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“Deus”, “imortalidade da alma”, “redenção”, “o além”, todos esses são conceitos ao quais não dediquei nenhuma atenção, com os quais não perdi nenhum tempo, nem mesmo quando criança – talvez eu jamais tenha sido bastante infantil para fazê-lo? – Não conheço o ateísmo em absoluto como resultado, e menos ainda como acontecimento: ele se dá em mim como instinto. Sou demasiadamente curioso, demasiadamente problemático, demasiadamente altaneiro para me satisfazer com uma resposta grosseira. Deus é uma resposta grosseira, uma indelicadeza contra nós, pensadores –, até, no fundo, apenas uma proibição grosseira que nos fazem: não deveis pensar!
De: NIETZSCHE, Friedrich. "Ecce homo: wie man wird, was man ist". Werke in drei Bänden. Bd.2. Herausgegeben von Karl Schlechta. München: Hanser, 1954.
CICERO,
ResponderExcluirAcho que esse meu texto cabe aqui, pois é reflexivo:
"ACONTECIMENTO" (Para Antônio Cícero)
Estive muito triste esses dias. Nenhum raio de encanto ou felicidade era capaz de alcançar-me. Senti-me como se estivesse preso às intempéries do destino, como se as esperanças subitamente desaparecessem, uma a uma, como se o nascer do sol já não mais tivesse importância, como se as janelas, mesmo as abertas, não pudessem ser tocadas por minha visão.
Estive muito tenso e angustiado. Nenhuma brisa, nenhuma canção, nenhum poema, nada podia devolver-me quem eu sou, como se os barcos todos tivessem partido cedo demais, antes da minha chegada, como se o céu e o seu esplendor não me reconhecessem como mais um no meio da multidão. E eu não sou nada nessa multidão.
Vejo as pessoas passarem pensantes com seus silêncios secretos e abraçarem suas dúvidas e seus remorsos, suas aflições e seus temores, mas ainda assim e, sempre assim, expondo seus sorrisos sublimes, seus olhares cheios de vida e de graça. Onde naufragou a minha vida? Eu não sei onde pus os meus sonhos. Por que puseram em mim essa dor de séculos, de nunca ter à vista o porvir para os meus pensamentos, sentidos e expectativas?
Agora tudo é possível. Aprendi a amar as impossibilidades e as incertezas. Aprendi a aceitar o acaso como dádiva. A dor está passando. Tudo está passando. O tempo é esta bússola esquecida dentro do meu coração. É um grande Acontecimento em minha existência.
Abraço forte!
Adriano Nunes, Maceió/Al
AMADO CÍCERO,
ResponderExcluirAGORA VAMOS A NIETZSCHE:
"O ANTICRISTO" - 47 - TRADUÇÃO DE PAULO CÉSAR DE SOUZA - PÁGINA 56 - COMPANHIA DAS LETRAS:
"NÃO É ISSO QUE NOS DIFERENCIA, QUE NÃO ENCONTREMOS NENHUM DEUS, SEJA NA NATUREZA OU POR TRÁS DA NATUREZA - MAS SIM QUE NÃO EXPERIMENTAMOS COMO "DIVINO" O QUE FOI VENERADO COMO DEUS, E SIM COMO MISERÁVEL, COMO ABSURDO, COMO NOCIVO, NÃO APENAS COMO ERRO, MAS COMO CRIME CONTRA A VIDA... NEGAMOS DEUS COMO DEUS... SE ESSE DEUS DOS CRISTÃOS NOS FOSSE PROVADO, CRERÍAMOS NELE AO MENOS AINDA. - NUMA FÓRMULA: DEUS, QUALEM PAULUS CREAVIT, DEI NEGATIO [ DEUS, TAL COMO PAULO O CRIOU, É A NEGAÇÃO DE DEUS ]. - UMA RELIGIÃO COMO O CRISTIANISMO, QUE EM NENHUM PONTO TEM TATO COM A REALIDADE, QUE DESMORONA TÃO LOGO A REALIDADE AFIRMA SEU DIREITO NUM SÓ PONTO QUE SEJA, DEVE NATURALMENTE SER INIMIGA MORTAL DA "SABEDORIA DO MUNDO", ISTO É, DA CIÊNCIA - APROVARÁ TODOS OS MEIOS PELOS QUAIS A DISCIPLINA DO ESPÍRITO, A INTEGRIDADE E O RIGOR EM CIÊNCIAS DO ESPÍRITO, A NOBRE LIBERDADE E FRIEZA DO ESPÍRITO PUDER SER ENVENENADA, CALUNIADA, DESACREDITADA...."
A QUESTÃO DEUS É VIOLENTAMENTE DIFÍCIL DE AVALIAR E DOCEMENTE FÁCIL DE ACEITÁ-LA. EU CREIO EM DEUS SEM TER NECESSIDADE DE PROVAS EXISTENCIAIS. CREIO QUE O QUE NIETZSCHE COMBATIA EM SI NÃO ERA A EXISTÊNCIA DE DEUS, MAS COMO O DEUS NOS ERA OFERECIDO PELOS DOGMAS CRISTÃOS. SERIA COMO NOS É PROPOSTO - DE MODO OBVIAMENTE DIFERENTE - A EXISTÊNCIA DE COISAS QUE SÃO PROVADAS MATEMATICAMENTE E QUE A IMAGINAÇÃO PROJETA TAL EXISTÊNCIA, MAS QUE, COMO NUMA CONTRADIÇÃO, JAMAIS EXISTEM. NIETZSCHE DEVIA AMAR DEUS DEMAIS, POR ISSO NÃO ACEITAVA COMO ELE ( DEUS) ERA EXPOSTO ASSIM, COMO UMA OBVIEDADE SEM TER NADA DE DIVINO!
