13.10.12

Friedrich Nietzsche: "Morte"




89. Morte

Com a perspectiva segura da morte, uma deliciosa, odorosa gota de leviandade poderia ser mesclada a cada vida -- mas vocês, estranhas almas de farmacêutico, dela fizeram uma gota de veneno de mau sabor, com que toda a vida se torna repugnante!




NIETZSCHE, Friedrich. In:_____. 100 aforismos sobre o amor e a morte. Seleção e organização de Paulo César de Souza. São Paulo: Penguin / Companhia das Letras, 2012.

Um comentário:

  1. por que nós humanos vemos a morte como um adversário a ser batido...

    è como o viciado que desafio seu vício a cada dia sem saber (sabendo) que vai perder...

    Este poemo abaixo, você deve saber muito bem, é cheio de simbolismos e descreve a morte sem medo. Corajoso o cara, assim como Nietzsche.

    Romance sonâmbulo
    Federico Garcia Lorca

    (A Gloria Giner e a
    Fernando de los Rios)

    Verde que te quero verde.
    Verde vento. Verdes ramas.
    O barco vai sobre o mar
    e o cavalo na montanha.
    Com a sombra pela cintura
    ela sonha na varanda,
    verde carne, tranças verdes,
    com olhos de fria prata.
    Verde que te quero verde.
    Por sob a lua gitana,
    as coisas estão mirando-a
    e ela não pode mirá-las.

    Verde que te quero verde.
    Grandes estrelas de escarcha
    nascem com o peixe de sombra
    que rasga o caminho da alva.
    A figueira raspa o vento
    a lixá-lo com as ramas,
    e o monte, gato selvagem,
    eriça as piteiras ásperas.

    Mas quem virá? E por onde?...
    Ela fica na varanda,
    verde carne, tranças verdes,
    ela sonha na água amarga.
    — Compadre, dou meu cavalo
    em troca de sua casa,
    o arreio por seu espelho,
    a faca por sua manta.
    Compadre, venho sangrando
    desde as passagens de Cabra.
    — Se pudesse, meu mocinho,
    esse negócio eu fechava.
    No entanto eu já não sou eu,
    nem a casa é minha casa.
    — Compadre, quero morrer
    com decência, em minha cama.
    De ferro, se for possível,
    e com lençóis de cambraia.
    Não vês que enorme ferida
    vai de meu peito à garganta?
    — Trezentas rosas morenas
    traz tua camisa branca.
    Ressuma teu sangue e cheira
    em redor de tua faixa.
    No entanto eu já não sou eu,
    nem a casa é minha casa.
    — Que eu possa subir ao menos
    até às altas varandas.
    Que eu possa subir! que o possa
    até às verdes varandas.
    As balaustradas da lua
    por onde retumba a água.

    Já sobem os dois compadres
    até às altas varandas.
    Deixando um rastro de sangue.
    Deixando um rastro de lágrimas.
    Tremiam pelos telhados
    pequenos faróis de lata.
    Mil pandeiros de cristal
    feriam a madrugada.

    Verde que te quero verde,
    verde vento, verdes ramas.
    Os dois compadres subiram.
    O vasto vento deixava
    na boca um gosto esquisito
    de menta, fel e alfavaca.
    — Que é dela, compadre, dize-me
    que é de tua filha amarga?
    — Quantas vezes te esperou!
    Quantas vezes te esperara,
    rosto fresco, negras tranças,
    aqui na verde varanda!

    Sobre a face da cisterna
    balançava-se a gitana.
    Verde carne, tranças verdes,
    com olhos de fria prata.
    Ponta gelada de lua
    sustenta-a por cima da água.
    A noite se fez tão íntima
    como uma pequena praça.
    Lá fora, à porta, golpeando,
    guardas-civis na cachaça.
    Verde que te quero verde.
    Verde vento. Verdes ramas.
    O barco vai sobre o mar.
    E o cavalo na montanha.

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