18.8.10

Adília Lopes: "Arte poética"




Arte poética

Escrever um poema
é como apanhar um peixe
com as mãos
nunca pesquei assim um peixe
mas posso falar assim
sei que nem tudo o que vem às mãos
é peixe
o peixe debate-se
tenta escapar-se
escapa-se
eu persisto
luto corpo a corpo
com o peixe
ou morremos os dois
ou nos salvamos os dois
tenho de estar atenta
tenho medo de não chegar ao fim
é uma questão de vida ou de morte
quando chego ao fim
descubro que precisei de apanhar o peixe
para me livrar do peixe
livro-me do peixe com o alívio
que não sei dizer



LOPES, Adília. Um jogo bastante perigoso. Lisboa: Edição da autora, 1985.

16 comentários:

  1. Muitos poetas fazem poemas sobre esse tema... Esse é belíssimo!

    "livro-me do peixe com o alívio /
    que não sei dizer", mas, para o poeta, logo o embate recomeça.
    Não é mesmo?

    Grande Abraço!

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  2. Cicero,


    Lindo demais!


    Abraço forte!
    Adriano Nunes.

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  3. Disco voador

    Quando eu me sinto assim
    Tão distante de mim
    Olhando prá vida distraída
    Os carros passando na medida
    Golpes de martelo
    Um sino angelical
    E nos quatro cantos
    Saídas e partidas
    Frio intenso enquanto penso
    Não quero peixe
    Não quero água
    Não quero mágoa
    Não quero dor
    Só quero você, amor
    Não sinto isso
    Não sei daquilo
    Não inventei
    Não espetei
    De nada sei, não
    Vi o disco voador.

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  4. morta de prazer lendo isso*

    beijos seu cicero !

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  5. Muito interessante como ela descreve o seu processo de criação.
    Belo e interesante!

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  6. Cicero,


    Um poema novo:


    "de vez em quando" - Para Betina Moraes.




    de vez em quando
    eu canto
    meu pranto
    eu espanto as bruxas
    eu mando
    tudo para o inferno
    eu berro
    eu grito
    eu abrigo tímido
    o silêncio
    o grafite
    a folha
    em branco
    o rabisco...
    em meu coração.

    que risco!

    a seiva de tudo
    de todo segundo
    no milésimo
    momento
    do seguinte
    segundo,
    o mundo...

    e quando,
    sob o efeito
    de tal encanto,
    eu poderia
    vingar,
    ter n'alma
    uma alegria,
    sequer a vida
    dá por mim...
    ainda que
    a tudo
    eu
    siga
    entregando

    olhos
    medos
    sonhos
    esperanças
    versos...

    o meu ser
    inteiro.


    Abração,
    Adriano Nunes.

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  7. E eu já apanhei peixes com as mãos... e é um desafio, sem dúvida :)! O desafio poético só acontece quando se liberta a poesia (tal como o peixe que deve seguir em liberdade), é aí que se dá a verdadeira arte!

    Comparação interessante! :)

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  8. que coisa, não?
    salve-salve, adília e adélia!


    BILHETE


    escrevi um verso
    um poema
    um livro

    e daí?

    se a esquadria do que escrevo
    não me segura
    o esqueleto de água

    se vou morrer
    se vais morrer
    se vai morrer a língua
    em que escrevo
    se vai morrer o país
    que fala minha língua
    e todas as línguas de todos
    os países que falam

    por que esta teimosia
    em escrever?

    por que não deixar
    o passado fedendo
    o futuro mentindo
    impunemente
    o presente apenas
    o que já vai deixando de ser?

    escrevo como quem
    vive e não vai viver

    não como quem
    à visitação pública
    em terras de amanhã
    se enraíza e flora

    eu escrevo não para ficar,
    meu amor,

    escrevo para ir embora

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  9. Pessoalmente não aprecvio este modo de poesia...
    Mas aproveito, visto nºao ter o seu e-mail, para lhe dizer que coloquei um poema seu no meu blogue:o Sair
    http://barcosflores.blogspot.com

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  10. Amado Cicero,


    A minha Arte:


    ‎"Arte poética" - Para Antonio Cicero.

    o poema só
    surge quando quer,
    com razão. qualquer
    dia desses, só-

    brio, ganharei
    toda a sua luz.
    isso não reduz
    fuga alguma: é lei,

    entre as muitas musas,
    o cérebro ver-
    ter formas confusas

    de sinapses, ver
    as idéias reclusas,
    sem saber nascer.


    Abraço forte,
    Adriano Nunes.

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  11. Caro Cicero,

    Estou na Suica e hoje visitei, em Sils-Maria, a casa de Niet. La lembrei de todos os q me ensinaram algo sobre o referido filosofo, vc inclusive. Por isso, passei aqui para registrar e agradecer. Abcs

    PS: perdoe os erros e as abreviacoes: eh q estou usando o confuso teclado de um hotel coreano.

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  12. Muitíssimo obrigado, Adriano!

    É um poema lindo. Parabéns!

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  13. Que bela viagem, Aetano! Aproveite. E fico contente de você ter lembrado de mim. Quem agradece sou eu.

    Abraço

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  14. É perigoso mesmo. Acho que no final das contas é o peixe que leva a melhor.

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