5.2.07

Robert Frost

Por ocasião da publicação dos cadernos de Robert Frost (FAGGEN, R. (Org.) The notebooks of Robert Frost. Cambridge, Mass: Harvard University Press, 2007), saíu ontem no New York Times um artigo muito interessante de David Orr sobre Frost. Vale a pena traduzir e citar um trecho dele:

"Frost disse uma vez que queria ser considerado como 'a exceção que creio ser em tudo'.
"O problema de ser uma exceção a toda categoria é que você acaba frustrando os categorizadores.
"Consequentemente, Frost agora ocupa uma posição tão singular quanto instável. Ele é decididamente um Grande Poeta Americano e, no entanto, nunca foi adotado pela academia americana tão ardentemente quanto, digamos, Ezra Pound.
"Na verdade, Frost talvez seja o único poeta que é universalmente reconhecido como um mestre, mas que parece periodicamente precisar que ensaios de poetas como Randall Jarrell e Seamus Heaney lustrem a sua reputação.
"Técnico de agilidade prodigiosa...

[permito-me interromper porque não posso deixar de lembrar aqui uma citação de Pound feita por Augusto de Campos em sua recente e excelente entrevista a Carlos Adriano, na revista virtual Trópico (http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/2822,1.shl): "A técnica é o teste da sinceridade".]

..., ele no entanto geralmente se confinou aos iâmbicos, e favoreceu rimas fáceis como 'reason' e 'season' ou 'star' e 'far'.
"E há o problema da sua reputação. Ao contrário de quase todo poeta de habilidade comparável, Frost possui uma audiência de leitores leigos, principalmente daqueles que querem poemas que 'tenham sentido' – no entanto sua estética é evasiva, talvez manipulativa, e tem no âmago uma indiferença gelada que tornaria o churrasco da vizinhança terrivelmente desconfortável.
"Ainda assim, como o crítico Richard Poirier sustenta, 'não faz sentido tentar desconsiderar a sua popularidade, como se fosse um equívoco ocasionado pela pose'. É fácil entender como um poeta tão contraditório possa sofrer com os modos pouco sutis com que costumamos falar de coisas como o experimental e o convencional. Em tais argumentos, Frost será sempre, na melhor das hipóteses, simplificado e, na pior, ignorado."
Aqui pulo alguns parágrafos e volto ao texto de Orr:
"Esse é o problema (se for um problema). Se os diários de Frost contivessem um estudo de Walter Benjamin ou uma série de observações favoráveis e incisivas sobre 'Tender Buttons', de Gertrude Stein, provavelmente poderia ser encaixado a linhagem experimental americana. Se contivessem um comentário palpitantemente sensível sobre a flora da Nova Inglaterra, talvez pudesse ser considerado como confiavelmente convencional. Mas, mais de quatro décadas após a sua morte, esse mais americano dos poetas americanos ainda não cabe confortavelmente nas categorias estéticas favoritas do nosso país.
"Há indicações, contudo, de que isso está mudando. Poetas experimentais como Susan Wheeler começam a apreciar a ênfase de Frost em escrever-como-performance, e a tratá-lo como uma fonte valiosa e não como um antagonista ('Source Codes', de Wheeler, contém uma imitação muito engraçada do 'Provide, Provide', de Frost). Mais importante, Frost conseguiu obter o melhor conjunto de admiradores que um poeta americano pode ter: poetas não-americanos, principalmente poetas não-americanos que trabalham nas universidades americanas. Uma breve lista deles incluiria Joseph Brodsky, Derek Walcott, Glyn Maxwell, James Lasdun e praticmaent todo poeta da Irlanda do Norte nascido após 1935. Frost gostaria de saber que o Prêmio Pulitzer (que ele ganhou quatro vezes, um récorde) foi atribuído ao poeta irlandês Paul Muldoon, que declarou Frost 'o maior poeta americano do século 20'. Se esse é o modo tortuoso pelo qual a influência da poesia de Frost se fará sentir no seu solo nativo, bem, como Frost dizia, 'a linha terá mais charme por não ser mecanicamente reta'. E para um poeta que sempre foi uma figura de curvas e arcos, digressões e voltas, talvez não haja maior recompensa."

Fiz o curso secundário nos Estado Unidos e me lembro de que, embora gostasse muito de poesia, eu, de fato, não tinha interesse por Frost. Creio que era justamente a sua popularidade que me repugnava. Esquecendo-me de que Shakespeare havia sido popular no seu tempo, parecia-me que um poeta tão popular quanto Frost não poderia ser sutil ou profundo. Com o tempo, felizmente aprendi a me livrar desse tipo de preconceito. Mas foi só recentemente que, lendo algum poema de Frost citado, não me lembro mais por quem, fiquei impressionado com a sua qualidade e encomendei um livro (LATHEM, E.C. (Org.). The poetry of Robert Frost. New York: Holt, Rinehart and Winston, 1969) que reúne os seus poemas completos. Só então vi como tinha sido presunçoso e tolo: estava diante da obra de um dos maiores poetas do mundo.

Eu não saberia traduzir o poeta que disse que "a poesia é o que perde na tradução". Mas publico três curtas obras primas de Robert Frost, no original.


