11.10.12

Constantinos Caváfis: O espelho da entrada / trad. José Paulo Paes





O espelho da entrada


À entrada da mansão
havia um grande espelho muito antigo,
comprado pelo menos há mais de oitenta anos.

Um rapaz belíssimo, empregado de alfaiate
(e nos domingos atleta diletante)
estava ali com um pacote.

Deu-o a alguém da casa, que o levou para dentro
com o recibo. O empregado do alfaiate
ficou sozinho, à espera.

Acercou-se do espelho e mirou-se
para ajeitar a gravata. Após cinco minutos,
trouxeram-lhe o recibo e ele se foi.

Mas o antigo espelho, que vira e revira
nos seus longos anos de existência
coisas e rostos aos milhares;
mas o antigo espelho agora se alegrava
e exultava de haver mostrado sobre si
por um instante a beleza culminante.



CAVÁFIS, Constantinos. In: PAES, José Paulo (org. e trad.). Poesia moderna da Grécia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986

5 comentários:

Jefferson Bessa disse...

É uma beleza ler um poema como esse!
Kaváfis tem essa coisa de suavidade, simplicidade e grandiosidade. Valeu!

Deixo um poema que escrevi:

nos dias do cansaço em olhar
as ruas, os andares, os cabelos
os jornais, as fotos, os carros
depois de tanto olhar arrastado
para te ver deixo a escuridão
bem firme como uma presença

o que não se olha não nos leva
à terra alguma longe desta,
estamos juntos, bem próximos.
pouco se imagina e se pensa,
os olhos se cansaram por hoje
e na escuridão sentimos bem

ouvimos claro o que se tem,
pois aqui a noite não é ausência
de luz de não sabermos sentir.
de olhos cerrados a luz se abre
as mãos se abrem, iluminando
o ver dos dedos sobre teu corpo

Abraços.

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,


que belo poema! Grato por compartilhar!

Um poema que fiz para você:

"outro verso, certamente, outro verso" - Para Antonio Cicero

certamente, se eu pudesse fazer
outro verso, certamente, outro verso
diferente dos que faço, outro verso
menos íntimo, não meu, com prazer

eu faria. certamente, se ousasse
fazer um verso qualquer, diferente-
mente, como se fosse diferente
dos outros, todos os outros, num passe

de mágica, prontamente o faria.
mas não ouso, porque sei muito bem
que não sei fazê-lo, não sei não , nem

nunca saberei, mas essa alegria
de ver um verso surgir como vem,
gratuito, entre as mais, nada me daria.


Abraço forte,
Adriano Nunes

Antonio Cicero disse...

Bonito poema, Jefferson!

Abraço

Antonio Cicero disse...

Obrigado, Adrinao, pelo belo soneto.

Abraço

Talles Azigon disse...

Uau, meu Deus, sabe aquela sensação de querer deixar o corpo cair depois de ler um poema e ficar uns instantes com o gosto dele na boca da alma? foi isso que senti.