ABRAÇO FORTE!
ADRIANO NUNES, MACEIÓ/AL.
(rs, rs) sensacional, cicero!
ResponderExcluiro frederico é demais! me encanta, muitas vezes, como o álvaro de campos na poesia. ambos de uma lucidez incrível para com o tema em questão. e gosto desse tipo de 'esnobismo intelectual', dessa certa 'arrogância intelectual' que o autor deixa passar (não sei se intencional) ao tratar o assunto. acho tal arrogância saborosa, estimulante (rs). até porque, segundo o próprio nietzsche, e eu concordo com ele, não há arrogância maior do que a de termos criado um deus, à nossa imagem e semelhança(!), para forjarmos uma imortalidade que desaceita a nossa precária condição de seres mortais, que putrefazem, seres que ocasionalmente nasceram do pó e que, ao fim, regressam a ele.
muito bom texto, poeta porreta!
beijo grande, querido!
Nietzsche é sim um pensador infantil, pra mim... mas isso não é desvantagem! É uma de suas qualidades. Sua iconoclastia, sua rebeldia de poeta, que embora se intitule filósofo, prefere causar um efeito a ser claro, prefere chocar a ponderar, esse é o Nietzsche que eu vejo. O caso é que os mistérios do universo não se dissipam com as descrenças do filósofo, e a maioria dos ataques a Deus são ataques a nossos conceitos de Deus, a nossas instituições de Deus. O mistério permanece... e ser ateu pode ser uma forma de ser honesto, e generoso. Uma forma de humildade, perante à grandeza do universo.
ResponderExcluirPrezado Antonio Cícero,
ResponderExcluirAcho que a religião é uma construção humana que aspira a racionalidade. Mas sua base é o credo na existência do divino - um credo que não é racional.
Deus é a fé em deus.
Algumas pessoas parece que nascem com uma certa propensão à fé, e outras não. Por isso, concordo quando ele diz de um ateismo "que se dá por instinto".
JR.
Antonio,
ResponderExcluirCostumo oscilar entre o ateísmo e um, digamos, agnosticismo poético.
Acho que os deuses enquanto criações para além da matéria, para além da vida - assim como a arte - são belos e bons.
Mas o Deus que se impõe sobre a realidade e a pretende limitar, sufocando o pensamento - esse é expressão da barbárie.
Nietzsche disse, não me lembro bem onde, que o que há de divino é justamente o haver deuses, no plural, e quando se tenta reduzi-los a um único ser conseguimos apenas destrui-los.
um abraço,
lucas
observador,
ResponderExcluirlendo o "Ecce homo" lembrei da letra irretocável da canção "Jesus" do sensacional pedro luis e aquela parede fabulosa:
"...Vamos tirar Jesus da cruz
Nós vamos tirar Jesus da cruz
porque o rapaz está pregado
naqueles pedaços de pau
há mais de dois mil anos
Vamos deixar ele com os pés
e as mãos livres
que ele vai pular, dançar
virar cambalhota
e fazer muito melhor...."
grande abraço!
A caminhada é árdua.
ResponderExcluirA vida é sacrifício.
Quem atravessa o tempo?
Quem compreende o que ele diz?
A beleza está na luta.
O importante é resistir.
De Deus, não me deram um retrato falado.
ResponderExcluirÀs vezes me parece estar acima, às vezes ao meu lado
Tal como a música, está onde o homem estiver sendo ao mesmo tempo ubíquo e supérfluo.
Fluindo sobre a superfície de tudo é intangível à minha mão.
Invisível ao meu olhar, também parece estar às minhas costas.
Calado, não me dá respostas
Não pode ser uma resposta
Só pode ser conclusão.
Parabéns pelo Blog; visito sempre.
Manellis
que beleza a resposta do Lucas. EStou com ele quanto à beleza dos deuses...e também me sinto assim, meio agnóstica poética.
ResponderExcluirbeijo!
Deus parece ser o defeito mais sérios das religiões. Nietzsche dizia que só criticava o que gostava. E criticava a religião. E era ateu e se autodeclarava nilista e imoralista. Não podia acreditar num deus que não tivesse passos leves e não soubesse dançar.
ResponderExcluirEsta passagem que cita foi para mim também muito marcante. tem outra, entre tantas, que gosto muito. é quando ele diz: "talvez tenha eu mesmo inveja de Stendhal? ele me roubou a melhor piada ateísta que justamente eu poderia ter feito: " A única desculpa de Deus é não existir"...Eu mesmo dsse em algum lugar: qual foi até agora a maior objeçãoà existência: Deus".
ResponderExcluirO bigodudo é arrebatador. ando apaixonada, sem vontade de fazer outra coisa senão lê-lo - me preparando para o zaratrusta, que Paulo está traduzindo, e eu esperando ansiosa... e claro só me serve com tradução de PCS, penso - que bom que paulo existe ou teria que aprender alemão! pq paulo dá a tranquilidade de não precisar aprender alemão e ficar feliz mesmo assim. É ao mesmo tempo profundo e óbvio, pq diferente disto seria aceitar quieto (sem inquietação) o tolhimento do real, do natural, do institivo...