15.8.18

Antonio Cicero: Editorial da Revista UBC



No corrente mês, tive a honra de escrever o editorial da Revista UBC, que é a revista publicada pela União Brasileira de Compositores, da qual me orgulho de ser membro há muitos anos e um dos diretores, há um ano e alguns meses. Eis o texto que produzi:



Mesmo após a concessão do Prêmio Nobel de Literatura a Bob Dylan, ainda há quem considere que as letras de música são algo relativamente vulgar e inferior à poesia.

Um argumento frequentemente empregado para tentar provar essa tese é que, às vezes, uma letra emociona quando cantada e, quando lida no papel, sem acompanhamento musical, torna-se insípida. É verdade, mas vejamos por que razão isso se dá. Ao contrário de um poema – que tem seu fim em si próprio – uma letra de canção não tem, enquanto tal, seu fim em si própria, mas na obra de arte, isto é, na canção, de que faz parte. Por isso, para que julguemos boa uma letra de canção, é necessário e suficiente que ela contribua para que a obra lítero-musical de que faz parte seja boa. E, embora seja verdade que uma canção não seja um poema, há canções que são obras de arte tão boas quanto bons poemas. Pense-se, entre inúmeras outras, em “Construção”, de Chico Buarque, em “Terra”, de Caetano Veloso, em “Cais”, de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos ou em “Blowin’ in the Wind”, de Bob Dylan.

De todo modo, há muitas letras de canções que, quando lidas, revelam-se também como grandes poemas. É o caso, na verdade, das quatro letras de canções que acabamos de citar. Ademais, não nos esqueçamos de que os poemas líricos da Grécia antiga, por exemplo, eram letras de canções. Perderam-se as músicas que os acompanhavam, de modo que não os conhecemos senão na forma escrita. Ora, muitos deles são contados entre os maiores poemas que se conhecem.


Vê-se assim como são inteiramente ridículos os preconceitos que pretendem desvalorizar as letras de música. 







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