DIVINA COMÉDIA
Erguendo os braços para o Céu distante
E apostrofando os deuses invisíveis,
Os homens clamam: - «Deuses impassíveis,
A quem serve o destino triunfante,
Porque é que nos criastes?! Incessante
Corre o tempo e só gera, inextinguíveis,
Dor, pecado, ilusão, lutas horríveis,
Num turbilhão cruel e delirante...
Pois não era melhor na paz clemente
Do nada e do que ainda não existe,
Ter ficado a dormir eternamente?
Porque é que para a dor nos evocastes?»
Mas os deuses, com voz inda mais triste,
Dizem: - «Homens! porque é que nos criastes?!»
QUENTAL, Antero de. Sonetos. Lisboa: Sá da Costa, 1962, p.176.
que lindo poema, cicero!
ResponderExcluiré aquela tal estória: será que somos feitos à imagem e semelhança de/dos deus/deuses ou o contrário?
o foda é que, ainda por cima, usamos os deuses como bodes espiatórios, coitados, por serem responsáveis por nossa existência e, portanto, culpados, em parte, pelas atrocidades por nós cometidas. que sacanagem com os caras (rs)...
arrebentou!
beijo, bonito!
estranho tempo
ResponderExcluirque percorro a cada dia
transcendendo, remoendo
no beiral das portas
tempo arguto, irônico
esconderijo da lembrança, pai do esquecimento
estrada sinuosa que conduz à morte
inexorável fim de toda a carne
tábula rasa de poetas e comerciantes
rebeldes e medrosos
conformistas e revolucionários
amantes indeléveis e homens secos, sem paixão
solitários
diamantes à mercê dos dias, das horas,
que atravessas
sem disfarces, implacável
como abismo interminável
precipício, foice e fim
Que ironia trágica: pedindo ajuda a um ser supremo, o poeta descobre, no lugar dele, um buraco de Sartre! Pode ter sido um dos dilemas irresolúveis que o levaram, no fim das contas, ao suicídio... Não é, porém, um exemplo do pensamento cético nem, muito menos, ateu, mas sim o drama de um intelectual que, por um lado, não aceita "cette création où les enfants sont torturés", nem chega, por outro, a "être le médecin", descrito de forma meio paradoxal.
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