28.10.09

Carlos Drummond de Andrade: "Carta"




Carta


Há muito tempo, sim, que não te escrevo.
Ficaram velhas todas as notícias.
Eu mesmo envelheci: Olha, em relevo,
estes sinais em mim, não das carícias

(tão leves) que fazias no meu rosto:
são golpes, são espinhos, são lembranças
da vida a teu menino, que ao sol-posto
perde a sabedoria das crianças.

A falta que me fazes não é tanto
à hora de dormir, quando dizias
“Deus te abençoe”, e a noite abria em sonho.

É quando, ao despertar, revejo a um canto
a noite acumulada de meus dias,
e sinto que estou vivo, e que não sonho.




ANDRADE, Carlos Drummond de. "Claro enigma". Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002

5 comentários:

  1. Querido Cicero,

    fiquei muito emocionado com esse poema. Lembro do meu pai e de tudo o que gostaria de dizer a ele, em meio à confusão dos meus dias.

    Obrigado pelo belo post.

    ;*

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Antonio,


    Lindo demais.Salve Drummond!


    Um soneto...

    "Existem extraterrestres"




    Existem extraterrestres.
    De madrugada, do teto
    Da minha casa, projeto
    Um jeito de vê-los: (Três

    Horas esperando por ti)
    Conto todas as estrelas!
    Eu sei que posso retê-las
    No poema, mas sem ti

    Tudo volta para o espaço
    Trancado do quarto. O céu
    É, claro, onde tudo caço,

    Um gigantesco escarcéu:
    Nó de gravata, esse laço
    Que minha vida me deu!


    Beijos,
    Cecile.

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  4. Esse poema é mesmo emocionante! Evoca tantas lembranças boas...

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