23.10.09

Fernando Pessoa / Ricardo Reis: "Não consentem os deuses mais que a vida"




Não consentem os deuses mais que a vida

Não consentem os deuses mais que a vida.
Tudo pois refusemos, que nos alce
          A irrespiráveis píncaros,
          Perenes sem ter flores.
Só de aceitar tenhamos a ciência,
E, enquanto bate o sangue em nossas fontes,
          Nem se engelha connosco
          O mesmo amor, duremos,
Como vidros, às luzes transparentes
E deixando escorrer a chuva triste,
          Só mornos ao sol quente,
          E reflectindo um pouco.



PESSOA, Fernando. "Odes de Ricardo Reis". Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1986.

7 comentários:

  1. Cicero,


    Pessoa... O que dizer? Muito grato pela postagem! Estava com saudades de vê-lo aqui...Ai como foi bom quando você estava em Portugal no Congresso sobre Pessoa em que quase todos os dias postava poemas do Cancioneiro. Valeu, meu grande amigo! Pessoa é sempre uma aula de Poesia!


    Grande abraço,
    Adriano Nunes.

    ResponderExcluir
  2. A edição Aguilar é aquela pela qual entrei em Pessoa -ainda a tenho na sua 1ªedição, de 1960, salvo erro.E por ela continuo a ler Pessoa...

    ResponderExcluir
  3. Dama da noite

    Despido de coragem, alma inerme,
    Sopro feroz, espanto na epiderme-
    Na noite o pesadelo assombra o corpo...
    No corpo (perco-me na noite) um verme...
    Nenhuma fuga... mas o quê? quer? quer-me...
    Seu nome meço - de medo me entorpo
    Esse espectro que habita (encaro, encorpo) -
    Desacelero a minha mente, o corpo
    Em seguida também cede... retorna...
    A vida envolta nos redemoinhos
    Lá fora. Cá em minhalma o fogo aceso
    Do medo. Tal visagem é que adorna
    Meus pesadelos. São doidos moinhos
    De meu castelo. A luz a(s)cendo e rezo...

    ResponderExcluir
  4. como diria Diogenes, o cínico: Só mornos ao sol quente, e reflectindo um pouco.

    te vi na tv aqui em minas, antonio, vc estava tão plácido.

    ResponderExcluir
  5. Ter a vida - a transparência de vivê-la sem "irrespiráveis píncaros".

    Lindo poema!

    "Não consentem os deuses mais que a vida" - impressionam a clareza e e a beleza deste verso.

    Obrigado!
    Jefferson.

    ResponderExcluir
  6. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir