O seguinte artigo do Hudson Carvalho foi publicado no dia 19 de agosto no Jornal do Brasil. Trata-se de uma reflexão muito bem pensada e equilibrada sobre a possível candidatura de Marina Silva à presidência do Brasil.
A candidatura de Marina Silva
Depois de 30 anos de filiação, a senadora Marina Silva anunciou sua saída do PT. Embora ainda não o tenha feito, filiar-se-á ao PV, para se candidatar à presidência da República em 2010. A nova matrícula partidária e a condição de postulante ao Palácio do Planalto revestem-se, momentaneamente, de zelo ritualístico, para tentar agregar grandeza a um gesto que pode ser facilmente visto como algo menor, como uma simples acomodação de um ambicioso projeto pessoal. E, na cartilha politicamente correta, não fica bem gente como Marina Silva, mulher de biografia e de qualidades notáveis, ter projetos pessoais; isso é coisa de convencionais políticos oportunistas. Pois bem, Marina Silva deixa o PT e, agora, busca dar sentido social e ecológico ao seu movimento. Por sua vez, para abrigar Marina Silva, o PV se propõe a se despoluir e a se refundar, através de um programa ecologicamente incrementado. Ou seja, ambos se movimentam para dar justificativa pública e conforto ao outro. Não fazem nada de condenável; assim é a vida.
Especula-se que Marina Silva agitará a pasmaceira que se esboçava para a sucessão presidencial, com o cenário se resumindo às candidaturas petista e tucana. Pode ser, embora não haja nada, por ora, que sustente essa hipótese, além de uma torcida efusiva por parte de diminutos setores específicos. Nas pesquisas dos institutos mais sérios, não há registro de que o seu nome possa vir a empolgar. Isso não chega a ser nenhuma tragédia. Primeiro porque as pesquisas, a essa distância do pleito, retratam mais grau de conhecimento do que intenção de votos. Segundo porque o decisivo é o próprio processo eleitoral, e não esses fotogramas preliminares. Uma eventual candidatura Marina Silva, portanto, poderá crescer ou não, dependendo das circunstâncias.
Na ótica atual, contudo, as expectativas eleitorais para ela não são das mais auspiciosas. O PV é um partido pequeno, com pouco tempo de televisão e sem expressiva capilaridade nacional. Além disso, há um elenco prévio de sólidas postulações - José Serra ou Aécio Neves, Dilma Rouseff, Ciro Gomes e Heloísa Helena. Mesmo que um ou dois deles não estejam efetivamente no pleito, romper a polarização tucano-petista não será fácil. Se os tucanos tiverem a habilidade de montarem a hoje descosturada chapa José Serra e Aécio Neves (leia-se São Paulo e Minas Gerais, os dois maiores colégios eleitorais) e se os petistas conseguirem transformar a agenda eleitoral em um plebiscito sobre o presidente Lula, menos espaço disporão as demais alternativas.
Por sua vez, a bandeira ecológica pode vir a ter as suas limitações eleitorais, mesmo que a temática tenha aumentado de importância universalmente. No fim do milênio passado, esse era um estandarte moldado às novas esquerdas. Hoje, até em função do crescimento de sua importância, a ecologia, até por puro oportunismo, foi adotada por quase todas as forças políticas contemporâneas, inclusive algumas de direita. Por ser tema de quase todos, com maior ou menor ênfase, não tem o potencial de distinção que já teve. Mais do que os outros, Marina Silva é visceralmente ligada ao assunto. Mas, será este o tema prevalente da sucessão presidencial? Pouco provável. E, se Marina Silva se tornar competitiva, o seu xiitismo nessa questão não poderá também acarretar custos eleitorais, se ele for exposto, pelos adversários, como um elemento de atravancamento do desenvolvimento e da criação de empregos? No momento, mais do que na sua agenda as chances de Marina Silva estão depositadas na ojeriza que segmentos substantivos da população nutrem pelos políticos tradicionais.
Por fim, a pretensão de Marina Silva é vista inicialmente como prejudicial a Dilma Rouseff. Até certo ponto, pode ser, sobretudo por retirar da ministra o apelo de gênero e por ter mais charme eleitoral.
