27.3.10

Nelson Ascher: "Açoite"




Açoite


Tal qual, não apesar do açoite,
antes por causa da agonia,
o masoquista que riria
caso lhe perguntassem "dói-te?",

cada qual tenta, dia a dia,
sem que, por muito que se afoite,
possa, ante a boquiaberta noite,
colher minimamente o dia

(que, tudo indica, não é parque
temático, mas sim, malgrado
os lapsos lúdicos que abarque,

centro no qual processam dados
sem uso salvo o de informar que
todos os dias são contados).




ASCHER, Nelson. Parte alguma. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

8 comentários:

Saulo disse...

Que maravilha.

Unknown disse...

Ao ler "Açoite" e "Os dias não estão contados", julgo interessante fazer uma brevíssima comparação: por um lado, tanto para a poesia quanto para o amor, os dias não estão contados; por outro, diante do açoite, todos os dias são contados.

Coerente?

Beijo,
Ane

Devir disse...

O estranho entrou
fugindo de fora
a cidade deserta
canos silenciosos
à janela,

Adianta se arrogar
tal felicidade?

Aetano disse...

Evoé, Ascher!

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,


tão belo que o coração quase pára!
Salve Ascher!


Abração,
A. Nunes

José Manuel Teixeira da Silva disse...

Perdoe-se o oportunismo, a boleia que apanho deste interessantíssimo poema.
Gostava de dizer como, sempre que posso, faço um desvio para passar por estes ACONTECIMENTOS, e aproveitar para divulgar um meu lugar que se ocupa de poesia e outras matérias inflamáveis, para que possa ser visitado ou talvez, prudentemente, evitado. Fica aqui:

http://subito-jmts.blogspot.com/

Um abraço. José Manuel T.S.

Alcione disse...

Um rap

Tanta coisa deu errada
Mesmo assim tô na parada
Eu tou dizendo adeus
Eu tou pedindo a Deus
Minha voz não tá calada
Vejo a curva na estrada
Minhas mãos ensangëntadas
Estão atadas
Porque sou da classe média
Mesmo assim eu tou na merda
Pelo contrário, otário
Pagando tudo, e o valium
E os manos da favela
Tão assim com a cabidela
Não dá mais prá ter certeza
Quem ficou com a beleza
Esse é meu preconceito
A favor do que é direito
Eu tou vivendo a mil
Driblando o medo e o covil.

Anônimo disse...

Cícero,

Beleza ver esse poema aqui! Lindo e forte!

Um poema novo:

"Verso só"

Um momento!
Tudo espero...
Tudo quero

Até quando o
Verso some
Da cabeça,

Até quando o
Sonho morre
Sob os pés

Amputados
Das palavras.
Os poemas

Não são santos
Nem demônios.
Pleno bálsamo

Ou veneno?
Tudo o mais,
Tudo mesmo.


Abraço,
Mateus.