23.7.14

Cecília Meireles: "Retrato"





Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida
a minha face?



MEIRELES, Cecilia. "Viagem". In:_____. Obra poética. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1967.

6 comentários:

  1. "A dor que dura sempre produz o prazer que não dura mais que um momento" (António Nobre).

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  2. O caminho da presença parece uma dor a ligar essa existencia inesperada a tudo que nunca mais e a tudo que ainda for.

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  3. Quando olho para ti
    e a sensação de imensidão
    Reconheço
    Desde o começo
    A sensação de solidão
    Desejo
    Quando olho para mim
    e nada vejo
    E só encontro o que não vejo
    Quero olhar
    Desesperadamente
    Para lá do mar
    De bolhas e conchinhas
    Navegando em teu olhar.

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  4. Arsenio Meira

    Eis, talvez, (ao lado do poema "Motivo'), um dos mais belos e consagrados poemas da nossa diáfana e imensa Cecilia Meireles.

    Desta Poeta imensa, com a permissão do editor, ranscrevo para este blog belo, cheio de vida e debate, o seguinte poema:

    Explicação

    O pensamento é triste; o amor, insuficiente;
    e eu quero sempre mais do que vem nos milagres.
    Deixo que a terra me sustente:
    guardo o resto para mais tarde.

    Deus não fala comigo - e eu sei que me conhece.
    A antigos ventos dei as lágrimas que tinha.
    A estrela sobe, a estrela desce...
    - espero a minha própria vinda.

    (Navego pela memória
    sem margens.

    Alguém conta a minha história
    E alguém mata os personagens.)

    Cecilia Meireles
    (1901 - 1964)

    (In "Cecília Meireles: Poesia Completa. 2 Volumes. de Cecília Meireles. Edição/reimpressão: 2001. Páginas: 1993. Editora Nova Fronteira.)

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  5. Cicero,

    belo poema! Grato por compartilhá-lo!

    Abraço forte,
    Adriano Nunes

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  6. Cecília Meireles sabia do que falava... Há momentos na nossa vida que já nem o espelho conhece o nosso rosto...Alguém estranho se apropriou
    de tudo o que era nosso - chama-se ...tempo!!
    Beijo
    Graça

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