A senadora tem brilho político próprio. A ministra não; sua força eleitoral é derivativa do presidente Lula. Já há quem ache que a candidatura Marina Silva trará mais desconforto à postulação tucana, sob o argumento de que o eleitorado ?qualificado? dos grandes centros urbanos - como o da Zona Sul do Rio, por exemplo -, que é sensível aos encantos da senadora, não tencionaria mesmo a votar na ministra. Essas questões só serão dirimidas no curso eleitoral. É certo que, se a candidatura Marina Silva estimular outras ambições na base de sustentação do governo Lula, como a de Ciro Gomes, por exemplo, a situação da ministra ficará realmente complicada. Em compensação, a presença da senadora, se bem sucedida, poderá ensejar um segundo turno que não haveria em caso de um mano a mano tucano versus petista.
Em suma, do ponto de vista eleitoral, apesar de suas virtudes e de seus positivos simbolismos, a candidatura Marina Silva terá, inicialmente, muitos obstáculos para chegar a abalar as gigantescas máquinas eleitorais do quadro presente; a não ser que se constitua em um fenômeno, coisa em que os seus adeptos crêem e que a realidade política brasileira refuga.
"agir (prásso) e fazer/ poetar (poiéo) não são a mesma coisa" (Aristóteles, Ética a Nicômaco, 1140a). A ação segue a cartilha do tempo, o poetar faz o tempo, a questão não é da ordem da eficácia, é da ordem da grandeza.
ResponderExcluirResumo:
ResponderExcluir1. A movimentação de Marina pode ser vista como oportunista;
2. Embora a candidatura de Marina possa crescer, "na ótica atual as expectativas eleitorais para ela não são das mais auspiciosas.";
3. É pouco provável que o meio ambiente seja o tema predominante na campanha. Além disso, em virtude dessa bandeira Marina pode ser vista como um estorvo ao desenvolvimento;
4. "Se a candidatura Marina Silva estimular outras ambições na base de sustentação do governo Lula, como a de Ciro Gomes, por exemplo, a situação da ministra ficará realmente complicada."
5. Ou seja, "apesar de suas virtudes e de seus positivos simbolismos, a candidatura Marina Silva terá, inicialmente, muitos obstáculos para chegar a abalar as gigantescas máquinas eleitorais do quadro presente; a não ser que se constitua em um fenômeno, coisa em que os seus adeptos crêem e que a realidade política brasileira refuga."
Tudo muito redondo, mas angustiante!!! Para mim, que preciso ter esperanças para sair de casa e que, por imperativo de sobrevivência, tenho de me lixar para muitos fatos, AFETIVAMENTE, não há como deixar de implicar com essa análise, cuja nota de esperança, ironicamente, parece ser somente essa:
"o decisivo é o próprio processo eleitoral, e não esses fotogramas preliminares."
"Concessa venia", Cicero, eu não gostei! Não que eu tenha muitas expectativas em relação a um possível governo de Marina Silva. O problema é que eu não suporto mais o peso dos fatos...
Abraços!
Aeta
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ResponderExcluirBelo dizer de Antonio Bento. A presidência é cargo muito pequeno para Marina e o que ela representa. Será que ela, candidata, aumenta a presidência ou se diminui?
ResponderExcluirMarina se filiou ao Pt em 1985, não ficou 30 anos no partido, segundo informa do autor do artigo. o próprio pt não tem 30 anos de existência, fora fundado em 1980.
ResponderExcluirnão é Lupo? Sou de um tempo em que o PT boicotou as eleições indiretas de José Sarney e de um Tancreto Neves traidor das Diretas, e expulsou seus dois únicos deputados que votaram em Sarney (mas isso foi autoritário). Bem, o fazer da poesia vai muito além, chega em Cíceros e Marinas.
ResponderExcluirCaro animal racional,
ResponderExcluirVocê está dando uma precisão, sem dúvida, mas, francamente, não creio que tivesse feito muita diferença se, no lugar de dizer:
"Depois de 30 anos de filiação, a senadora Marina Silva anunciou sua saída do PT",
ele tivesse escrito:
"Depois de um quarto de século de filiação, a senadora Marina Silva anunciou sua saída do PT".
Abraço
Não creio que razões éticas tenham sido a principal causa da saída de Marina Silva do PT. Lembram-se do Mensalão? Pois bem, não ouviu-se um pio dela naquela ocasião.
ResponderExcluirA razão principal, aliás a razão de praticamente todas as baixarias recentes, é a pessoa e a candidatura Dilma Roussef, empurrada goela abaixo de todos por Lulla, o Grande.
No PT, a esperança é a última que foge.
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