Maravilha de espaço, maravilha de poesias. Versos que pulsam e além, instigam, enumeram fatos, encanto e verso e eis que de repente leio algo vasto além do poema em si.
Nem sei se posso postar um poema. Que bom este blog, o conheci por acaso. 10. O poema de Marco Lucchesi é muito bonito e me lembrou esta poesia bela e forte.
Epitáfio
(...)
"Matou-se de paixão ou morreu de preguiça, Se vive, é só de vício; e deixa apenas isso: - Não ser a sua amante foi seu maior suplício. -
Não nasceu por nenhum lado E foi criado como mudo, Tornou-se um arlequim-guisado, Mistura adúltera de tudo.
Tinha um não-sei-que, - sem saber onde; Ouro, - sem trocado para o bonde; Nervos, - sem nervo; vigor sem "garra"; Alma, - faltava uma guitarra; Amor, - mas sem bastante fome. - Muitos nomes para ter um nome. -
Idealista, - sem idéia. Rima Rica, - sem matéria-prima; De volta, - sem nunca ter ido; Se achando sempre perdido.
Poeta, apesar do verso; Artista sem arte, - ao inverso; Filósofo - vide-verso.
Um sério cômico, - sem sal. Ator: não soube seu papel; Pintor: do-ré-mi-fá-sol; E músico: usava o pincel.
Uma cabeça! - sim, de vento; Muito louco para ter tento; Seu mal foi singular de mais. - Seus pés quebrados, pés demais.
Avis rara - mas de rapina; Macho... com manha feminina; Capaz de tudo, - bom pra nada; Com certeza, - por certo errada.
Pródigo como o filho errante Do Testamento, - herança vacante. Rebelde, - e com receio do lugar Comum não saía do lugar.
Colorista sem cavalete; Imcompreendido... - abriu o peito: Chorou, cantou em falsete; - E foi um defeito perfeito.
Não foi alguém, nem foi ninguém. Seu natural era o ar bem Posto, em pose para a posteridade; Cínico, na maior ingenuidade; Impostor, sem cobrar imposto. - Seu gosto estava no desgosto.
Ninguém foi mais igual, mais gêmeo Irmão siamês de si mesmo. Viu-se a si próprio ao microscópio: Micróbio de seu próprio ópio. Viajante de rotas perdidas, S.O.S. sem salva-vidas...
Muito cheio de si para aturar-se, Cabeça "alta", espírito ativo, Findou, sem saber findar-se, Ou vivo-morto ou morto-vivo.
Aqui jaz, coração sem cor, desacordado, Um bem logrado malogrado."
Lindo poema do Marco Lucchesi! Belíssima homenagem a esse grande escritor que foi Antonio Carlos Villaça. E quanto a Marco, um dos grandes nomes da poesia(mas não só!) que surgiu por aqui desde nessas últimas duas décadas. A amplidão e a profundidade dos seus interesses, a força, a fome, a passionalidade da sua erudição sempre sensível, sempre insatisfeita com as soluções fechadas, redutoras, cansadas e fáceis, fazem dele, na minha opinião um dos grandes intelectuais que o Brasil produziu. A grande figura humana que ele é ilumina e dá um relevo ainda maior à sua figura, sempre generosa, sempre disposta ao diálogo verdadeiro. Por isso insisto nesse "paradoxo Lucchesi", já que Marco desfaz completamente o lugar-comum que opõe "erudição" e "sensibilidade", poucos tão eruditos e poucos que conseguem tornar essa erudição espantosa uma massa viva, em fluxo passional, pulsante. Mas a chave para esse "paradoxo" (paradoxo ou incompatibilidade apenas para aqueles de visão rasa...) talvez esteja sugerida no volume de breves "clarões memorialísticos" que é o seu livro "Saudades do Paraíso": o 'leitmotiv' de Marco é o menino-poeta que lá aparece em muitos momentos, que se espanta com a vastidão do mundo, de suas possibilidades quando navega no transmissor de ondas curtas do pai...
Parabéns Cícero pelo belíssimo blog! Você que é uma das vozes mais sensíveis da nossa poesia.
Maravilha de espaço, maravilha de poesias. Versos que pulsam e além, instigam, enumeram fatos, encanto e verso e eis que de repente leio algo vasto além do poema em si.
ResponderExcluirMuito bom, Cícero.
Abraço grande.
Muito obrigado por palavras tão gentis, Clóvis. Seja bem-vindo!
