31.12.12

30.12.12

José Martí: "Si ves un monte de espumas" / "Se vês um monte de espumas": trad. Antonio Cicero








Si ves un monte de espumas,
Es mi verso lo que ves,
Mi verso es un monte, y es
Un abanico de plumas.

Mi verso es como un puñal
Que por el puño echa flor:
Mi verso es un surtidor
Que da un agua de coral.

Mi verso es de un verde claro
Y de un carmín encendido:
Mi verso es un ciervo herido
Que busca en el monte amparo.

Mi verso al valiente agrada:
Mi verso, breve y sincero,
Es del vigor del acero
Con que se funde la espada.




Se vês um monte de espumas,
É o meu verso que vês
Ele é um monte ou talvez
Um leque feito de plumas

Meu verso é como um punhal
Que pelo punho põe flor;
Meu verso é um provedor
De uma água de coral.

Meu verso é de um verde claro
E de um carmim acendido;
Meu verso é um cervo ferido
Que busca no monte amparo.

Meu verso ao valente agrada:
Meu verso, breve e sincero,
É do vigor do aço fero
Com que se funde a espada.



MARTÍ, José. "Si ves un monte de espumas". In: OCA, Francisco Montes de. Ocho siglos de poesía en lengua española. Mexico: Porroa, 1974.

27.12.12

Eugénio de Andrade: "Arte dos versos"






Arte dos versos

Toda a ciência está aqui,
na maneira como esta mulher
dos arredores de Cantão,
ou dos campos de Alpedrinha,
rega quatro ou cinco leiras
de couves: mão certeira
com a água,
intimidade com a terra,
empenho do coração.
Assim se faz o poema.




ANDRADE, Eugénio de. Rente ao dizer. Fundação Eugénio de Andrade, 1992.

25.12.12

Heirich Heine: "Ehmals glaubt ich, alle Küsse" / "Acreditava antigamente": trad. André Vallias






Acreditava antigamente
Que todo beijo que me tiram,
Ou que recebo de presente,
Fosse por obra do destino.

Deram-me beijos e beijei,
Antes com tanta seriedade,
Como se obedecesse às leis
Que regem a necessidade.

Agora sei como é supérfluo
E não me faço de rogado,
Vou dando beijos em excesso,
Incrédulo e despreocupado.





Ehmals glaubt ich, alle Küsse,
Die ein Weib uns gibt und nimmt,
Seien uns, durch Schicksalsschlüsse,
Schon urzeitlich vorbestimmt.

Küsse nahm ich, und ich küßte
So mit Ernst in jener Zeit,
Als ob ich erfüllen müßte
Thaten der Notwendigkeit.

Jetzo weiß ich, überflüssig,
Wie so manches, ist der Kuß,
Und mit leichtern Sinnen küß ich,
Glaubenlos im Überfluß.



HEINE, Heinrich: "Uma gaivota. Poemas, 1830-1839". In:_____. VALLIAS, André (org., intr. e trad.). Heine, heim? Poeta dos contrários. São Paulo: Perspectiva, Goethe Institut, 2011.

23.12.12

Lêdo Ivo: "O portão"






O portão




O portão fica aberto o dia inteiro

mas à noite eu mesmo vou fechá-lo.

Não espero nenhum visitante noturno

a não ser o ladrão que salta o muro dos sonhos.

A noite é tão silenciosa que me faz escutar

o nascimento dos mananciais nas florestas.

Minha cama branca como a via-láctea

é breve para mim na noite negra.

Ocupo todo o espaço da mundo. Minha mão desatenta

derruba uma estrela e enxota um morcego.

O bater de meu coração intriga as corujas

que, nos ramos dos cedros, ruminam o enigma

do dia e da noite paridos pelas águas.

No meu sonho de pedra fico imóvel e viajo.

Sou o vento que apalpa as alcachofras

e enferruja os arreios pendurados no estábulo.

Sou a formiga que, guiada pelas constelações,

respira os perfumes da terra e do oceano.

Um homem que sonha é tudo o que não é:

o mar que os navios avariaram,

o silvo negro do trem entre fogueiras,

a mancha que escurece o tambor de querosene.

Se antes de dormir fecho o meu portão

no sonho ele se abre. E quem não veio de dia

pisando as folhas secas dos eucaliptos

vem de noite e conhece o caminho, igual aos mortos

que todavia jamais vieram, mas sabem onde estou

— coberto por uma mortalha, como todos os que sonham

e se agitam na escuridão, e gritam as palavras

que fugiram do dicionário e foram respirar o ar da noite que cheira a jasmim

e ao doce esterco fermentado.

os visitantes indesejáveis atravessam as portas trancadas

e as persianas que filtram a passagem da brisa e me rodeiam.