The Secret Sits

We dance round in a ring and suppose,
But the Secret sits in the middle and knows.


Nothing Gold Can Stay

Nature's first green is gold,
Her hardest hue to hold.
Her early leaf's a flower;
But only so an hour.
Then leaf subsides to leaf.
So Eden sank to grief,
So dawn goes down to day.
Nothing gold can stay.

Fire and Ice

Some say the world will end in fire,
Some say in ice.
From what I've tasted of desire
I hold with those who favor fire.
But if it had to perish twice,
I think I know enough of hate
To say that for destruction ice
Is also great
And would suffice.

7 comentários:

  1. O Segredo Assenta

    A gente dança numa roda e figura,
    Mas o Segredo assenta no meio e segura.

    – gringocarioca

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  2. Perdão, pracinha. é que eu ia escrever praça e foi mal.
    Desculpe

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  3. É o seguinte:
    A primeira vez que eu li um poema do Frost foi com meu filho numa pracinha no suburbio onde moro em Melbourne na Australia.Tem uma instalação onde o se lê em looping no letreiro vermelho Fire and Ice e mais uns outros três de outros autores.
    Foi bacana descobrir o poema, catando palavra por palavra, sentados na pracinha esperando o trem.

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  4. A ESTRADA SEM TRILHAR
    Robert Frost (versão de Salomão Sousa)

    As estradas se abriam no bosque amarelo
    e eu lamentava não seguir as duas,
    por ser um viajante só, demorei-me
    a olhar à distância por longo tempo
    a que sumia ao dobrar-se no matagal.

    Quando tomei a outra, igualmente bela,
    aos seus méritos a pedir desculpas;
    cobria-se de relva boa para andar;
    ainda que por ali passasse alguém
    ou outros mais que a tomassem na viagem.

    Naquela manhã elas se estendiam
    cheias de folhas sem pisada amarga.
    Ah! guardei a primeira para outro dia,
    ciente que uma estrada leva a outra
    duvidei se ali outra vez retornaria .

    Vou contando isso entre suspiros,
    em distante ano num lugar distante:
    duas estradas se bifurcavam, e eu —
    uma estava sem trilhar e esta eu tomei
    e foi o que fez toda a diferença.

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  5. Ainda a propósito do artigo sobre o Frost, envio o texto e uma tradução que ousei de um poema de Emily Dickinson, postados em meu blog. Veja se fazem algum sentido. Forte abraço.

    Pink, small, and punctual.
    Aromatic, low,
    Covert in April,
    Candid in May,

    Dear to the moss,
    Known by the knoll,
    Next to the robin,
    In every human soul,

    Bold little beauty,
    Bedecked with thee,
    Nature forswears
    Antiquity.

    (Emily Dickinson Complete poems,
    1924, Part Two: Nature)

    (A UMA SEMPRE-VIVA)

    Rósea, mínima, e pontual.
    Rasteira e aromática,
    Secreta em abril,
    Em maio desperta,

    Querida aos musgos
    Conhecida dos montes,
    Vizinha dos tordos
    Presente nas almas
    dos homens...

    Adornada de tua majestade,
    Oh, delicada beleza,
    A natureza renega
    A antiguidade.

    Livre tradução de Fernando Campanella
    (18/08/2009)

    * Poesia não se traduz, dizia uma mestra de Literatura Inglesa em meu curso de Letras. Fazia coro com o poeta Robert Frost que afirmava que afirmava que 'a poesia é o que se perde na tradução'.
    Há um tanto de verdade nisso. Rima, sonoridade, ritmo, cultura, vivências, memória linguística - são tão sutis e intrincados os liames entre língua e conteúdo no universo do poema que toda tradução passa a ser, no mínimo, temerária. Porém, como poderíamos sentir a grandeza de um poema do grego Constantinos Cavafis, por exemplo, senão pela tradução?

    O poema da Emily acima tanto me encantou que senti a necessidade de traduzir tal encanto, a sua atmosfera, para a nossa língua. Que me perdoe a mestra, o Frost, e a própria Emily, mas não resisti.

    Tomei a liberdade de colocar um título ( Emily jamais os colocava em seus poemas). Outros expedientes de que me utilizei foram mencionar 'Sempre-viva' quando li que ela se referia, no poema, a um 'Arbutus' (uma espécie de Sempre-Viva), assim como sacrificar a palavra 'bold' do original, que significa algo como 'audaciosa', 'corajosa', substituindo-a por 'majestade', que traz a idéia de coragem, destemor, facilitando, assim, a rima com antiguidade. Para uma melhor compreensão, traduzi, também, a palavra 'robin' por 'tordo', uma vez que aquele é uma espécie deste último e a palavra 'robin' não teria uma tradução para o português.

    Pode haver algo, ou muito, de mim na tradução do poema da Emily, isso é inevitável, afinal é um pouco do universo da poetisa visto através de meus olhos, de minha sensibilidade. Ademais, poetas só traduzem poetas com quem têm afinidade.

    Espero que a essência e a beleza de sua poesia estejam em minha tradução preservadas.

    Fernando Campanella

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  6. Gostei da tradução, Fernando. Parabéns.

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