ResponderExcluirAbraço grande,
Antonio Cicero
Esse Villaça é o Marcos Antonio Villaça? Muito bonito o poema, Cícero. Parabéns ao autor.Aquele abraço.
ResponderExcluirNem sei se posso postar um poema.
ResponderExcluirQue bom este blog, o conheci por acaso. 10. O poema de Marco Lucchesi é muito bonito e me lembrou esta poesia bela e forte.
Epitáfio
(...)
"Matou-se de paixão ou morreu de preguiça,
Se vive, é só de vício; e deixa apenas isso:
- Não ser a sua amante foi seu maior suplício. -
Não nasceu por nenhum lado
E foi criado como mudo,
Tornou-se um arlequim-guisado,
Mistura adúltera de tudo.
Tinha um não-sei-que, - sem saber onde;
Ouro, - sem trocado para o bonde;
Nervos, - sem nervo; vigor sem "garra";
Alma, - faltava uma guitarra;
Amor, - mas sem bastante fome.
- Muitos nomes para ter um nome. -
Idealista, - sem idéia. Rima
Rica, - sem matéria-prima;
De volta, - sem nunca ter ido;
Se achando sempre perdido.
Poeta, apesar do verso;
Artista sem arte, - ao inverso;
Filósofo - vide-verso.
Um sério cômico, - sem sal.
Ator: não soube seu papel;
Pintor: do-ré-mi-fá-sol;
E músico: usava o pincel.
Uma cabeça! - sim, de vento;
Muito louco para ter tento;
Seu mal foi singular de mais.
- Seus pés quebrados, pés demais.
Avis rara - mas de rapina;
Macho... com manha feminina;
Capaz de tudo, - bom pra nada;
Com certeza, - por certo errada.
Pródigo como o filho errante
Do Testamento, - herança vacante.
Rebelde, - e com receio do lugar
Comum não saía do lugar.
Colorista sem cavalete;
Imcompreendido... - abriu o peito:
Chorou, cantou em falsete;
- E foi um defeito perfeito.
Não foi alguém, nem foi ninguém.
Seu natural era o ar bem
Posto, em pose para a posteridade;
Cínico, na maior ingenuidade;
Impostor, sem cobrar imposto.
- Seu gosto estava no desgosto.
Ninguém foi mais igual, mais gêmeo
Irmão siamês de si mesmo.
Viu-se a si próprio ao microscópio:
Micróbio de seu próprio ópio.
Viajante de rotas perdidas,
S.O.S. sem salva-vidas...
Muito cheio de si para aturar-se,
Cabeça "alta", espírito ativo,
Findou, sem saber findar-se,
Ou vivo-morto ou morto-vivo.
Aqui jaz, coração sem cor, desacordado,
Um bem logrado malogrado."
Tristan Corbière
(Tradução de Augusto de Campos)
Caro anônimo,
ResponderExcluirMuito obrigado por postar a bela tradução de Augusto do belo poema de Corbière. Adorei.
Abraço,
Antonio Cicero
Lindo poema do Marco Lucchesi! Belíssima homenagem a esse grande escritor que foi Antonio Carlos Villaça. E quanto a Marco, um dos grandes nomes da poesia(mas não só!) que surgiu por aqui desde nessas últimas duas décadas. A amplidão e a profundidade dos seus interesses, a força, a fome, a passionalidade da sua erudição sempre sensível, sempre insatisfeita com as soluções fechadas, redutoras, cansadas e fáceis, fazem dele, na minha opinião um dos grandes intelectuais que o Brasil produziu. A grande figura humana que ele é ilumina e dá um relevo ainda maior à sua figura, sempre generosa, sempre disposta ao diálogo verdadeiro. Por isso insisto nesse "paradoxo Lucchesi", já que Marco desfaz completamente o lugar-comum que opõe "erudição" e "sensibilidade", poucos tão eruditos e poucos que conseguem tornar essa erudição espantosa uma massa viva, em fluxo passional, pulsante. Mas a chave para esse "paradoxo" (paradoxo ou incompatibilidade apenas para aqueles de visão rasa...) talvez esteja sugerida no volume de breves "clarões memorialísticos" que é o seu livro "Saudades do Paraíso": o 'leitmotiv' de Marco é o menino-poeta que lá aparece em muitos momentos, que se espanta com a vastidão do mundo, de suas possibilidades quando navega no transmissor de ondas curtas do pai...
ResponderExcluirParabéns Cícero pelo belíssimo blog! Você que é uma das vozes mais sensíveis da nossa poesia.
Fabrício Gonçalves