O seguinte artigo foi publicado na Folha de São Paulo no dia 20 de maio:
Alerta para um grande equívoco
FERNANDO GABEIRA
COLUNISTA DA FOLHA
DE UM LADO , um intelectual brasileiro que já dirige o organismo e conta com a promessa de apoio de 20 países; de outro lado, um ministro da Cultura do Egito, Farouk Hosny, que prometeu queimar livros em hebraico.
Em jogo, a direção da Unesco, órgão voltado à cultura, ao diálogo e à tolerância. O governo brasileiro decidiu apoiar a candidatura do egípcio, contra todas as advertências.
O chanceler Celso Amorim argumenta que é uma decisão baseada na geopolítica, um desejo de aproximação com o bloco árabe e africano.
É razoável que o governo desconfie de alguém da oposição que procure evitar seus erros. Mas nesse caso específico, a ideia é apenas evitar descaminho em nossa política externa, comprometendo a reputação brasileira. Uma política externa deve ser pactuada e confirmada nas eleições. Esta inflexão brasileira, ora convidando ao país o presidente do Irã, que nega o Holocausto, ora apoiando um ministro egípcio que admite queimar os livros em hebraico, quebra a linha tradicional de nossa política.
Não se trata apenas do confronto entre o brasileiro e o egípcio. Trata-se do confronto entre um brasileiro, Márcio Barbosa, que reformou a Unesco, comandou três convenções internacionais e é admirado por países ricos e pobres, e um homem que é, há 20 anos, ministro da Cultura em seu país e tem oposição até entre os egípcios, que fazem campanha na internet contra sua candidatura.
O governo tem inúmeras formas de corrigir sua decisão.
Mas caso não o faça, é razoável que surja no Brasil um movimento pela candidatura de Márcio Barbosa. Se o país oficial distancia-se de sua política, o caminho é reconduzi-lo pela pressão social.
Reconheço que o tema desperta interesse limitado, mobilizando, no momento, alguns círculos culturais e a comunidade judaica. O espaço não permite um debate específico sobre o conceito de geopolítica, suas limitações e virtudes. Não há geopolítica que justifique um erro dessa dimensão. Ao invés de fortalecer a Unesco, através de um brasileiro que a engrandeceu nos últimos anos, o Brasil escolheu o caminho mais difícil que não só atinge Israel mas também os países que apoiam Márcio Barbosa. É um caminho que afastará os Estados Unidos da instituição, estimulando a tendência de não cooperar com a Unesco.
O presidente Lula foi um dos primeiros signatários de um movimento internacional, a partir da ONU, contra a intolerância. Seu governo orgulha-se de apoiar minorias. O ministro egípcio Farouk Hosny está em visita ao Brasil para um congresso internacional. Dentro das limitações, uma vez que o tema não é popular, não tenho outro caminho a não ser mostrar a ele que uma parte do Parlamento brasileiro não concorda com a posição oficial. A candidatura de um brasileiro não é melhor porque nasceu aqui: é melhor porque conhece todos os meandros da Unesco e, através de competência, conseguiu a simpatia de muitos países. E, finalmente, porque jamais admitiria a queima de livros em hebraico ou mesmo a queima de livros em qualquer outro idioma.
Como foi posto, não há o que se discutir. Um brasileiro, por que não?!
ResponderExcluirUma pena que o tema não seja discutido de forma mais ampla. Muito fraca a explicação do Itamaraty, não justifica minimamente... Concordo com a necessidade de uma pressão popular...
ResponderExcluirCreio que a expressão "os fins justificam os meios" chega para nós, brasileiros, apoiada nos caudilhos e salvadores da pátria de plantão. Chefes de Estado tão amados que recebiam uma espécie de cheque em branco da população. Faziam o que bem entendiam. Se algo que fizessem fosse moralmente equivocado ou incongruente, não havia problema, pois eles "sabiam" o que estavam fazendo. Chega disso. Esse caso é só um, dentre milhares.
ResponderExcluirParece que há mais alguma coisa por aí, pois essa justificativa de geopolítica não colou, não mesmo...
ResponderExcluirPalmas para Gabeira!
O governo de Israel apoia a candidatura do egípcio Farouk Hosni à diretoria-geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). O primeiro ministro israelense, Benjamim Netanyahu, retirou o veto ao nome de Hosni, após encontro com o presidente do Egito, Hosni Mubarak. A informação foi publicada nesta terça-feira (26) na coluna “Panorama Político”, do jornal O Globo.
ResponderExcluir----> os argumentos do Gabeira viraram poeira.
gabeira arrebentou!!
ResponderExcluirconcordo em gênero, número e grau.
apoiar um homem, ministro da cultura há 20 anos no seu país, que enfrenta oposição dentro do próprio território e que pretende queimar livros é um contrasenso.
beijo grande, poetósofo de primeira!
"É um caminho que afastará os Estados Unidos da instituição, estimulando a tendência de não cooperar com a Unesco". Exatamente o que está acontecendo agora.
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