19.6.10

Eugénio de Andrade: "Vegetal e só"

Agradeço ao pintor Gonçalo Ivo por me ter lembrado o seguinte poema de Eugénio de Andrade:



Vegetal e só


É outono, desprende-te de mim.

Solta-me os cabelos, potros indomáveis
sem nenhuma melancolia,
sem encontros marcados,
sem cartas a responder.

Deixa-me o braço direito,
o mais ardente dos meus braços,
o mais azul,
o mais feito para voar.

Devolve-me o rosto de um verão
Sem a febre de tantos lábios,
Sem nenhum rumor de lágrimas
Nas pálpebras acesas

Deixa-me só, vegetal e só,
correndo como rio de folhas
para a noite onde a mais bela aventura
se escreve exactamente sem nenhuma letra.



ANDRADE, Eugénio. As palavras interditas. Porto: Limiar, 1983 (8ª ed.).

6 comentários:

  1. Cicero,


    Belo!


    Abraço forte!
    Adriano Nunes.

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  2. Antonio,


    Belo poema! Eugênio é um grande poeta!

    Um poema meu:

    "traição"


    miríade
    de cheiros,
    olhares,
    silêncios,
    mentiras,
    desculpas...

    ai, verso,
    retornes,
    perdoo-me!


    Beijos,
    Cecile.

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  3. Belíssimo, Cicero!!

    "Hoje roubei todas as rosas dos jardins
    e cheguei ao pé de ti de mãos vazias."

    Eugénio de Andrade

    Beijo,
    Ane

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  4. Cicero,
    deixo-te a

    Arte de Navegar

    e um grande abraço,
    F.


    ARTE DE NAVEGAR

    Vê como o verão
    subitamente
    se faz água no teu peito,

    e a noite se faz barco,

    e minha mão marinheiro.



    Eugénio de Andrade in Antologia Breve, 1999 (7a. ed.), Fundação Eugénio de Andrade

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  5. Gosto de versos que seguem, caminham sem restrições e natural. Essa força está no poema de Eugénio. Grande momento do poeta: sentir-se "vegetal e só". Lindo demais!
    Abraços.

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  6. Cor

    Caminho entre
    A cor
    Em seus sete sentidos
    Cada uma com seu valor
    Enquanto a lua fina trafega
    No imenso céu, azul,
    Verde, amarelo
    Um colorido inusitado
    Baseado
    Na compreensão
    Do que não nega
    Seu amor.

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