29.4.09

Dado Amaral: "ai que vontade de largar tudo"

.


ai que vontade de largar tudo
virar música
e sair por aí
de dentro dos radinhos de pilha
entrar pelos ouvidos das moças
vibrar nos ossos das pessoas

ai que vontade de deitar nu
numa nuvem numa boa
virar chuva
e cair por aí
molhar a copa das árvores
o capô dos automóveis
refrescar a cabeça das pessoas

me largar
lavar o ar
e pingar sobre a Lagoa.



De: AMARAL, Dado. Olho nu. Rio de Janeiro: Mundo das Idéias, 2008.

16 comentários:

  1. ôi Cícero
    Gosto deste poema quase-brinquedo, onde o prazer estético é fácil e nem por isso, menor. Arrisco-me(nunca o fiz antes)de apresentar algo meu, neste mesmo registro (não sem medo...)

    Trabalho Noturno

    Na noite escura, o relógio produz unidades de tic-tac,milhares... a mim me é dado o trabalho de empilhá-los um a um.


    No escuro, um avião cruza ruidosamente o céu de minha noite, a mim me é dada a tarefa de medir, com uma régua, o som comprido.

    No escuro, os cães grandes latem quadrado e são seguidos por latidinhos redondos dos cães menores.
    A mim me cabe, guardar os quadrados em caixas e os redondos em latinhas.

    Na noite quente, as estrelas derretem
    e a mim me é dado moldá-las para a noite seguinte.

    No meio da noite escura, um galo canta fora de hora
    E eu preciso anotar esta extravagância.

    Na noite densa, meus pensamentos fogem e é preciso conduzi-los de volta, gado xucro ao curral.

    Na noite funda, um medo monstro abre boca e preciso suportar o seu hálito até o dia clarear.

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  2. Nossa, lindo. De verdade.
    Não conhecia, vou buscá-lo.

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  3. parece coisa do grande jorge mautner, este poema.

    cicero, poderia por favor dizer o titulo original em italiano do livro de massimo cacciare "nietzche e jesus"?

    obrigado,
    abraço,
    luiz

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  4. Antonio,

    Que belo poema! Ganhei o dia hoje! Parabéns pela postagem!

    ***SÓ SILÊNCIOS EM REDOR***


    Perco-me contando as horas.
    Há tanta alegria ali.
    Por que tu sempre demoras
    Pra trazer tudo de ti

    Pra mim? Que ainda preciso
    Desse drama, teu teatro
    Inacabado, impreciso?
    Por que sempre te idolatro?

    Quanta gritaria além
    Dos berros do coração,
    Ecos, ruídos, desdém
    De alguém, poemas não são?

    Só silêncios em redor.
    Encontro-me tonta agora.
    Lá fora, será pior?
    Pressinto que foste embora.


    Beijos,
    Cecile.

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  5. Cicero,

    Não conhecia o autor e vou em busca desse livro em breve!


    "INFECUNDO"


    Um poema,
    Que pretende?


    Mesmo preso
    À vontade
    De lançar-se
    A vazios,
    A segredos,


    Não se agrega,
    Um poema,
    A nenhum
    Pensamento.
    Foge apenas


    Do comum,
    Desse mundo


    Violento
    Que se vale
    De verdades,
    Infecundo,
    De vis regras,


    Afastando-se
    Desse frio
    Julgamento
    Sempre feito
    Imperfeito


    Por vassalos
    Encefálicos.



    Abraço forte!
    Adriano Nunes

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  6. Junto-me ao coro: adorei conhecer o Dado Amaral.

    Antonio Cicero é um garimpeiro chique.

    E quem se dá bem somos nós.

    Obrigado por isso.

    Ps.: pena que Dado fechou o blog Poeria - há outro aberto?

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  7. Cicero,


    PAX, adorei o título que você deu ao Cicero: GARIMPEIRO CHIQUE!
    Com certeza, saímos todos nós ganhando essas pérolas descobertas, essas safiras, esses rubis,esses diamantes poéticos!

    Um abração em ambos!
    Adriano Nunes.

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  8. Caro Antonio Cícero,

    um belo poema.
    Desconhecia o poeta, vou procurar os seus livros.
    Obrigado por partilhar.

    Domingos da Mota

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  9. Poeta,

    Dado diz coisas tão achegadas ao que sinto neste poema...Muito Boa a tua sensibilidade na apuração desses poetas! Beijos daqui,
    Pra ti estas linhas...