Ó mistério do mundo! Nenhum cadeado fecha o portão da noite.

Foi em vão que ao anoitecer pensei em dormir sozinho

protegido pelo arame farpado que cerca as minhas terras

e pelos meus cães que sonham de olhos abertos.

À noite, uma simples aragem destrói os muros dos homens.

Embora o meu portão vá amanhecer fechado

sei que alguém o abriu, no silêncio da noite,

e assistiu no escuro ao meu sono inquieto.





IVO, Lêdo. "A noite misteriosa". In:_____. Poesia completa (1940-2004). Rio de Janeiro: Topbooks, 2004.

20.12.12

Luiz Roberto Nascimento Silva: "O alfabeto da devassa"






Por mais duro que pareça agora
isso tudo passará.
A tempestade irá embora.

As nuvens pesadas se dissiparão.
Poderemos olhar o céu,
sol poente; novamente

Guardaremos a lição:
para cada azul cintilante
brilhando sob nossas cabeças

existe igual noite de trevas
mosaico invertido,
grafite da escuridão.




SILVA, Luiz Roberto Nascimento. O alfabeto da devassa. Rio de Janeiro: Rocco, 2005.

18.12.12

Lau Siqueira: "Viver é delicado"







viver é delicado

argumento de samba

sentimento de fado





SIQUEIRA, Lau. Poesia sem pele. Porto Alegre: Casa Verde, 2011.


16.12.12

Friedrich Nietzsche: § 157 de "Além do bem e do mal": trad. de Paulo César de Souza





157
O pensamento do suicídio é um forte consolo: com ele atravessamos mais de uma noite ruim.



NIETZSCHE, Friedrich. Além do bem e do mal. Prelúdio a uma filosofia do futuro. trad., notas e posfácio de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.







14.12.12

Günther Eich: "Inventur" / "Balanço": trad. Rosvitha Friesen Blume e Markus J. Weininger






Balanço



Isso é minha boina,
isso o meu casacão,
aqui meu barbeador
na sacola de linho.

Lata de conserva:
meu prato, meu copo,
risquei o nome na
face da lata.

Riscado aqui com este
precioso prego
que de invejosos
olhos escondo.

Na sacola do pão,
um par de meias de lã
e algumas coisas
que a ninguém revelo,

assim, serve à minha cabeça
como travesseiro de noite.
O papelão aqui se estende
entre mim e a terra.

A carga do lápis
é o que mais amo:
de dia escreve-me versos
que de noite inventei.

Aqui meus alfarrábios,
isso é minha lona,
isso é minha toalha,
isso, meu fio de coser.




Inventur


Dies ist meine Mütze,
dies ist mein Mantel,
hier mein Rasierzeug
im Beutel aus Leinen.

Konservenbüchse:
Mein Teller, mein Becher,
ich hab in das Weißblech
den Namen geritzt.

Geritzt hier mit diesem
kostbaren Nagel,
den vor begehrlichen
Augen ich berge.

Im Brotbeutel sind
ein Paar wollene Socken
und einiges, was ich
niemand verrate,

so dient er als Kissen
nachts meinem Kopf.
Die Pappe hier liegt
zwischen mir und der Erde.

Die Bleistiftmine
lieb ich am meisten:
Tags schreibt sie mir Verse,
die nachts ich erdacht.

Dies ist mein Notizbuch,
dies ist meine Zeltbahn,
dies ist mein Handtuch,
dies ist mein Zwirn.



EICH, Günther. "Inventur" / "Balanço". In:_____. BLUME, Rosvitha Friesen e WEININGER, Markus J. (Orgs.) Seis décadas da poesia alemã. Do pós-guerra ao início do século XXI. antologia bilingue. Trad. dos organizadores. Florianópolis: Editora UFSC, 2012.

12.12.12

Rainer Maria Rilke: "Schlußstück" / "Conclusão": trad. Augusto de Campos






Schlußstück


Der Tod ist groß.
Wir sind die Seinen
lachenden Munds.
Wenn wir uns mitten im Leben meinen,
wagt er zu weinen
mitten in uns.





Conclusão

A Morte é grande.
Nós, sua presa,
vamos sem receio.
Quando rimos, indo, em meio à correnteza,
chora de surpresa
em nosso meio.





