barcos.
Que mares que praias que graníticas ilhas contra minha quilha
E que tordo chama através da neblina
Minha filha.

 

Marina

Quis hic locus, quae regio, quae mundi plaga?

What seas what shores what grey rocks and what islands
What water lapping the bow
And scent of pine and the woodthrush singing through the fog
What images return
O my daughter.
   
  Those who sharpen the tooth of the dog, meaning
 Death
 Those who glitter with the glory of the hummingbird, meaning
 Death
 Those who sit in the stye of contentment, meaning
 Death
 Those who suffer the ecstasy of the animals, meaning
 Death
   
  Are become insubstantial, reduced by a wind,
 A breath of pine, and the woodsong fog
 By this grace dissolved in place
   
What is this face, less clear and clearer
 The pulse in the arm, less strong and stronger—
 Given or lent? more distant than stars and nearer than the eye
   
  Whispers and small laughter between leaves and hurrying feet
 Under sleep, where all the waters meet.
   
  Bowsprit cracked with ice and paint cracked with heat.
 I made this, I have forgotten
 And remember.
 The rigging weak and the canvas rotten
 Between one June and another September.
 Made this unknowing, half conscious, unknown, my own.
 The garboard strake leaks, the seams need caulking.
This form, this face, this life
Living to live in a world of time beyond me; let me
Resign my life for this life, my speech for that unspoken,
The awakened, lips parted, the hope, the new ships.
   
What seas what shores what granite islands towards my timbers
 And woodthrush calling through the fog
 My daughter.




ELIOT, T.S. The complete poems and plays. 1909-1950. New York: Harcourt, Brance & Wrold, Inc., 1952.


ELIOT, T.S. Poesia. Tradução, introdução e notas de Ivan Junqueira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.

2 comentários:

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,

que belo poema! Viva! Grato por compartilhá-lo!


Abraço forte,
Adriano Nunes

Lυcαร Gαв૨i૯ℓ disse...

A poesia mais bela que existe, grato por compartilhar..