17.11.10

Hokusai: "A onda"

7 comentários:

  1. Cícero,
    O texto é delicioso, como sempre.
    Mas, como eu gosto de gravura, chamaria a atenção também para a gravação, porque isso é uma xilogravura colorida feita com diversas impressões.
    Essas xilos não eram para reproduzir algo, mas para "captar a alma de coisas ou pessoas no papel". Assim, às vezes, um simples galho de bambu impresso numa folha de papel de arroz é intenso porque parece balançar ao vento.
    Essa que você postou é de uma série sobre o monte Fuji, que se vê bem ao fundo.
    Abraço,
    JR.

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  2. super aflitiva essa onda-mão de garras afiadas...

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  3. Oi Cícero,

    O poema abaixo, A Suposta Existência, é na minha opinião um dos mais lindos do mundo e penso que tem tudo a ver com as aulas de música e letra que você está dando no POP.
    Espero que você também goste.

    Um abraço,

    Eleonora




    A Suposta Existência

    de Carlos Drummond de Andrade

    Como é o lugar
    quando ninguém passa por ele?
    Existem as coisas
    sem ser vistas?

    O interior do apartamento desabitado,
    a pinça esquecida na gaveta,
    os eucaliptos à noite no caminho
    três vezes deserto,
    a formiga sob a terra no domingo,
    os mortos, um minuto
    depois de sepultados,
    nós, sozinhos
    no quarto sem espelho?

    Que fazem, que são
    as coisas não testadas como coisas,
    minerais não descobertos - e algum dia
    o serão?

    Estrela não pensada,
    palavra rascunhada no papel
    que nunca ninguém leu?
    Existe, existe o mundo
    apenas pelo olhar
    que o cria e lhe confere
    espacialidade?

    Concretitude das coisas: falácia
    de olho enganador, ouvido falso,
    mão que brinca de pegar o não
    e pegando-o concede-lhe
    a ilusão de forma
    e, ilusão maior, a de sentido?

    Ou tudo vige
    planturosamente, à revelia
    de nossa judicial inquirição
    e esta apenas existe consentida
    pelos elementos inquiridos?
    Será tudo talvez hipermercado
    de possíveis e impossíveis possibilíssimos
    que geram minha fantasia de consciência
    enquanto
    exercito a mentira de passear
    mas passeado sou pelo passeio,
    que é o sumo real, a divertir-se
    com esta bruma-sonho de sentir-me
    e fruir peripécias de passagem?

    Eis se delineia
    espantosa batalha
    entre o ser inventado
    e o mundo inventor.
    Sou ficção rebelada
    contra a mente Universal
    e tento construir-me
    de novo a cada instante, a cada cólica,
    na faina de traçar
    meu início só meu
    e distender um arco de vontade
    para cobrir todo o depósito
    de circunstantes coisas soberanas.

    A guerra sem mercê, indefinida
    prossegue,
    feita de negação, armas de dúvida,
    táticas a se voltarem contra mim,
    teima interrogante de saber
    se existe o inimigo, se existimos
    ou somos todos uma hipótese
    de luta
    ao sol do dia curto em que lutamos.

    De A Paixão Medida, 1980

    Carlos Drummond de Andrade

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  4. não sequele

    não entre na onda erradamanifeste-se ofenda o próximochute a cabeça dos imbecismetaforicamente alcançará a epifania suicida quer morrer?

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  5. TSUNAMI

    Hokusai espera pacientemente
    de sua desmedida cidade alucinada
    que sua profecia poética pintada
    sem excesso de cor se cumpra de repente

    contempla em lótus de haraquiri
    a divina montanha sem um pingo de neve
    que também aguarda o tudo azul que a leve
    enquanto sob ambos a turba nem aí

    e lá vem o dia a tremer de morte
    do pico do pagode enxerga quem salga
    crescendo e cobrindo o cume do monte

    chegando e ascendendo rumo à sua ilharga
    até que apenas o espírito do mestre
    soprasse por sobre a superfície dágua

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