29.12.09

Hans Magnus Enzensberger: "Unter der Hirnschale" / "Debaixo do crânio": tradução de Samuel Titan




Debaixo do crânio

Isso que não pára, pulsa
e dispara, isso sou eu?
Mas como? É só
a massa cinzenta de dentro.
Ela me observa,
eu a observo.
Um surpreende o outro.
Nem sempre meu cérebro faz
o que eu quero. Mal-entendidos,
conflitos não faltam.
Quando cai a noite,
eu tento, simplesmente,
desligá-lo. Em vão.
Ele segue a trabalhar, a produzir,
invenções de própria lavra,
e delas nada sei,
por elas mal respondo.
Volta e meia, sem consulta-lo,
eu também faço das minhas.
E só muito tarde paramos
de espreitar um ao outro
e deixamos estar.
Então se faz, por fim, a paz.


Unter der Hirnschale

Was da unaufhörlich tickt
und feuert, das soll ich sein?
Woher denn. Es ist nur
diese graue Masse da drinnen.
Sie beobachtet mich,
ich beobachte sie.
Wir überraschen einander.
Nicht immer macht mein Gehirn,
was ich will. Mißverständnisse,
Kräche bleiben nicht aus.
Wenn es dunkel wird,
versuche ich, es ganz einfach
abzuschalten. Vergebens.
Es arbeitet weiter, erzeugt
Erfindungen, auf eigene Faust,
von denen ich nichts weiß,
für die ich nicht hafte.
Oft, ohne es zu fragen,
denke ich mir mein Teil.
Nur ganz zuletzt hören wir auf,
einander zu belauern,
und lassen es gut sein.
Dann herrscht endlich Ruhe.



ENZENSBERGER, Hans Magnus. Rebus: Gedichte. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 2009

Tradução: TITAN, Samuel

9 comentários:

  1. design inteligente
    não é traço dado nem etéreo
    é coisa da cabeça da gente
    que vive do acaso diário,
    que não cabe em si por diferente,
    a cada momento precário
    em que não se sabe o que se sente.

    grande abraço e um 2010 dez pra vc, cícero, e pra todos que pululam por aqui.

    ResponderExcluir
  2. Obrigado, Fred.

    Um ótimo 2010 para você também.

    Abraço

    ResponderExcluir
  3. sossego é descer descer ao que sente incessante - sem vigias
    - esses soldados "cinzentos"
    do cansaço.


    Obrigado pelo texto. Adorei a leitura, Cícero!

    Tudo de bom!


    Abraços.

    ResponderExcluir
  4. Cicero,


    Adorei! Imagens lindas!... ai ai ai o nosso cérebro! ( e o da Poesia então?)

    Grande abraço,
    Adriano Nunes.

    ResponderExcluir
  5. Cicero,

    um poema:

    "Sob a mira de Tétis. Enfim,"


    Naquele dia, fui convidado
    Às pressas. Era uma grande festa
    No pensamento. Agora me resta
    Apenas o tempo consumado

    Entre a vontade e tal devaneio.
    Quanta algaravia! Que alegria!
    O por vir quem imaginaria?
    Ó, por Zeus! De viés, Éris veio

    E lançou-se, em segredo, à babel.
    Penetra, esquecida, nem aí,
    Com presente: Dourado caqui,
    Para a deusa mais bela e fiel.

    Aquele pomo era para mim,
    Refleti. Todos em um só flerte:
    É meu! Sim, sou eu! Disse Deméter
    Sob a mira de Tétis. Enfim,

    Olho por olho, dente por dente.
    Afrodite cobiça com graça
    A peça rara. Até Hera laça
    À vista o tesouro reluzente.

    Combina com a tez de Atená,
    Alguns disseram. Eu quero! Quero
    Essa jóia! Juraram por Eros,
    Enquanto ela irradiava lá.

    Bradava Zeus: Onde estará Hermes
    Nessas horas? Que é que irei fazer
    Se nada posso? Dê-me o prazer
    Da presença de Páris! - Que queres,

    Santo Deus, está já entre nós
    A decidir o destino de todos
    Os mortais! - Como fomos tão tolos,
    Furtaram-nos, até nossa voz!


    Grande abraço,
    Adriano Nunes.

    ResponderExcluir
  6. Uso doméstico

    Mandril
    Interruptor
    Botão de trava do interruptor
    Aberturas de ventilação
    Etiquetas autoadesivas
    Alavanca de reversão
    Limitador de velocidade
    Empunhadura lateral com giro de 360º
    Guia de profundidade
    Empunhadura auxiliar
    Uso exclusivamente doméstico.

    espero um 2010 dez pra galera, um beijo prá vc Cícero, mestre, criador desse espaço virtual e tão legal.

    ResponderExcluir
  7. Obrigado, Alcione.
    Feliz 2010 para você!

    Beijo

    ResponderExcluir
  8. Invenção de própria lavra (e dela nada sei):

    Todo ano é assim: começa comigo e termina sem mim.

    ***

    Grato pelo poema, Cicero!

    ***

    A todos que frequentam o Jardim Ciceroniano - e especialmente ao anfitrião - um belíssimo ano novo.

    Aeta

    ResponderExcluir
  9. Eu amo o tradutor desse texto. rs Um cara foda.

    ResponderExcluir