12.1.11

Cassiano Ricardo: "Em voz alta"




Em voz alta

Eu quis contar o meu maior segredo
sem encontrar ninguém que mo escutasse.
Pois ninguém quer ouvir a dor alheia.
O mundo é sempre mau : Voltou-me a face.

Chegue-me o bem que espero tarde ou cedo,
que me adianta gritar, se o céu é mudo?
se o segrédo que guardo no meu peito
por mais que eu grite fica sempre oculto?

Em vão falo em voz alta, subo a uma árvore,
quando tento contar o meu segredo.
Mal secreto como este nunca houve.

Maior não é o segrédo inconfessável,
mas o que fica em nós como um rochedo.
E quanto mais gritado menos se ouve.



RICARDO, Cassiano. In: CAMPOS, Paulo Mendes. Forma e expressão do soneto (org.) Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde, 1952.

10 comentários:

  1. Amado Cicero,


    Que Preciosidade esse soneto! Lindo demais! Bravo! Viva Cassiano Ricardo que compôs essa pérola maravilhosa!

    Um poema novo:

    "segundo tempo"


    pensei
    pensei pensei...
    e era tudo
    artimanha sináptica
    trama arquitetada
    pela solidão.

    andei
    um pouco
    pelas avenidas, perto
    da orla, antes
    da hora de
    decisão: tudo

    poderia até dar
    certo, mas
    o tédio
    a dor
    a raiva
    o ciúme
    a cena vista (filtrada
    pelo lobo occipital
    ou imaginada?)
    tudo
    tudo
    durou mais
    do que podia
    durou
    um segundo a mais
    durou...

    e voltei
    sem desvencilhar-me da ideia.
    era a melhor? era
    o que era
    e era ter dúvidas de mim
    e de toda a roda-viva
    em volta.

    cerco fechado.
    atento à vida
    que não mais teria,
    pus-me
    a reverter... ou
    verter
    a vida da vida noutra
    alegria.
    e dormi,
    entre pernas e braços
    (nunca mais
    me reconheceria)
    conhecidos...
    depois

    raiou o dia:
    um corpo exposto
    confuso
    completo
    cansado...
    planejando dentro
    do sono

    um pedido de
    desculpas
    para o ser
    amado.


    Abraço fraterno,
    Adriano Nunes.

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  2. isto é lindo.
    fez meu olho arder.

    bj,
    Simone

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  3. Cicero,


    um poema novo:

    "poesia"


    poesia não é.
    há de ser um dia,
    qualquer coisa ou

    coisa alguma.
    (mata virgem arco-íris ventania
    urso de pelúcia moldura antiga
    casca de ferida
    âmago alegria)

    labirinto

    em que me penso
    me peso
    me pesco

    (pondero: que não
    seria?)

    me sustento
    me sufoco
    me suporto e
    me sinto.

    óvulo do inesperado
    óbvio
    ovni.

    o mínimo:
    o mundo.


    Abração,
    A. Nunes.

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  4. È noite

    É noite
    Imersa no silêncio
    Tão obscuro
    Eu te procuro
    Porque, ai
    Esse meu coração
    É porta aberta
    Em meio à escuridão
    Abre-se o bordão
    Ah, e o vento frio bate
    Nas costas e encostas
    Pelas montanhas
    Verte pelo rio
    A alma em rodopio.

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  5. Ganhei o dia depois de ler esse soneto. De primeira, Cicero! Um dos melhores.

    Vou guardá-lo comigo certamente.

    Um abraço.
    Jefferson.

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  6. Fiquei curioso com o livro organizado pelo Paulo Mendes Campos, que é autor também de alguns sonetos primorosos. Mendes Campos aliás me parece um tanto subestimado na poesia brasileira. É autor de alguns poemas excelentes.

    Abraço

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  7. Caro Roberto,

    Herdei de meu pai esse livrinho de 53 páginas. Seu primeiro soneto é “Buscando o Cristo crucificado”, de Gregório de Matos, e o último é “A árvore”, de Geir Campos. Contando com uma bela introdução do Paulo Mendes Campos, ele faz parte de uma coleção chamada “Os cadernos de cultura”, editada pelo Serviço de Documentação do Ministério da Educação. Aos poucos, vou postar outras coisas dele.

    Abraço

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  8. Tomara que não se esqueça de postar outros poemas desse livro, Cícero. Provalvelmente não será reeditado e ficaremos com grande dificuldade - ou nenhuma - de conseguir. Você citou um poema de Geir Campos - do qual consegui alguma coisa nos sebos, mas o soneto "Árvore" não consta em nenhum dos livros.
    Dou a maior força para publicar aqui no blog. Ficaremos gratos.
    Um abraço!

    Jefferson.

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