24.3.11

Luis de Góngora: Mientras por competir con tu cabello / Ora que a competir com teu cabelo: trad. de Péricles Eugênio da Silva Ramos




Ora que a competir com teu cabelo

Ora que a competir com teu cabelo
ouro brunhido ao sol reluz em vão,
e com desprezo, no relvoso chão,
vê tua branca fronte o lírio belo;

ora que ao lábio teu, para colhê-lo,
se olha mais do que ao cravo temporão,
e ora que triunfa com desdém loução
teu colo de cristal, que luz com zelo;

colo, cabelo, fronte, lábio ardente
goza, enquanto o que foi na hora dourada
ouro, lírio, cristal, cravo luzente

não só em prata ou víola cortada
se torna, mas tu e isso juntamente
em terra, em fumo, em pó, em sombra, em
&nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp nada.



Mientras por competir con tu cabello

Mientras por competir con tu cabello,
oro bruñido al sol relumbra en vano;
mientras con menosprecio en medio el llano
mira tu blanca frente el lilio bello;

mientras a cada labio, por cogello,
siguen más ojos que al clavel temprano;
y mientras triunfa con desdén lozano
del luciente cristal tu gentil cuello;

goza cuello, cabello, labio y frente,
antes que lo que fue en tu edad dorada
oro, lilio, clavel, cristal luciente,

no sólo en plata o viola troncada
se vuelva, mas tú y ello juntamente
en tierra, en humo, en polvo, en sombra, en
&nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp &nbsp nada.


GÓNGORA, Luis de Góngora. Fábula de Polifemo e Galatéia e outros poemas. RAMOS, Péricles Eugênio da Silva (organização e tradução). São Paulo: Hedra, 2008.

2 comentários:

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,

amo esse soneto! bravo!


um poema inédito:

"eu não sabia que era assim"




lanço-me ao espelho...
outro cara me encara
outro ser diz ser eu
gestos
gostos
gritos
gozos
frentre a frente as faces
se confundem,
espalham-se: ilhas
de sonhos frustrados,
repetidos lances
de dados,
capa e contracapa,
recheio, (âmago?)
casca... e quase mais
nada.

quantas efígies
existem
em mim que desconheço?
uma? a que convivo
sempre sem um apreço?
duas, tais cara e coroa?
ou Caeiro, Ricardo e Álvaro
vivos em
minha pessoa?
quantas máscaras

mesclam-se ao que sou?
as afeições fictícias
quem em mim as fixou?
dr. Lao e suas sete faces?
as sessões de psicanálise?
Iago, Otelo, Hamlet, Falstaff?
o medo inicial de ser médico?
o receio profético
de que a vida se completa
quando me vingo poeta?
ou as vagas lembranças
de quando eu era criança
e amava andar de bicicleta?
as quatro estações?
os amores que não tive
e tive em memória, ilusória
imagem - mágica vontade
de ser amado -
de mim para tudo que me sinto?

quantos espectros
ainda resistem recalcados
em minha alma?
quantos estão dispostos
a vir à tona?
quantos querem
surgir sem trauma?
quando terão coragem de
ser quem me penso agora?
quando virão sem medo
à mostra?

lanço-me ao verso...
desisto de ser qualquer
coisa que de mim espero.
tudo é breu.
tudo é o oposto do coração...
sou simplesmente eu.
ninguém me chamou pelo nome.
ninguém contou até trinta
para ver se eu me escondia.
ninguém me deu a chance
de rasgar de vez a fantasia.
ninguém ousaria... ninguém
a sangrar...
eu não sabia que era asssim!

Abração,
Adriano Nunes

Dalva M. Ferreira disse...

Falou!