    Opostos A Postos!

    Quando ele era Pascal,
    Ela era Carmem Miranda
    Ele fala em Schopenhauer
    Ela, em Elvis e sua banda
    Ele releu Zarastruta
    Ela diz que ali tem truta
    Ele acha Nietzsche legal
    Ela diz que ele é biruta
    O que dizer de Confúcio ?
    Se ela diz : -melhor é o Lúcio
    Ele então quis ponderar
    Perguntou de Kierkgaard
    Ela foi rumo à janela
    Fitou o verde do mar
    E sapecou :- sou mais o Edgar!
    Ele fez uma gracinha
    Aquele que é Allan Poe?
    Ela disse :- é Scandurra, benhe!
    Guitarra que grita às turra
    No bamba do grupo Ira
    Que tem por fã a Zulmira
    Ele disse: ah,isso não...
    Socorro, chamem Platão!
    Deem-me frase de Heráclito
    Porque ela é o próprio cão !
    Diz que Freud é um lunático,
    Que só cura "telepático"
    Preferia o performático
    Fred, vulgo Queen-emoção!
    Socorro, chamem a perícia!
    Que eu matei, mas estou limpo!
    Vou correndo até o Olimpo
    Deuses!!! Eu luto com afinco
    Diploma , juntei uns cinco
    E ela diz que não sou prático
    Enquanto vive enrolando
    Supletivo com o “Marlon Brando”
    Seu instrutor tão simpático...


    Nina Araújo.

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  10. o poeta mora na palavra
    a palavra não tem telhado
    quando cai a chuva
    o poeta chove no molhado

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  11. Caro Luiz,

    Na verdade não é um livro, mas um ensaio. A referência é:

    CACCIARI, M. "Il Gesù di Nietzsche". MicroMega, fascicolo 5, 2000.

    Abraço

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  12. Caro Antonio Cicero,

    agradeço pela publicação.
    E agradeço também aos gentis leitores que elogiaram o poema.
    "olho nu" é meu primeiro livro, e já está nas livrarias.
    Aproveito para mencionar o endereço do meu novo blog:
    http://febrix.blogspot.com/

    Abraço a todos,
    Dado

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  13. Antônio,
    Gosto muito do seu blog.
    Segue aí um poema meu.


    SUJEITO OCULTO (Victor Colonna)


    O problema são as conjunções desconjuntadas
    As interjeições rejeitadas
    Os adjetivos desajeitados
    Os substantivos sem substância
    As relações de deselegância entre as palavras.

    É preciso superar o superlativo:
    O absoluto sintético
    E o analítico.
    Achar o verso
    Entre o verbo epilético
    E o pronome sifilítico.

    Falta definir o artigo inoxidável
    O numeral incontável, impagável.

    Resta procurar o objeto direto
    Situar o particípio passado
    E o pretérito mais-que-perfeito

    Desvendar a rima
    Desnudar a palavra
    Encontrar o predicado
    E revelar o sujeito.


    http://www.deitandooverbo.wordpress.com

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  14. Victor,

    obrigado. Também gostei muito do seu poema. Aliás, fico feliz de ver que está alto o nível dos poemas que têm sido aqui postados.

    Abraço

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  15. Antônio,
    em breve vou lançar um livro de poesias, Cabeça, Tronco e Versos Espero que também seja um "acontecimento" (rs).
    Segue aí outro poema.


    BOCA DO ESTÔMAGO (Victor Colonna)


    Minha língua afiada
    Cortou o céu da boca:
    Passei a cuspir marimbondos.

    Era tanto veneno
    Que toda ferida era casca
    Todo ruído era estrondo.

    Um dia, desatento
    Passei ungüento na boca
    E amaciei o céu.

    Pus-me a cuspir marimbondos
    e abelhas
    Sangue adoçado
    Veneno e mel.

    http://www.deitandooverbo.wordpress.com

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  16. que supimpa, cicero!

    que vontade me deu, após a leitura, de também sair por aí, feito música, feito chuva, e entrar pelos ouvidos, e desabar por sobre a cabeça das pessoas, para dar-lhes um embalo musical e uma refrescada na cuca.

    porra, que coisa bonita as linhas do dado amaral, poeta, vê-se, dado ao despojamento, ao livre caminhar.

    'dorei! ;-)

    beijoca boa!

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