19.12.07

Günther Anders: Lembrança de Heidegger. Março de 1984

Pessoalmente mal conheci Heidegger. Uma vez em Marburg – esquece-me como isso ocorreu – pernoitei na casa do casal Heidegger. A conversa correu bastante bem, após um jantar em que comemos massa. Então citei, sem inicialmente nomear o autor, o magnífico dito de Voltaire: “Não basta gritar: é importante, também, não ter razão”. Embora totalmente destituído de senso de humor, ele se divertiu. Quando, porém, expliquei que o dito era de Voltaire, primeiro ela – após o quê, também ele – ficou de cara amarrada. Mas a noite só se estragou completamente quando eu continuei, no tom mais inocente do mundo, dizendo que, naturalmente, era válido também o dito simétrico: “Não basta murmurar: é importante, também, ter razão”. Enquanto ela, naturalmente, não entendeu nada, ele por um momento me lançou um olhar cheio de ódio. Sentiu-se posto a nu. Pois era sua tática diária forçar, através de um murmúrio quase inaudível, um silêncio total na sala, para convencer os ouvintes de que tudo o que eles tinham conseguido ao menos acusticamente capturar tinha sido “desvelado”, logo, verdadeiro; não: tinha sido a verdade.


De: ANDERS, Günther. Über Heidegger. München: Beck, 2001, p.11.

5 comentários:

  1. Implicar é arte de sádicos.
    Sórdidos, sem compostura, implicam.

    Quem tem coragem, faz pior.

    Nós, que temos medo, replicamos.
    Levamos qualquer um ao seu limite.

    Enervar o próximo é nossa regra.

    Agüentar a implicância
    é coisa de quem ama.

    Amar é implicar por implicar.

    A implicância é uma charada.
    O implicante, uma esfinge.

    (E o implicado, um santo!)

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  2. ACicero,
    Desculpe-me a ignorância, mas não entendi o que Anders quis dizer sobre os Heideggers, sobretudo o final:
    por que você reproduziu esse trecho?
    Grato,
    edg

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  3. Caro Edson,

    Günther Anders foi marido de Hannah Arendt, que, como você sabe, era judia e foi amante de Heidegger, antes deste entrar para o Partido Nacional-Socialista. Se resta alguma dúvida sobre o grau dos comprometimentos nazistas de Heidegger, nunca houve nenhum em relação ao nazismo da sua mulher.
    A frase sarcástica de Voltaire foi apreciada por Heidegger, antes de saber que era de Voltaire, mas não depois, uma vez que ele tinha horror ao Iluminismo. Que dizer do que sua mulher devia pensar de Voltaire?

    Quanto ao final, é claro que Anders desmascarou uma técnica de Heidegger, que, cada vez mais, desprezava a razão -- ratio --, interpretando a Vernunft como vernehmen... Publiquei porque a acho iconoclasticamente engraçada.

    Abraço,
    Antonio Cicero

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  4. Toda besteira de Marx, o culpado é Engels. As tolices de Nietzsche são creditadas a sua irmã. Heidegger tem a Elfried para servir de "bucha". Muito cômodo, muito óbvio...

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  5. Heidegger deveria ir para o inferno, não por ter sido nazista, mas por ter produzido autores bárbaros como Foucault, Derrida e Lacan... A Alemanha perdeu a II Guerra, mas Heidegger vingou o país destruindo o pensamento francês pós-Valéry. Não é pouca coisa...

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