24.10.07

Mark Twain: sobre a morte

Uma declaração de Mark Twain, citada por Dawkins na mesma página em que cita o pensamento de Russell que postei ontem:

Não temo a morte. Já fui morto por bilhões e bilhões de anos, antes de nascer, e isso não me causou o menor incômodo.

Citada por DAWKINS, R. The God delusion. Boston: Houghton Mifflin Company, 2006, p.354.

5 comentários:

Lucas Nicolato disse...

Caro Antônio,

Excelente essa frase, bem ao estilo espirituoso do Mark Twain. Mas discordo um pouco do argumento. A inquietação pelo provavel fim de alguma coisa não pode ser medida pela tranquilidade antes de seu início.
Por exemplo, antes do início de um relacionamento amoroso, dificilmente alguém lamentearia a falta de uma pessoa que nem conhece. Entretanto, tal fato não diminui o medo, uma vez iniciado o relacionamento, de que o mesmo chegue ao fim, nem a dor da perda. O medo da morte está na mesma ordem, e é, de fato, intensificada por não termos memórias pré-natais - não sabemos imaginar a realidade sem o sujeito.

uma abraço,
Lucas

Anônimo disse...

declaração impregnada de ironia, para alertar que a morte é algo que nos chega, a única coisa que nos vem de certo, inerente, tangente ao processo de vida, de mãos dadas com ela, inevitavelmente.

antes de tudo, o silêncio. para depois de tudo, o retorno ao mesmo silêncio.

a nossa existência é um hiato em meio à mudez do universo.

a morte faz parte do processo de existência, de sua mutação. deveria ser naturalizada, encarada de outra maneira. isso não significa dizer que a sua naturalização nos traria conforto na perda do que nos é querido. não; a sua naturalização nos traria mais tranquilidade para encarar o assunto, colocá-lo de frente, sem rodeios, sem tantos "dedos". há pessoas que nem tocam no tema, como se fosse uma desnatureza.

pra finalizar, ao meu ver, a maior sacada da declaração: por que a preocupação com o fim se, no fim, não mais serei, tudo que sou se aniquilará? minha consciência, desativada, como se nunca tivesse sido, como se há bilhões e bilhões de anos sem nunca ter estado: "e quando eu tiver saído/ para fora do teu círculo/ tempo tempo tempo tempo/
não serei nem terás sido/ tempo tempo tempo tempo".

temos, apenas, que nos preocupar com a vida; é ela que devemos temer quando, à mostra, os seus rostos atros, retratos da nossa sordidez e mesquinharia.

no mais, do tempo que nos constitui, tirar o sumo melhor, a procura pela satisfação do ser, por sua autonomia, pelo que fará valer a pena esta tão breve existência.

beijo, poeta porreta!
grande carinho!

Anônimo disse...

só para arrematar, lembrei-me, neste momento, de uns versos da canção "morre-se assim", parceria de nelson jacobina e jorge mautner, este último responsável pela maravilhosa letra, que clarificam as razões para que nos preocupemos mais com a vida do que com a morte. ei-los:

"No cemitério, para se viver, é preciso, primeiro, falecer.

Os vivos são governados pelos mortos...

Que nada! Os vivos são governados pelos mais vivos ainda!"

ser o lobo do lobo do homem. enquanto há tempo para.

é isso.
beijim!

Antonio Cicero disse...

Lucas,
acho que o medo de que o relacionamento chegue ao fim existe porque, como você diz, teme-se a vida com a dor da perda, teme-se a vida sem o relacionamento. Ora, depois da morte, como antes da vida, não há nenhum incômodo a temer, para quem tem a atitude de Mark Twain. Acho que a interpretação do Paulinho está certa: “Por que a preocupação com o fim se, no fim, não mais serei, tudo que sou se aniquilará? Vou postar um poema do meu “A cidade e os livros”, escrito na base de pensamentos epicúrios e estóicos, que fala mais ou menos isso.
Abraço,
Antonio Cicero

Anônimo disse...

Escrevi um comentário que deve ter-se perdido. Nele dizia que nem toda religião defende a tese da existência e da imortalidade de uma alma individual. Agora acrescento que nem todo religioso tem medo da morte. Ao contrário, alguns até a almejam mais do que qualquer outra coisa. Os hinduístas e budistas [os orientais, e não os ocidentais], p.ex., têm medo de nascer de novo...