RILKE, Rainer Maria. "O livro de imagens"/"Das Buch des Bilders". In: CAMPOS, Augusto. Coisas e anjos de Rilke. Perspectiva: 2001.

9.12.12

Bertolt Brecht: "Den Nachgeborenen" / "O nascido depois": trad. Paulo César de Souza






O nascido depois

Eu confesso: eu
Não tenho esperança.
Os cegos falam de uma saída. Eu
Vejo.
Após os erros terem sido usados
Como última companhia, à nossa frente
Senta-se o Nada.





Den Nachgeborenen

Ich gestehe es: ich
Habe keine Hoffnung.
Die Blinden reden von einem Ausweg.
Ich sehe.
Wenn die Irrtümer verbraucht sind
Sitzt als letzter Gesellschafter
Uns das Nichts gegenüber.




BRECHT, Bertolt. Werke. Große kommentierte Berliner und Frankfurter Ausgabe. Frankfurt: Suhrkamp, 1988.

BRECHT, Bertolt. Poemas 1913-1956. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Editora 34, 2000.

8.12.12

CONVITE




Data: 11 de dezembro de 2012
Hora: 18:30hs
Local: Salão Marquês de Paraná
Universidade Cândido Mendes
Rua da Assembléia, 10 - 42º andar
Rio de Janeiro, RJ





Informações:

Rua Mosela, 289, Mosela - Petrópolis, RJ
Tel/Fax: (24) 2242-6433
e-mails: bolrede@terra.com.br
centroalceuamorosolima@yahoo.com.br


Apoio:
Associação de Amigos do Dr. Alceu / AADA

5.12.12

Paul Celan: "Der Gast" / "O hóspede": trad. Flávio R. Kothe






O hóspede

Bem antes da noite
te visita alguém que saudou o obscuro.
Bem antes do dia
ele acorda
e ativa, antes de partir, um sono,
um sono ressoando passos:
ficas a ouvi-lo mensurar distâncias,
e é bem lá que lanças tua alma.



Der Gast

Lange vor Abend

kehrt bei dir ein, der den Gruß getauscht mit dem Dunkel.
Lange vor Tag
wacht er auf
und facht, eh er geht, einen Schlaf an,
einen Schlaf, durchklungen von Schritten:
du hörst ihn die Fernen durchmessen
und wirfst deine Seele dorthin.

      CELAN, Paul. Poemas II. Introdução, tradução, comentários e organização de Flávio R. Kothe. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1985.  

3.12.12

Conferências sobre Filosofia e Cultura Brasileira


Programação


CAIXA Cultural Rio de Janeiro

04 a 07 de dezembro de 2012

Av. Almirante Barroso, 25 – Centro

(próximo ao metrô Carioca)

Telefone: (21) 2544-4080

As vagas serão preenchidas pela ordem de chegada dos interessados.

80 vagas. Sujeito à lotação.

As senhas serão distribuídas a partir das 17h.

04/12, terça-feira

18h Antonio Cícero: Filosofia e niilismo

19h30 Ana Cristina Chiara: O salto da índia: corpos na cultura brasileira

05/12, quarta-feira

18h Luiz Carlos Maciel: O sol da liberdade

19h30 Patrick Pessoa: Brás e o Brasil: a Filosofia da Arte de Machado de Assis

06/12, quinta-feira

18h Adriany Mendonça: Aspectos filosóficos da antropofagia oswaldiana

19h30 Alexandre Mendonça: Cultura popular e Filosofia

07/12, sexta-feira

18h Rosa Dias: A família do barulho na Belair de Júlio Bressane

19h30 Jorge Mautner: A amálgama do Brasil universal

2.12.12

Antero de Quental: "Sonho oriental"







Sonho Oriental



Sonho-me ás vezes rei, n'alguma ilha,
Muito longe, nos mares do Oriente,
Onde a noite é balsâmica e fulgente
E a lua cheia sobre as águas brilha...

O aroma da magnólia e da baunilha
Paira no ar diáfano e dormente...
Lambe a orla dos bosques, vagamente,
O mar com finas ondas de escumilha...

E enquanto eu na varanda de marfim
Me encosto, absorto n'um cismar sem fim,
Tu, meu amor, divagas ao luar,

Do profundo jardim pelas clareiras,
Ou descansas debaixo das palmeiras,
Tendo aos pés um leão familiar.




QUENTAL, Antero de. Sonetos. Org. por António Sérgio. Lisboa: Sá da Costa, 1963.