28.1.09

César Vallejo: "Piedra negra sobre una piedra blanca" / "Pedra negra sobre uma pedra branca". Tradução de José Bento

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Pedra negra sobre uma pedra branca

Morrerei em Paris com aguaceiros,
num dia do qual já tenho a lembrança.
Morrerei em Paris – daqui não saio –
numa quinta-feira, como hoje, de outono.

Quinta-feira será, pois hoje, quinta-feira,
em que estes versos proso, dei os úmeros
à pouca sorte, e nunca como hoje
voltei, com todo o meu caminho, a ver-me só.

Morreu César Vallejo, espancavam-no
todos sem que lhes fizesse nada;
davam-lhe forte com um pau e forte

com uma corda também; são testemunhos
as quintas-feiras e os ossos úmeros,
a solidão, os caminhos, a chuva...



Piedra negra sobre una piedra blanca

Me moriré en París con aguacero,
un día del cual tengo ya el recuerdo.
Me moriré en París —y no me corro—
tal vez un jueves, como es hoy, de otoño.

Jueves será, porque hoy, jueves, que proso
estos versos, los húmeros me he puesto
a la mala y, jamás como hoy, me he vuelto,
con todo mi camino, a verme solo.

César Vallejo ha muerto, le pegaban
todos sin que él les haga nada;
le daban duro con un palo y duro

también con una soga; son testigos
los días jueves y los huesos húmeros,
la soledad, la lluvia, los caminos...



De:
VALLEJO, César. “Poemas póstumos I”. In: Obra poética. Org. p. Américo Ferrari. Madrid; Paris; México; Buenos Aires; São Paulo; Rio de Janeiro; Lima: AllcaXX, 1996;

e:

VALLEJO, César. Antologia poética. Tradução de José Bento. Lisboa: Relógio D’Água, 1992.

10 comentários:

  1. CICERO,

    BOA NOITE! O POEMA É LINDO, TENSO, DRAMÁTICO. NÃO CONHECIA O AUTOR - BELA POSTAGEM!

    "ABRAÇO" (Para o meu amigo, o poeta Romério Rômulo)


    Escápulas clavículas
    Úmeros ulnas rádios


    (aos poucos,
    faz-se o abraço)


    Trapézios escafóides
    Semilunar falanges


    (um corpo
    noutro corpo)


    Piramidal hamato
    Trapezóide captato


    (e quase
    tão colados)


    Pisiforme antebraços
    Mãos braços metacarpos


    (abra -
    os(ços)
    poéticos)




    Adriano Nunes.

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  2. Antonio,

    Essa sua postagem é de uma expressão contagiante, repleta de sentidos e de enigmas poéticos.

    ***SONETO DE AMOR***


    Bem, meu bem, eu nem acredito
    Que foram poemas de amor
    Apenas. Ó, meu bem, passou
    O tempo sem deixar vestígios,

    Sem tempestades, em silêncio.
    Não sei, mas sinto que mudei
    Toda a minha vida. Não dei
    Mais à mínima... Vou vivendo

    Cada tormento da paixão,
    Cada momento de loucura.
    Nada parece ser em vão

    E tudo dessa dor me cura.
    Meu bem, até meu coração
    Sabe beber cicuta pura!



    Beijos,
    Cecile.

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  3. observador,


    alguns poetas conseguem dar um intenso maior para as palavras que escolhem...

    belíssimo!

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  4. Belíssimo poema! Logo dá para imaginar o poeta índio a fitar, através de uma vidraça embaçada por uma chuva interminável, os telhados cinzentos de Paris. Aliás, no outuno a Cidade das Luzes produz exatamente essa impressão meio triste descrita por Vallejo.

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  5. Forte. O tema da própria morte nos pega, derruba, faz refletir ao tentarmos levantar do tombo e levitar do tema. Não há como fugir. Ainda mais tão bem escrito.

    "Se meu mundo cair, eu que aprenda a levantar" - Maysa.

    "Se meu mundo cair, eu que aprenda a levitar" - José Miguel Wisnik.

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  6. CICERO,

    Mais um poema novo!


    "DENTRO DE NÓS DOIS"


    Salto do meu ser
    Feito o Sol, do céu.

    Solto-me assim, só,
    E sorvo você

    Para que me sinta,
    Para que me veja

    Ser como não sou
    E apenas ser seu,

    Aqui, no poema.
    Sem pensar em mim,

    Dissolvo-me agora,
    Feito sal no mar,

    Em você. Pra sempre,
    Dentro de nós dois,

    Resolvo ficar
    Preso, feito espectro.


    Abraços,
    Adriano Nunes.

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  7. Parabéns Antonio Cicero.

    Mais que merecido.

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  8. Cicero,

    Que maravilha! Você merece! Parabéns! Cultura com classe e liberdade de expressão! Viva o Acontecimentos!


    Adriano Nunes.

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  9. Agradeço ao VejaBlog e, em particular, ao Dário Dutra.
    Obrigado também ao Pax e ao Adriano.
    Abraços

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  10. Querido Poeta!

    Ao ler Vallejo

    Toco "pedra negra
    sobre uma pedra branca"
    recorto meu tempo de um espaço

    Imagino ladrilhos em meu trajeto
    confundo as sombras

    Jogando com a vida
    misturo cimentos com sonho
    calço outro tabuleiro

    Aquela casa
    e almas loucas
    não seria eu me acordando
    na infinita chuva de Cesar Vallejo?

    Abraços e parabéns pelo blogue.
    Carmen Silvia Presotto
    www.vidraguas.com.br

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